Título: Seria muito mais fácil melhorar a gestão do que criar um imposto
Autor: Farah, Tatiana
Fonte: O Globo, 05/09/2009, O País, p. 4

Pesquisador diz que há desperdício tanto no setor público quanto no privado

SÃO PAULO. Doutor em Economia da Saúde e um dos autores da pesquisa ¿Desempenho hospitalar no Brasil: em busca da excelência¿, encomendado pelo Bird para avaliar o sistema de saúde brasileiro, o pesquisador Bernard Couttolenc considera injusto criar uma nova CPMF.

¿ Acho injusto procurar no aumento de tributos uma forma de compensar deficiências da aplicação de recursos da saúde.

Está claro que a população está cansada de pagar impostos.

Couttolenc, que realizou um estudo de quatro anos sobre o sistema hospitalar no Brasil, presta consultoria para entidades públicas e privadas de saúde, com vistas a melhorar o desempenho e o uso dos recursos.

No estudo divulgado ano passado, ele concluiu que o país gasta mal em saúde. Há desperdício de dinheiro, deficiências estruturais e má gestão.

¿ Os atores da saúde se preocupam muito com mobilizar mais recursos e pouco com a aplicação eficiente desses recursos.

O desperdício não é uma característica só do governo federal ou do poder público.

O sistema privado de saúde também desperdiça muito.

O secretário municipal de Saúde de São Paulo, Januário Montone, também é contra o novo imposto. Presidente da Fundação Nacional de Saúde (FNS) na época em que o ministro era o governador José Serra (PSDB), Montone foi voto vencido na última reunião dos secretários de saúde, que optaram por defender a criação do imposto.

¿ O imposto não vai ajudar em nada. A postura do governo acabou com a discussão se nós temos problema na saúde. Parece que é um problema só de dinheiro ¿ disse Montone, que, no entanto, defende mais recursos: ¿ Sob qualquer parâmetro, o Brasil gasta pouco. Destina pouco de seu orçamento e gasta menos do que poderia.

Para ele, a conta não poderia ser paga pelo contribuinte: ¿ Com a proposta da nova CPMF, o governo tira do bolso do cidadão o que ele próprio deveria pôr na saúde.

¿Não adianta colocar mais água em um balde furado¿ Montone vê outro problema: a tentativa de associar a aprovação do imposto à regulamentação da Emenda 29, que fixa percentuais a serem investidos pelo poder público e regulamenta os tipos de despesas que caracterizam gastos em saúde.

¿ Sem a regulamentação, há quem coloque em despesas de saúde a solução de um problema de saneamento básico.

Saneamento é uma ação de saúde? Sim, mas no campo filosófico.

Na prática, as ações de saúde são outras.

Couttolenc já finalizou o levantamento em dois grandes hospitais brasileiros, um público e outro privado, cujos nomes foram preservados, e constatou que o desperdício consome em média 30% dos gastos dos dois hospitais. Para ele, o sistema tem um desperdício que varia entre 25% e 35% no Brasil.

¿ Se a nova CPMF traria R$ 10 bilhões para os cofres da saúde, que significam até 15% do orçamento do ministério, por outro lado podemos considerar que o valor representa metade do que é desperdiçado no país.

Seria muito mais fácil melhorar a gestão do que criar um imposto.

Não adianta colocar mais água em um balde furado. A princípio, vai parecer que ele está cheio, mas logo ele esvazia.

Segundo Couttolenc, é preciso solucionar os gargalos da saúde, entre os quais o tratamento da saúde da mulher: ¿ A atenção materna ainda é muito ruim. E há equipamentos médicos e hospitalares em quantidade insuficiente