Título: A estrada parque
Autor: Nascimento, Alfredo
Fonte: O Globo, 20/04/2009, Opinião, p. 7

O governo brasileiro está fazendo história e vai tirar do papel um projeto que concilia integração local e regional, estímulo ao crescimento econômico e o mais rigoroso cuidado com a preservação ambiental. Trata-se da restauração da BR-319, rodovia construída na década de 70 cortando o estado do Amazonas em direção a Rondônia. Esta é uma obra polêmica. As dúvidas que ela suscita indicavam como melhor caminho encontrar outra alternativa para romper o isolamento da região. Nós faremos mais: vamos recuperar o patrimônio que já existe e, atendendo integralmente as exigências do Ministério do Meio Ambiente, formulamos um projeto que resultará na primeira "estrada parque" da região amazônica.

A restauração da 319 tem sido apontada como senha para o desmatamento da floresta amazônica. Isso não é verdade. A rodovia está implantada e sua recuperação dispensa remoção de vegetação. Não bastasse isso, o perfil do trecho do meio - foco principal da preocupação dos ambientalistas - impede a atividade econômica. Essa realidade é provada pela história, na medida em que, mesmo no período em que a BR-319 teve trafegabilidade, não houve desmatamento para fins comerciais em seu leito. O estado do Amazonas registra o mais alto índice de preservação na Amazônia: 98% de sua área. Desde a inauguração, em 1976, esta rodovia serve de corredor de escoamento à produção industrial de Manaus e de acesso para os municípios amazonenses.

O desmatamento será evitado com a demarcação de 17 unidades de conservação que protegerão os mais de 11 milhões de hectares de floresta amazônica que margeiam a rodovia. Este cinturão verde é maior que a cidade de Itacoatiara, no estado do Amazonas, cujo território tem 8,8 milhões de hectares.

O projeto de recuperação da BR-319 também prevê um conjunto de cuidados em torno da circulação rodoviária, do controle sanitário e da ocupação fundiária. Para isso, serão criados postos de fiscalização para a proteção de toda a área de influência da rodovia e implantados 21 programas para diminuir eventuais interferências sobre o meio ambiente.

As diretrizes para a restauração da BR-319 são inéditas no Brasil, e serão colocadas em discussão com a sociedade a partir do dia 22 de abril, quando serão realizadas audiências públicas. Tais premissas são fruto do trabalho criterioso do corpo acadêmico da Universidade Federal do Amazonas e da intensa discussão entre o Ministério dos Transportes e o Ministério do Meio Ambiente, traduzidos em um rigoroso conjunto de condicionantes cujo atendimento nos dá segurança de que esta rodovia garantirá o escoamento da produção industrial da região. Restaurada, a BR-319 também voltará a cumprir o seu papel mais importante: tirar do mais completo isolamento uma população de quase 4 milhões de pessoas, que há décadas perdeu o direito mais básico de ir e vir, abrindo as portas do estado do Amazonas para os seus cidadãos e para o resto do Brasil.

ALFREDO NASCIMENTO é ministro dos Transportes.