Título: Regularização de favelas segue a passos lentos
Autor: Brígido, Carolina; Marqueiro, Paulo
Fonte: O Globo, 03/12/2007, O País, p. 8
Apesar de promessas do governo federal, títulos de posse ainda são artigo de luxo em comunidades pobres do país.
BRASÍLIA e RIO. Quase cinco anos após anunciar o programa de regularização de propriedades em favelas e invasões, o governo federal está muito aquém de cumprir suas próprias metas. O tema ainda aparece em discursos repletos de promessas renovadas, como fez o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, sexta-feira, no Rio. No entanto, desde 2003, foram concedidos títulos de propriedade a 320 mil famílias em todo o Brasil. Destes, cem mil foram registrados em cartório. Em 2003, ainda com Olívio Dutra à frente do Ministério das Cidades, a meta era entregar escrituras a 450 mil famílias até o fim de 2006. Ou seja: um ano depois do prazo fixado, o Executivo ainda está devendo quase 30% dos títulos prometidos para o primeiro ano de governo.
- Os números mostram que há um esforço para a regularização fundiária, mas é um processo complexo - disse o diretor da Secretaria de Programas Urbanos do Ministério das Cidades, Celso Santos Carvalho.
Em quatro anos programa já consumiu R$40 milhões
Desde 2004, quando o governo federal passou a investir no setor, o programa consumiu cerca de R$40 milhões dos cofres públicos - R$10 milhões por ano. Em geral, o dinheiro é repassado a prefeituras e governos estaduais para financiar as ações de regularização do poder público local.
No entanto, a União também atua diretamente em alguns casos, como na situação dos moradores das favelas da Rocinha e do Vidigal, no Rio, onde oito mil famílias pleiteiam as escrituras de suas casas. São cinco mil na primeira favela e três mil na segunda. Nesses locais, o processo tem dependido de decisão judicial. Na maioria dos casos, é necessário entrar com ações para pedir o reconhecimento da propriedade por usucapião. Carvalho não soube precisar, mas acredita que já tenha havido concessão de títulos nas duas áreas.
O governo federal acompanha o processo de regularização em áreas de moradia precária e invasões localizadas em 300 cidades brasileiras. São 2.700 favelas e bairros que abrigam 1,35 milhão de famílias - só 23,7% delas foram contempladas. O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), anunciado este ano, incluiu a infra-estrutura social entre seus eixos. Serão empregados R$11,6 bilhões ao longo de quatro anos especialmente na urbanização de favelas.
Parte do dinheiro também será usada na regularização fundiária de propriedades. No Rio, entre os beneficiados estão os moradores de Manguinhos, Cantagalo, Complexo do Alemão e Pavão-Pavãozinho.
Programa teve início em favelas do Rio
No Rio, nas últimas décadas, inúmeros programas governamentais alimentaram nos moradores o sonho da regularização fundiária, mas, na prática, a maioria continua vivendo como sempre: na informalidade.
Na sexta-feira, ao visitar o Morro do Cantagalo, em Ipanema, ao lado do governador Sérgio Cabral, Lula se disse contrário à remoção de favelas e prometeu que todos os moradores teriam o seu título de propriedade. O presidente esteve na comunidade para lançar as obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
- Todo mundo que não tem o título da sua terra vai ter o título, para que tenha certeza de que o terreno é seu e não virá nenhum prefeito, nenhum governador enxerido mandar a polícia tirar os companheiros de lá - disse o presidente.
O aceno de Lula foi endossado pelo governador Sérgio Cabral, que prometeu conceder os títulos no dia da inauguração das obras do Complexo Cantagalo-Pavão-Pavãozinho.
No início do primeiro governo Lula, o Ministério das Cidades anunciou um amplo programa de regularização fundiária em favelas. O projeto começou em 2004, pelo Rio, onde 1.646 famílias de três favelas localizadas em terrenos da Marinha - Parque Royal, Ladeira dos Funcionários e Parque São Sebastião - receberiam títulos de posse. Dois anos depois, das 863 famílias da Ladeira dos Funcionários inscritas no programa, apenas 200 haviam recebido o título.
- A regularização fundiária é hoje uma questão fundamental, mais até do que obras de urbanização, porque ela consolida uma segmentação na cidade: o mercado formal e o informal. Para um projeto de integração dessas duas áreas, é importante resolver essa questão - diz Luiz Cesar de Queiroz Ribeiro, professor do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional (Ippur/UFRJ).