Título: A causa comum
Autor: Buarque, Cristovam
Fonte: O Globo, 01/09/2007, Opinião, p. 7

Como em toda Semana da Pátria dos últimos anos, desde segunda-feira, as laterais dos prédios dos ministérios estão enfeitadas com faixas gigantescas, trazendo mensagens. A novidade é que, este ano, todos os ministérios trazem uma mensagem comum, como uma nota só: "Energia para crescer, o caminho é a educação"; ou "Alimentação é o começo. Educação é o caminho". Todos repetem o mesmo: "O caminho é a educação."

O vazio de propostas alternativas acomodou a política, que assiste impotente à marcha rumo à catástrofe ecológica, o aquecimento global, a apartação. Os sonhos utópicos se limitam a poucos defensores de causas ecológicas, da assistência social, dos direitos humanos. Os partidos perderam a nitidez e as bandeiras; os políticos perderam a liderança e o estadismo; o Estado perdeu sua função; a população perdeu a esperança, as ideologias se esvaeceram.

Depois de 200 anos, a civilização do crescimento econômico se esgotou, pela depredação ecológica e pela divisão social. Construímos uma civilização de riqueza e poder científico e tecnológico inimagináveis, mas ameaçada pelo desequilíbrio ecológico e limitada pela apartação social, que atravessa cada país, separando pobres e ricos. A alternativa socialista também se esgotou, por falta de liberdade individual e de eficiência econômica, principalmente por causa da ilusão de igualdade criada pelo estado.

A civilização do crescimento, capitalista ou socialista, encara hoje a triste perspectiva do assombro ante um futuro com violência urbana, exclusão social, degradação ambiental, desarticulação demográfica, migração em massa, divisão, guerra de civilizações, consumo de droga, destruição do patrimônio cultural, vazio existencial. Mas o sonho da utopia persiste, e algumas formas novas de ideologia são necessárias: o educacionismo, palavra inexistente no dicionário, é uma delas.

O educacionismo defende a recuperação dos sonhos utópicos para o projeto civilizatório. Mas, em vez das falsas promessas de abundância para todos, ou da igualdade da renda e consumo, propõe uma alternativa utópica: assegurar a mesma chance para todo ser humano; oportunidades iguais para que cada um desenvolva livremente o potencial de seu talento e de sua persistência.

Para tanto, é preciso agir em duas frentes: por um lado, assegurar a igualdade no acesso à educação de qualidade para todos, filhos de pobres ou filhos de ricos, garantindo a mesma chance entre classes sociais. Por outro, realizar ajustes no processo produtivo, construindo um modelo de desenvolvimento sustentável que garanta a mesma chance entre gerações.

Educação e ecologia são os vetores da utopia da mesma chance. E exigem eficiência para organizar um sistema social e econômico competente, por meio de um choque de gestão e de investimentos em infra-estrutura, com equilíbrio das contas públicas.

Consciente de que tanto os vetores quanto a eficiência demorarão a dar os resultados esperados, o educacionismo assume a necessidade de enfrentar emergencialmente os problemas do desemprego, da violência, da corrupção e da assistência às parcelas mais pobres da população, por meio de programas sociais inovadores e eficazes.

Esses são os princípios e a estratégia do educacionismo, a ideologia que defende um futuro baseado no capital-conhecimento, construído graças a uma educação de qualidade para todos, com economia solidamente apoiada em princípios do desenvolvimento sustentável.

Essa alternativa tem, como principal recurso social e econômico, a inteligência dos brasileiros, e considera cada criança como um tesouro a ser cultivado na escola. Esse projeto tem um partido que não se baseia nas siglas tradicionais, mas em uma causa comum. É um movimento similar ao abolicionismo do século XIX: um "partido" formado por líderes filiados às siglas formais, mas todos militantes em torno de uma causa comum ao povo brasileiro e ao futuro. Cada um desses líderes é um educacionista.

CRISTOVAM BUARQUE é senador (PDT-DF).