Título: Uma festa para os amigos
Autor: Colon, Leandro; Rocha, Marcelo
Fonte: Correio Braziliense, 15/03/2009, Política, p. 2

Dos 12 apartamentos ocupados por servidores, sete foram destinados a pessoas próximas a Agaciel Maia

No bloco K da 308 norte mora, desde 1999, Vicente Wanderley Júnior, ex-chefe de gabinete do então diretor-geral do Senado

Cadu Gomes/CB/D.A Press - 3/3/09 Agaciel deixou a diretoria-geral da casa por decisão do presidente José Sarney A queda do diretor de Recursos Humanos do Senado, João Carlos Zoghbi, na sexta-feira, abriu de vez a caixa-preta dos apartamentos funcionais ocupados por servidores. A relação do seleto grupo de ¿inquilinos¿, obtida pelo Correio, mostra que nos últimos 10 anos assessores e aliados do ex-diretor-geral da Casa Agaciel Maia receberam, sem alarde, as chaves de imóveis de propriedade do Estado. O critério que prevaleceu para receber uma moradia, nenhuma com menos de três quartos, foi fazer parte do grupo que comandou o Senado por 15 anos. Dos 12 apartamentos ocupados por funcionários, pelo menos sete foram destinados a pessoas ligadas ao ex-diretor. Mais: há, ainda, três funcionários comissionados, ou não-efetivos, morando nesse tipo de imóvel.

Esse grupo de servidores liderados por Agaciel vem se desmontando desde o ano passado, mas deixou um legado que tem causado tremenda dor de cabeça ao presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), e ao novo primeiro-secretário da Casa, Heráclito Fortes (DEM-PI). Primeiro, veio a demissão de Agaciel da Direção-Geral. Depois, a crise das horas extras pagas aos servidores em janeiro e a existência de funcionários fantasmas em empresas terceirizadas, ponto delicado da idoneidade da instituição. E, agora, a turbulência dos apartamentos funcionais, que culminou com a exoneração de Zoghbi, acusado de repassar aos filhos um imóvel do Senado na 112 Norte enquanto morou numa casa no Lago Sul.

Grande negócio Num apartamento no Bloco K da 308 Norte, por exemplo, mora, desde 1999, Vicente Wanderley Júnior. Servidor efetivo do Senado, Vicente recebeu autorização para viver no imóvel pouco depois de deixar o posto de chefe-de-gabinete da Diretoria-Geral então comandada por Agaciel Maia. No mesmo ano, João Carlos Zoghbi foi agraciado com o apartamento da Asa Norte. Na sexta-feira, a reportagem confirmou: Vicente Júnior continua morando no local. ¿É o Vicente que passeia com o cachorro¿, disse um vizinho.

O servidor José Batista Liparizi é um antigo funcionário do Senado. Começou como segurança e, até 2005, era lotado no gabinete do senador Papaléo Paes (PSDB-PA). Desde 2002, ocupa um apartamento no Bloco J da 411 Norte. O caso mais explícito é o da secretária de Agaciel, Cristiane Tinoco Mendonça. Lotada na Diretoria-Geral, ela recebeu um imóvel do Senado em 2004 no Bloco F da 108 Norte. Receber a autorização para ocupar um apartamento desse tipo é um grande negócio, que certamente faz inveja a quem procura imóvel para alugar no caro mercado imobiliário de Brasília. Segundo corretores, o aluguel de um apartamento do Senado vale, em média, cerca de R$ 2 mil. Para residir nele, os funcionários tiram bem menos do bolso: de R$ 138 a R$ 400 por mês.

Braço-direito de Agaciel, o servidor Valdeque Vaz de Souza não pode reclamar do ex-chefe. Em 2006, ganhou o direito de morar num espaçoso apartamento de 100 metros quadrados no Bloco J da 205 Sul. No mesmo ano, Valdeque teria ajudado a salvar a pele do então diretor-geral da Operação Mão-de-Obra, da Polícia Federal, que desmontou um esquema de fraude em licitações. O assessor de Agaciel, segundo as investigações, esteve no gabinete do patrão numa madrugada anterior à ação de busca no local por parte da PF, o que teria atrapalhado os planos da polícia. Valdeque mora até hoje no imóvel. Além dele, os servidores Djalma da Silva Leite e Elizeu Breda Toso também foram beneficiados por Agaciel com apartamentos funcionais.

A obscuridade dos critérios para a ocupação dos apartamentos abriu brecha para servidores comissionados, sem concurso público, residirem neles. É o caso de Ana Maria Curado, Soraia Barros Gomes e Iméria Catarina de Moura. A primeira é lotada no gabinete do senador Marco Maciel (DEM-PE), a segunda trabalha como secretária de Demostenes Torres (DEM-GO), enquanto a última dá expediente na estrutura do senador Expedito Júnior (PR-RO). Segundo a assessoria de Demostenes, Soraia entrou em seu gabinete em 2003, quando, segundo o senador, já usufruía o apartamento. Os demais servidores citados na reportagem foram procurados durante a semana, mas alguns não quiseram dar declarações e outros não foram encontrados.

-------------------------------------------------------------------------------- Pente-fino nos imóveis

O primeiro-secretário do Senado, Heráclito Fortes (DEM-PI), pretende enviar um questionário aos servidores que moram em imóveis funcionais. O senador quer saber se houve falta de critérios na distribuição dos apartamentos e promete resolver a situação. Ato da comissão diretora de 2002 dá poderes ao diretor-geral da Casa para escolher os beneficiados. Segundo o mesmo ato, o diretor-geral decide e informa ao primeiro-secretário, que assina o aval para um servidor residir no apartamento. Os imovéis funcionais sobraram da venda feita pelo governo de Fernando Collor de Mello em 1990. São uma reserva técnica da União oferecida ao Senado. No total, são 13 apartamentos espalhados pelo Plano Piloto, dos quais apenas um está desocupado. Além deles, há outros 72 na 309 Sul destinados somente a senadores. O parlamentar que abre mão do imóvel recebe um auxílio-moradia de R$ 3 mil mensais. (LC e MR)