Título: CPMF de sobra
Autor: Batista, Henrique Gomes
Fonte: O Globo, 21/11/2007, Economia, p. 21

Excesso de arrecadação federal já equivale a recolhimento previsto da contribuição em 2007.

Os sucessivos recordes de arrecadação de impostos e contribuições federais entre janeiro e outubro fizeram com que o governo já tenha superado em R$35,7 bilhões a projeção oficial, feita em fevereiro, para o comportamento de suas receitas líquidas (excluídas a contribuição previdenciária e as restituições) ao longo de todo o ano. A diferença praticamente equivale à previsão de R$36 bilhões para o recolhimento em 2007 da CPMF, tributo que o governo briga no Congresso Nacional para prorrogar até 2011, alegando impossibilidade de abrir mão de caixa. O valor é maior do que o total arrecadado com a CPMF até outubro, que foi de R$30 bilhões.

De janeiro a outubro, a arrecadação líquida já soma R$338,725 bilhões. O primeiro decreto orçamentário (nº 6.046) do ano, publicado pelo Ministério do Planejamento em 22 de fevereiro, estimava que em 2007 entrariam nos cofres da Receita Federal do Brasil R$303,032 bilhões. Os números, porém, já haviam sido revisados para cima quatro vezes. E o governo já planeja gastar parte do excedente, conforme a quinta previsão de despesas, divulgada ontem.

Incluídas a contribuição previdenciária e as restituições pagas e a pagar, a arrecadação do governo também representa um recorde, ao somar R$484,747 bilhões este ano. Trata-se de um aumento real de 10,17% em relação aos dez primeiros meses de 2006.

Especialista destaca gastos em alta

O bom momento da arrecadação não permite uma maior desoneração de tributos e redução da carga tributária, segundo o especialista em contas públicas Raul Velloso. Por um motivo simples, alega: as despesas do governo também estão crescendo acima das previsões iniciais. Para ele, se a arrecadação estivesse dentro do esperado, o país enfrentaria graves problemas.

- O Brasil é o país que mais arrecada entre os países em desenvolvimento. Elevamos nossa receita sem aumentar a alíquota ou mudar a base de cálculo, somos os reis da arrecadação. Mas não dá para dizer que podemos usar essa receita extra para abrir mão da CPMF por um motivo simples: o aumento das despesas. Só poderemos prescindir da CPMF depois que resolvermos o aumento dos gastos públicos - afirmou.

No mês passado, impostos e contribuições federais renderam R$54,779 bilhões. Esse valor - o maior da história, excetuando os meses de dezembro, sempre inflados pela arrecadação previdenciária do décimo terceiro salário - é 12% maior que o registrado em outubro do ano passado (R$48,908 bilhões).

- O resultado positivo da arrecadação é motivado pelo crescimento da economia e pela melhoria da fiscalização e da atuação do Fisco. Aumentamos receita sem elevar alíquotas - afirmou Raimundo Eloi, coordenador-geral de Previsão e Análise.

Para comprovar sua tese, Eloi cita os setores em que houve maior expansão mensal de Imposto de Produtos Industrializados (IPI): produtos químicos (61,8%), metalurgia (34,7%), máquinas, aparelhos e materiais elétricos (32,74%) e fabricação de caminhões e ônibus (10,14%). O avanço na venda de automóveis (33% em outubro) elevou o recolhimento do IPI setorial em 28,72%.

A elevação das importações também foi um impulso. O Imposto de Importação teve alta mensal de 39,2%, e o IPI vinculado às compras no exterior subiu 36,3%. Além disso, o resultado de outubro foi ampliado pelo recebimento de R$246 milhões, referentes a débitos dos setores de metalurgia e petroquímica. A geração de vagas formais na economia é outro motor do crescimento da arrecadação, refletido no Imposto de Renda pago pelas pessoas físicas e na contribuição previdenciária.

Bolsa contribuiu para o resultado

A única alíquota que foi revista e aumentada em outubro, segundo o Fisco, foi a do IPI-Fumo, que, após dois anos, subiu 30%. Mas ela é baseada em um valor fixo por maço e leva em conta custos do setor, alegou Eloi.

Outra contribuição positiva para o Leão é o boom imobiliário e o do mercado de ações. A arrecadação do Imposto de Renda da Pessoa Física sobre ganhos de capital - aplicado a essas duas modalidades - subiu 146,11% nos dez primeiros meses, ante igual período de 2006. O valor arrecadado passou de R$1,523 bilhão, em 2006, para R$3,748 bilhões. Somente em outubro, o imposto decorrente do ganho de capital foi de R$386 milhões, uma alta de 148,4%.

O coordenador do Fisco afirmou ainda que o crescimento de 37,3% no lucro das empresas listadas na Bolsa de Valores de São Paulo no primeiro semestre também engordou o caixa da Receita.

Já o recebimento de royalties pela exploração de petróleo por parte do governo federal tem sofrido redução. A Receita Federal afirma que esse resultado é decorrente da valorização do real frente ao dólar. No acumulado deste ano, foram arrecadados nessa rubrica R$13,371 bilhões, valor 13,18% inferior ao registrado nos dez primeiros meses do ano passado, que foi de R$15,4 bilhões.