Título: Opep tenta redefinir seu papel
Autor: Oliveira, Eliane; D'Ercole, Ronaldo
Fonte: O Globo, 15/11/2007, Economia, p. 29

Cenário atual tem petróleo perto de US$100, maior concorrência no mercado e outros combustíveis.

RIAD. A 3ª Cúpula de Chefes de Estado da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) começa neste sábado com a missão ingrata de repensar o papel da entidade no momento em que o preço do barril se aproxima dos US$100. Passados 32 anos da primeira reunião, na Argélia, os ministros de Energia dos 12 membros da entidade voltam a se encontrar em condições históricas. Além do novo patamar de preços, há ameaça de estremecimento nas relações entre Estados Unidos e Irã, e a ascensão dos biocombustíveis, que surgem como alternativa à energia fóssil.

Criada em 1960 com o objetivo de conter a queda de preços do petróleo ocasionada pela sobreoferta, a Opep perdeu parte do poder de manobra. O cartel não pode mais se dar ao luxo de cortar o fornecimento para forçar a elevação de preços ou em retaliação ao apoio americano a conflitos locais, como em 1973, após a invasão de Israel por Egito e Líbia, conduzindo o mundo ao primeiro choque de petróleo.

Não pode pois o embargo não teria o mesmo efeito. Apesar de deter 77% das reservas mundiais, os países da Opep têm reduzido a participação na produção mundial. Nos anos 1970, respondiam por 60%. Hoje, a fatia é de 41,3%. Por um lado, fortes produtores, como a Rússia, vêm ocupando espaço. O Brasil, após a descoberta da reserva de Tupi (Bacia de Santos), pode contribuir para a mudança de cenário. Por outro lado, as nações da organização vêm reduzindo a produtividade, ao desviar recursos de investimentos para fins políticos. E não têm cumprido as cotas de exportação, que permitiriam controlar o mercado.

- As petrolíferas da maior parte dos países da Opep são controladas pelo Estado e acabam servindo como geração de caixa ao governo. Interessados em ganhar dinheiro com o petróleo nas alturas, não têm respeitado as cotas - diz Giuseppe Bacoccoli, da Coppe/UFRJ.

Ao contrário do passado, gás é quase uma "commodity" hoje

A menor dependência da economia global em relação ao combustível também enfraquece a Opep. Quando a Revolução Iraniana (1979) e a guerra Irã-Iraque (1980) levaram ao segundo choque do petróleo, a economia americana mergulhou em uma de suas mais fortes crises, arrastando o mundo. Os juros americanos foram a 21,5%, para conter a espiral inflacionária desencadeada pelo petróleo.

- Hoje, os segmentos mais virtuosos da economia americana são da área de serviços e tecnologia. Estamos financeiramente menos dependentes do petróleo - diz o ex-diplomata Georges Landau, da consultoria inglesa de energia Menas.

A sofisticação do sistema financeiro também pesa para amortecer as crises: em 1983, o petróleo passou a ser comercializado na Bolsa de Nova York. E, agora, enfrenta os combustíveis alternativos, como o etanol, em voga por questões ambientais, ou gás, mais barato e menos poluente.

- Nos anos 70, sem gasodutos ou tecnologia, o gás não era transportável. Hoje, é quase uma commodity. O gás natural liquefeito pode ser transportado - diz Caio Carvalhal, consultor da americana Cambridge Energy Research Associates.

(*) A repórter viajou a convite do governo da Arábia Saudita