Título: Escudo diplomático para Zelaya
Autor: Martins, Marília
Fonte: O Globo, 01/07/2009, O mundo, p. 24

Presidente deposto obtém apoio da ONU e anuncia volta a Honduras com comissão internacional

Marília Martins

AAssembleia Geral da ONU aprovou ontem, por unanimidade, uma resolução condenando o golpe de Estado em Honduras e exigindo o "imediato e incondicional retorno de Manuel Zelaya ao poder". O plenário estava lotado e depois que o presidente Miguel D"Escoto concluiu a chamada das delegações, a resolução foi aprovada por aclamação e sob aplausos. Concluía-se, assim, a blindagem de apoio internacional que procura, de forma inédita, reverter o golpe no país centro-americano pela via diplomática.

- Esta resolução histórica expressa a indignação não apenas do povo de Honduras, mas também de 192 nações. Este voto de hoje é uma conquista que fortalece todos aqueles que lutam pela democracia no mundo - declarou Zelaya na ONU.

A decisão da ONU se soma à posição de países dos continentes americano e europeu e de organizações multilaterais que trabalham intensamente para pressionar Honduras. Deposto no domingo e enviado ao exílio, Zelaya anunciou que retornará a seu país amanhã, acompanhado pelo secretário-geral da Organização dos Estados Americanos, José Miguel Insulza; por D"Escoto; pela presidente da Argentina, Cristina Kirchner; e pelo presidente do Equador, Rafael Correa.

Apesar do escudo diplomático, o novo governo, de Roberto Micheletti, disse que Zelaya será preso ao descer em Tegucigalpa e acusado de violar a Constituição, tráfico de drogas e crime organizado, podendo ser condenado a 20 anos de prisão.

- Se o senhor ex-presidente chegar aqui terá que enfrentar as diferentes ordens de captura que tem por parte da Corte Suprema - disse Micheletti, em Tegucigalpa.

- Se querem me matar ou reprimir os protestos, que o façam diante do mundo - respondeu Zelaya, acrescentando que os golpistas não ficarão impunes. - Ninguém me levou a julgamento. Ninguém me levou à corte para me defender.

Retirada de candidatura seria sinal para diálogo

À pressão dos países latino-americanos e dos EUA, somou-se a da Espanha, que pediu à União Europeia que os membros do bloco retirem seus embaixadores de Honduras. O Banco Mundial e o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) congelaram temporariamente as operações com Honduras, num total de US$470 milhões. Países da América Central suspenderam o comércio terrestre por dois dias e membros da Alternativa Bolivariana para a América Latina retiraram embaixadores. O governo interino de Honduras anunciou que está enviando uma delegação aos EUA para discutir a situação.

Após sair da ONU, Zelaya foi para Washington para uma reunião da OEA e manteve conversas com o representante para a América Latina do Departamento de Estado, Thomas Shannon.

- Quero elogiar o presidente Barack Obama por não apenas condenar o golpe, mas por pedir a minha volta ao poder. A política externa americana mudou - disse o hondurenho.

Zelaya entrou em confronto com a Corte Suprema, o Congresso e as Forças Armadas ao decidir levar adiante uma consulta sobre a reforma constitucional, que permitiria a sua reeleição e que fora considerada ilegal pelo Judiciário. No domingo da consulta, ele foi preso por militares e posto num avião para a Costa Rica.

Num indício de um ponto de partida para um acordo, Zelaya disse que volta a Honduras apenas para concluir seu mandato, que termina em 27 de janeiro, e que nunca mais concorrerá à Presidência. Micheletti, por sua vez, também afirmou que não será candidato na eleição presidencial de 29 de novembro.

Em Tegucigalpa, 5 mil pessoas se manifestaram a favor do novo governo. Com os meios de comunicação censurados, muitos não têm uma ideia precisa do golpe. A maioria dos manifestantes se disse contrária à aliança entre Zelaya e o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, e que o novo governo era uma forma de evitar que o país se tornasse "marionete de Caracas". Já membros da Frente de Resistência Popular contaram ser perseguidos. Houve novos confrontos com a polícia, em proporção menor do que os da véspera, quando uma pessoa morreu e 30 ficaram feridas. Escolas e universidades estão fechadas, e hospitais só atendem emergências, enquanto 500 policiais guardam o Palácio Presidencial para evitar a aproximação de manifestantes.

Com agências internacionais