Título: Índios mantêm assessor da ONU como refém
Autor: Carvalho, Jailton de
Fonte: O Globo, 11/12/2007, O País, p. 14

Procurador, funcionário da Funai e sua mulher também estão detidos em Rondônia; Meira tenta negociação.

Jailton de Carvalho

BRASÍLIA. O presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), Márcio Meira, está negociando com caciques cintas-largas a liberação do representante da ONU (Organização das Nações Unidas) David Martins Castro, do procurador da República Reginaldo Martins Trindade e de outras duas pessoas mantidas como reféns na Reserva Roosevelt, no Sul de Rondônia, desde sábado. As negociações são difíceis. Os índios querem a suspensão da fiscalização da PF no entorno da reserva e a extinção dos processos criminais que tramitam contra eles na Justiça Federal, entre outros itens.

A Polícia Federal desconfia que alguns líderes indígenas estão sendo manipulados por empresários e políticos interessados na volta do garimpo sem restrições na reserva. Para a polícia, a retirada das barreiras de fiscalização, como querem os índios, facilitaria uma nova invasão em massa de garimpeiros. Não há estudos específicos sobre o assunto, mas especialistas da PF e da Funai acreditam que a reserva ainda tem uma das maiores jazidas de diamante do planeta.

- Não dá para suspender o bloqueio. Os principais prejudicados seriam os índios. Se a polícia sair, o garimpo voltará com força. Em 2001, tiramos 5 mil garimpeiros de lá - afirmou um delegado da PF.

A PF mantém, desde 2002, barreiras nas principais entradas da reserva, para impedir a entrada de máquinas pesadas e de combustível para o garimpo dentro da Roosevelt. Mesmo assim, a polícia calcula que 200 garimpeiros teriam entrado e, em conluio com líderes indígenas, estariam extraindo diamantes. Empresários que fizeram altos investimentos no garimpo antes do recrudescimento da fiscalização estariam se articulando para derrubar as barreiras policiais e recuperar os altos lucros do negócio.

Índios querem extinção de processos criminais

Numa carta aberta, divulgada domingo, os índios pedem a extinção dos processos criminais que muitos respondem na Justiça Federal. Eles querem se livrar até do processo contra o massacre de 29 garimpeiros, em 7 de abril de 2004. Os garimpeiros foram amarrados e mortos a golpes de borduna depois de resistirem às ordens de caciques para deixar a reserva. Eles estariam extraindo diamantes sem pagar as taxas cobradas pelos caciques. Os índios reivindicam ainda melhorias na educação e na saúde.

- As reivindicações são justas e negociáveis. Os índios estão em situação de vulnerabilidade há muitos anos - disse Meira, pouco depois de chegar a Cacoal para começar as negociações com os índios.

O presidente da Funai não disse se teria condições de suspender a fiscalização da PF sobre a reserva. Ele ponderou que nem ele nem qualquer outra autoridade do governo federal tem poderes para extinguir processos judiciais. O processo criminal sobre o massacre dos garimpeiros é considerado uma mera formalidade. Relatório da PF incrimina os índios, mas a ação não prossegue porque ainda não há laudo antropológico que diga se os índios podem ser responsabilizados. Também são reféns o administrador regional da Funai, Aristodene Ferreira, e a mulher do procurador, Ineida Hargreaves.