Título: Correndo por US$150 bi
Autor: Passos, José Meirelles; Frisch, Felipe
Fonte: O Globo, 25/01/2008, Economia, p. 23

AMEAÇA GLOBAL

Bush e Câmara aceleram acordo para pacote de estímulo. Bovespa tem maior alta em 5 anos

José Meirelles Passos* e Felipe Frisch

Na corrida para evitar uma recessão nos Estados Unidos, a Casa Branca e a Câmara dos Representantes costuraram um acordo para o pacote de estímulo à economia de US$150 bilhões, comemorado ontem pelo presidente George W. Bush. O pacote implica a distribuição de cheques variando de US$300 a US$1.200 por família, num volume total equivalente a cerca de US$100 bilhões. O anúncio do acordo - o pacote havia sido proposto por Bush na última sexta-feira - fez as bolsas americanas fecharem em alta. Na Europa, a expectativa já havia contribuído para o otimismo dos mercados.

No Brasil, a euforia prevaleceu durante todo o dia, mesmo antes do anúncio do pacote, por volta das 17h30m (horário de Brasília), a meia hora do fechamento do pregão. O Ibovespa, principal indicador da Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa), teve a maior alta desde 17 de outubro de 2002, de 5,95%, para 57.463 pontos. Na máxima do dia, logo após o anúncio, chegou a avançar 6,34%. Com a volta de investidores, o dólar comercial recuou 2,14%, para R$1,786. O risco-país, que vinha subindo devido à queda de juros nos EUA, caiu 9,09%, para 250 pontos centesimais.

Com o pacote, o objetivo do governo dos EUA é incentivar os americanos a consumirem com o dinheiro da restituição, estimulando a economia. O restante, 1/3 do pacote, virá na forma de um corte de impostos que incidem sobre investimentos corporativos e de deduções tributárias imediatas para pequenos negócios que invistam em equipamentos e construção ou ampliação de locais de trabalho. A expectativa é que os cheques comecem a ser entregues 60 dias depois da aprovação do pacote, que ainda vai para o Senado. Pelos cálculos do governo e dos legisladores, o dinheiro estará chegando às casas daqui a três ou quatro meses.

- Se tudo funcionar direito, os cheques começarão a ser recebidos em maio - disse o secretário do Tesouro, Henry Paulson, acrescentando que as primeiras remessas ocorreriam em dez semanas, ou seja, em meados de abril.

Cotação do petróleo sobe quase 3% com medidas

O movimento de compra na Bovespa teve também o impulso do crescimento da economia chinesa, de 11,4% em 2007, a maior alta em 13 anos. Analistas estimam que, caso os EUA entrem em recessão, a China possa compensar a queda da demanda americana, especialmente em commodities como o minério de ferro, explicou André Segadilha, chefe de análise da corretora do Banco Prosper. Com isso, as ações ordinárias (ON, com direito a voto) da Vale chegaram a subir 13,11% (fecharam em alta de 11,38%), e as preferenciais da série A (PNA, sem voto), 8,05% (encerrando a 6,13%). Já as ações preferenciais da Petrobras subiram 7,01%, e as ordinárias, 7,81%.

O pacote também influenciou os preços do petróleo: o barril do tipo leve americano avançou 2,78%, para US$89,41, e o do Brent, 2,83%, para US$89,07.

Em Nova York, o Dow Jones avançou 0,88% e o Nasdaq, 1,92%. Em Londres, o FTSE subiu 4,6%, a maior alta em cinco anos. O DAX, de Frankfurt, subiu 5,93% e o CAC, de Paris, 6%. Também pesou no mercado a expectativa de um socorro às seguradoras de bônus, como as americanas Ambac e MBIA. O superintendente de Seguros do estado de Nova York, Eric Dinallo, no entanto, informou que essa ajuda levará "algum tempo". No fim do dia, surgiram rumores de que o investidor Wilbur Ross estaria negociando a compra da Ambac.

Bush comemorou o acordo com o Congresso como sendo fato raro em sete anos de governo:

- Esse acordo demonstra o tipo de cooperação que alguns acreditavam jamais ser possível em Washington. Esse pacote tem um conjunto correto de medidas e um tamanho adequado.

Apesar da comemoração, tanto a líder da maioria e presidente da Câmara, a democrata Nancy Pelosi, quanto o líder da minoria republicana, John Boehner - que negociaram com Paulson - lembraram que se tratava, na verdade, de "um princípio de acordo". Ou seja: poderá ser alterado pelo Senado.

Lula discute crise dos EUA com Gordon Brown

A turbulência financeira levou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva a conversar ontem com o primeiro-ministro britânico, Gordon Brown. Lula disse que sua maior preocupação é evitar que a crise americana freie os avanços econômicos e sociais obtidos pela América Latina nos últimos anos. Brown sugeriu a criação de um "corpo internacional" destinado a alertar os países com o máximo de antecedência sobre a iminência de grandes choques. Lula não comentou se era favorável à idéia. Nas próximas duas semanas, eles manterão outros contatos telefônicos.

- O presidente Lula expressou a Gordon Brown a preocupação de que essa crise não atinja as conquistas da América Latina no desenvolvimento econômico e social. O importante para o presidente é realmente a repercussão que possa haver na América Latina - disse o porta-voz da Presidência, Marcelo Baumbach, acrescentando que eles também trataram do impasse na chamada Rodada de Doha, da Organização Mundial do Comércio (OMC).

(*) Correspondente, com agências internacionais

COLABOROU Cristiane Jungblut