Título: Lula diz que abriria voto no julgamento de Renan
Autor: Gois, Chico de
Fonte: O Globo, 07/09/2007, O País, p. 8

Presidente reage a cobranças do PMDB; sobre a votação da CPMF, ele admite dificuldades na Câmara.

BRASÍLIA. Em entrevista a oito emissoras de rádio, ontem, no Palácio do Planalto, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse que, se tivesse de votar sobre a cassação do mandato do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), abriria seu voto. A declaração contraria a prática defendida pelos aliados de Renan, que tentaram, sem sucesso, transformar em secreto o voto no Conselho de Ética. No entanto, o voto será secreto na sessão do plenário para o julgamento de Renan, quarta-feira. Lula disse que o Congresso tem direito de decidir suas regras, mas afirmou:

- Eu votaria aberto e diria o que estava votando.

Lula reagiu às cobranças de senadores do PMDB, que disseram que o governo deveria ajudar a salvar Renan porque há projetos de interesse do Planalto a votar. Afirmou que não se deve misturar o processo pelo qual passa Renan com votações de interesse do país.

O presidente defendeu o foro privilegiado para autoridades, disse que o fato de o PT ter decidido participar de uma campanha pela reestatização da Vale do Rio Doce não significa que o governo pense da mesma forma, e alertou que o país não pode prescindir dos R$40 bilhões da CPMF. Ele considerou o imposto "justo e fiscalizador" e disse que, se o Congresso pensa em extingui-lo, que arranje outra forma para arrecadar o valor.

Lula teve ontem reunião com líderes governistas e admitiu dificuldades para aprovar a CPMF. Exigiu lealdade dos aliados e se mostrou irritado com a decisão do PSDB de votar contra a CPMF, dizendo que esperava mais apoio de governadores como José Serra, já que São Paulo receberá R$6 bilhões do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Na entrevista, Lula defendeu a regulamentação da emenda 29 da saúde e elogiou o ministro José Gomes Temporão, qualificando-o de "excepcional". Veja os principais trechos:

RENAN: "Eu votaria aberto e diria o que estava votando. Agora, os senadores irão votar de acordo com o regimento do Congresso, é para isso que existe o regimento. (...) "Não vejo possibilidade de o Renan ou o PMDB misturarem as votações que estão no Congresso com as coisas que estão por serem votadas. (...) As políticas públicas que têm que ser votadas não são de interesse do Lula ou do Renan, são de interesse do povo brasileiro".

PT: "O PT não pode se curvar diante do debate da ética, que pode ter igual, mas não tem partido mais ético do que PT. (...) O que o PT e pessoas do PT cometeram de erros vão ser julgados pela Justiça. Alguns já foram julgados pelo PT, outros já foram julgados pelo Congresso".

IMPUNIDADE: "Como cidadão brasileiro, quando eu não estava na Presidência, mas lá no sindicato, em São Bernardo, a gente ficava torcendo: "Pegou, pegou, prendeu, prendeu, toma tudo que pegou de volta e está resolvido o problema". Não é simples assim, e é bom que não seja, porque é importante que a democracia garanta às pessoas o direito de defesa".

FORO PRIVILEGIADO: "Eu não acho que o governador, o presidente da República, deva ser julgado em qualquer comarca deste país. É preciso que tenha foros que cuidem disso com carinho. Agora, não acho que deva ter foro privilegiado para o cidadão que tem um diploma universitário contra o cidadão que não tem. Fui preso em 1981 e junto comigo tinha companheiros que eram advogados. Eles foram para uma cela especial e eu fui para uma cela com 16 outros presos. Eu era mais importante no movimento sindical que esse cidadão que tinha diploma universitário".

MENSALÃO: "Se qualquer pessoa, seja a mais íntima ou a menos íntima, comete um delito, comete um erro, pratica uma coisa que não deveria praticar, o que deve acontecer? Ser afastada do cargo. (...) Se todo mundo tivesse tido o procedimento que tive, certamente o Brasil não teria tanto problema como tem. (...) Até agora não tem um milímetro de acusação dessas pessoas de dinheiro público".

CPMF: "O Brasil não pode prescindir de R$40 bilhões. (...) A CPMF é um imposto justo e é um imposto fiscalizador. Então, acho que, se as pessoas querem extinguir, que as pessoas proponham outro no lugar".

REESTATIZAÇÃO DA VALE: "Eu posso dizer que esse tema não passa pelo governo, não se discute no governo, porque tem um ato jurídico que foi consagrado, e o governo vai respeitar. Isso não está na minha mesa e nem entrará na minha mesa".

SAÚDE: "Sou defensor de que a Emenda 29 seja regulamentada. (...) Nós precisamos de duas coisas. Precisamos de dinheiro para a saúde e precisamos melhorar a gestão".

AEROPORTOS: "Ainda temos problemas, mas é importante a gente ter em conta que a coisa tem avançado de forma importante. (..) O Nelson Jobim foi chamado para ser ministro e foi dada a ele carta branca para que fizesse todas as modificações necessárias. A Anac é uma agência; tem uma legislação que normatiza o funcionamento da Anac; as pessoas têm estabilidade. Agora, quando não funciona, tem que mudar".

APARTHEID SOCIAL: "O que estou tentando é fazer com que mais gente faça parte da classe média. Não sou eu que tento fazer essa divisão (governar só para pobres). Você acompanhou a campanha passada e percebeu que tinha gente que queria fazer essa divisão".

COLABOROU Cristiane Jungblut

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