Título: Carga recorde. De novo
Autor: Beck, Martha; Rodrigues, Eduardo
Fonte: O Globo, 08/07/2009, Economia, p. 15

Em 2008, mesmo sem a CPMF, peso de impostos sobre os brasileiros foi de 35,8%

Martha Beck e Eduardo Rodrigues

Mesmo diante da perda de R$40 bilhões em recursos da CPMF e da crise financeira mundial - que desacelerou bruscamente a atividade econômica entre outubro e dezembro e obrigou o governo a fazer desonerações de R$16 bilhões - a carga tributária brasileira atingiu o recorde de 35,8% do Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos no país) em 2008. O número representa aumento de 1,08 ponto percentual sobre 2007, quando o peso dos impostos no bolso dos brasileiros chegou a 34,72% do PIB. Para especialistas ouvidos pelo GLOBO, além de a carga ser elevada, os recursos pagos pelos cidadãos são mal empregados pelo governo.

Segundo estudo divulgado ontem pela Receita Federal, mesmo com a crise, a economia cresceu 5,1% em termos reais no ano passado. Isso contribuiu para reforçar a arrecadação do Imposto de Renda (IR) e da Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL), que refletem a lucratividade das empresas. Além disso, o governo elevou as alíquotas do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) e da CSLL para compensar a perda da CPMF.

No ano, União foi a que mais arrecadou

Diante desse quadro, a União foi o principal responsável pelo aumento da carga no ano passado. As receitas do governo federal responderam por 24,9% do PIB - com alta de 0,56 ponto percentual sobre 2007. Em segundo lugar, ficaram os estados, com carga de 9,2% do PIB - 0,43 ponto maior do que em 2007. Já os municípios fecharam 2008 com carga de 1,6% do PIB, praticamente estável.

- O esforço fiscal que o brasileiro está fazendo foi maior em 2008 do que em 2007 - reconheceu o coordenador-geral de Estudos, Previsão e Análise da Receita Federal, Marcelo Lettieri.

Segundo ele, em 2009, a tendência é que haja uma queda na carga tributária. Isso porque a crise econômica diminuiu o ritmo da atividade no país e obrigou o governo a fazer grandes desonerações.

O processo de elevação da carga tem sido crescente. A última vez em que houve redução da carga foi em 2003, quando ela caiu levemente de 32% para 31,4% do PIB. Segundo especialistas, a alta da carga está relacionada ao aumento de gastos do governo.

Os gastos do governo federal, por exemplo, saltaram de 15,59% do PIB em 2004 para 17,23% em 2008. A maior parte desses gastos é vinculada - à Previdência, aos salários do funcionalismo e aos programas sociais - o que dá à União pouca margem para fazer cortes e, com isso, devolver recursos aos cidadãos.

O documento do Fisco enumera como os tributos que mais contribuíram para o aumento da carga em 2009 o Imposto de Renda (0,56 ponto percentual), o IOF (0,4 ponto) e o ICMS (0,39 ponto). Já o fim da CPMF ajudou a evitar um aumento ainda mais forte da carga (reduzindo o peso dos impostos em 1,37 ponto).

Lettieri destacou ainda que a carga tributária brasileira está fortemente ligada à arrecadação de impostos sobre o consumo - o que torna maior o fardo dos mais pobres do que o dos mais ricos.

Segundo o ex-secretário da Receita Everardo Maciel, o crescimento da carga tributária seria ainda maior se a crise internacional não tivesse freado a expansão da economia brasileira a partir de setembro do ano passado. Para ele, no entanto, o foco não deve estar apenas no tamanho da carga - cujo aumento já era esperado -, mas na forma como o volume arrecadado é empregado pelo governo.

- O que verificamos são gastos equivocados com contratação de pessoal, aumentos de salários, desperdícios e corrupção - disse.

- A administração pública precisa agir como uma empresa, utilizando recursos escassos da melhor maneira possível. Para isso, é urgente a conclusão das reformas tributária e previdenciária - disse Felipe Salto, economista da consultoria Tendências.