Título: Ricos devem capitalizar bancos multilaterais
Autor: Berlinck, Deborah
Fonte: O Globo, 01/02/2009, Economia, p. 32

Presidente da Colômbia defende injeções de recursos no FMI e no Bird para que não falte crédito a emergentes

DAVOS, Suíça. O presidente da Colômbia, Álvaro Uribe, engrossou o coro dos líderes reunidos no Fórum Econômico Mundial que reivindicam injeções de capital nas instituições multilaterais, como o Fundo Monetário Internacional (FMI), para impedir que países emergentes sejam tragados de vez pela crise, por falta de crédito. O primeiro-ministro britânico, Gordon Brown, o presidente mexicano, Felipe Calderón, e o presidente do Banco Central do Brasil, Henrique Meirelles, insistiram nesse ponto em Davos. Em entrevista ao GLOBO, Uribe classificou de grave a última previsão dos bancos, indicando redução dramática do fluxo de capital privado para os emergentes, e disse que estes não são culpados pela crise.

Deborah Berlinck

Qual a sua avaliação da crise?

ÁLVARO URIBE VELEZ: A Colômbia conquistou muita confiança dos investidores. Nossa taxa de investimentos nos últimos anos passou de 12% a 28%. Temos dado todas as facilidades para investimento. O que queremos, agora, é que esta situação mundial não impeça países como a Colômbia de manterem altas taxas de investimento.

Os bancos estão prevendo uma queda de crescimento drástica da América Latina, de 4,3% em 2008 para 0,5% este ano. Como avalia isso?

URIBE: Preocupa-me muitíssimo uma queda tão grande do crescimento. A América Latina conseguiu ter alguns anos de crescimento sustentado. Temos mais de 200 milhões de pobres (no continente), e só um crescimento sustentado com responsabilidade social e solidariedade pode nos permitir superar a pobreza. O sistema bancário colombiano está sólido, e gostaríamos que o sistema financeiro internacional recuperasse logo sua dinâmica.

O que podem fazer Brasil e Colômbia para conter a crise, uma coordenação maior?

URIBE: Na Colômbia, nós nos preparamos para isso (a crise). Reduzimos substancialmente o déficit consolidado de 4,2% para 1%. Reduzimos o endividamento do Estado de 47% para 21% (do Produto Interno Bruto, soma de bens e serviços produzidos no país). Criamos todas as condições para os investidores.

Mas a Colômbia, apesar disso, está sendo afetada?

URIBE: É preciso reativar muito rapidamente a dinâmica da economia mundial porque há muita gente pobre nos nossos países, esperando oportunidades. Não somos culpados por esta crise financeira mundial. Fizemos muitos esforços e, agora, estamos fazendo esforços adicionais. Este ano, na Colômbia, o investimento público cresceu 50%. Já o investimento privado em obras públicas aumentou 8%.

Sim, mas os investimentos internacionais vão baixar?

URIBE: Seja qual for o tamanho da crise, os países desenvolvidos devem cumprir o dever de capitalizar os bancos multilaterais, para que estes possam manter um nível de oferta de crédito aceitável a todos os nossos países.

O megainvestidor George Soros defendeu a capitalização do Fundo Monetário Internacional (FMI), para ajudar países emergentes e pobres. O que o senhor acha?

URIBE: Não somente o FMI. É preciso capitalizar também o Banco Interamericano de Desenvolvimento. O que aconteceu nesses últimos meses? A demanda por crédito nessas instituições cresceu enormemente. Há seis meses, sobrava dinheiro no Banco Mundial. Os países estavam confiantes de que não necessitariam de crédito. Mas as coisas mudaram dramaticamente. Esses bancos estão comprometidos a emprestar três vezes mais do que emprestavam.

Segundo os bancos, o fluxo de capital privado para emergentes cairá de US$900 bilhões em 2007, para US$165 bilhões neste ano.

URIBE: Isso é muito grave. Uma maneira de compensar (a queda) é elevar o fluxo de crédito das instituições multilaterais.

Estão todos revisando para baixo as previsões de crescimento. Qual sua previsão de crescimento para a Colômbia este ano?

URIBE: Estamos prudentes com cifras. Queremos fazer bem nossa tarefa, para que a crise golpeie o menos possível a economia colombiana.

Mas em Davos estão todos muito pessimistas.

URIBE: É preciso falar: o capitalismo se equivocou com o conceito especulativo do capital. Os mercados financeiros levaram o mundo a uma cadeia louca de especulação. Os preços das matérias-primas não subiram na realidade. Subiram nas negociações de mercado. E isso é muito grave. É preciso recuperar o conceito de que o capital é um bem de produção e bem-estar social. Não pode seguir sendo considerado um bem de especulação.

É necessário que haja mais presença do Estado?

URIBE: Sim, para evitar os danos. Mas também é preciso um grande compromisso para que o setor privado mundial entenda que o capital não pode continuar a ser especulativo. Tem que ser produtivo.