Título: Pedidos de vista retardam julgamentos
Autor: Brígido, Carolina
Fonte: O Globo, 13/02/2009, O País, p. 3

Ministros do Supremo ficam até dois anos com processos; limite é de 20 dias

BRASÍLIA. O STF demonstrou ontem, em dois julgamentos, como pedidos de vista podem contribuir para que processos se arrastem por anos, com grandes chances de os crimes prescreverem antes da decisão final. O caso mais emblemático foi a análise da ação penal contra o deputado Sérgio Moraes (PTB-RS), presidente do Conselho de Ética da Câmara. Ele responde por prevaricação e crime de responsabilidade. Um dos crimes vai prescrever na próxima semana.

O relator, ministro Carlos Ayres Britto, leu voto, absolvendo o parlamentar. Em seguida, Joaquim Barbosa pediu vista. O relator protestou:

- Salvo engano, o prazo prescricional se avizinha. Fui informado que o crime de prevaricação prescreve em 24 de fevereiro. Se puder trazer de volta na próxima semana...

A acusação contra Sérgio Moraes é do tempo em que ele era prefeito de Caxias do Sul (RS). Segundo o processo, entre 2003 e 2004 a prefeitura teria proibido guardas de trânsito de multar seus carros, em caso de infração. O caso chegou ao STF em agosto de 2007 e começou a ser julgado ontem. Apenas o relator teve a chance de votar. Para Ayres Britto, não há provas suficientes da participação de Moraes.

O plenário também tentou retomar ontem o julgamento de uma denúncia contra o ex-líder do PMDB no Senado Valdir Raupp, acusado de desviar dinheiro. A votação contabilizava seis votos a um quando o ministro Carlos Alberto Direito pediu vista. Como são onze ministros, já havia votos suficientes para a abertura da ação penal. Mas, agora, a decisão será adiada até Direito levar o caso de volta ao colegiado.

O inquérito contra Raupp chegou ao STF em julho de 2003. O julgamento em plenário da denúncia apresentada pelo Ministério Público começou em abril de 2007, quando seis ministros concordaram com a abertura da ação penal. Gilmar Mendes pediu vista e só devolveu o caso ontem, após quase dois anos com o processo em suas mãos. Quando finalmente devolveu, foi a vez de Direito pedir vista.

Como governador de Rondônia, Raupp assinou em 1997 um convênio com o Banco Mundial (Bird) para o repasse de R$21,7 milhões para o estado. O dinheiro deveria ter sido usado para preservação ambiental, mas foi transferido para o governo estadual e usado para "saldar despesas diversas". Diferentemente da maioria dos colegas, Gilmar afirmou que não havia provas contra Raupp.

- Discriminar a participação de cada co-réu é necessário. Alguém pode pertencer ao mesmo grupo sem ter concorrido com ato seu para o crime. A responsabilidade criminal é pessoal. Nada justifica iniciar ação penal - disse Gilmar.

- Considero que a denúncia está em termos suficientes para iniciar a ação penal. Há indícios de causalidade e materialidade - discordou o relator, Joaquim Barbosa.

Pelo regimento interno do STF, um ministro pode ficar, no máximo, 20 dias com um processo no qual pediu vista. No entanto, nem sempre os ministros cumprem o prazo. Preocupado, o próprio Gilmar Mendes propôs, na primeira sessão administrativa do ano, quarta-feira última, que fosse publicada na página do tribunal na internet uma lista com a quantidade de pedidos de vista de cada ministro. Os colegas rejeitaram a ideia. (Carolina Brígido)