Título: Planalto reage para tentar barrar CPI
Autor: Paul, Gustavo; Lima, Maria
Fonte: O Globo, 06/02/2008, O País, p. 3

Governo agirá em duas frentes, uma política e outra técnica, para esclarecer dados.

BRASÍLIA e SÃO PAULO. O Palácio do Planalto vai pôr em prática a partir de hoje uma operação para tentar abafar a criação de uma CPI para investigar irregularidades no uso dos cartões corporativos do governo. A reação do Planalto será feita em duas frentes: uma política, para impedir a instalação da CPI, e outra técnica, para esclarecer as notícias que apontam eventuais abusos nos gastos dos cartões.

A preocupação é que o assunto tome conta da pauta legislativa no primeiro semestre, o que paralisaria o governo. Para montar a reação, está prevista para hoje, no Planalto, uma reunião dos ministros Dilma Rousseff, chefe da Casa Civil, general Jorge Armando Félix, chefe do Gabinete de Segurança Institucional, e José Múcio Monteiro, das Relações Institucionais.

Enquanto José Múcio deve montar uma operação política para fortalecer a posição do governo no Congresso e evitar que a oposição consiga assinaturas suficientes para a CPI, os ministros Dilma Rousseff e Jorge Félix devem fazer uma avaliação técnica de todas as informações de gastos com o cartão corporativo.

O governo avalia como será o esclarecimento de gastos feitos por seguranças da Presidência que servem à família de Lula em Florianópolis (SC) e São Bernardo do Campo (SP). Um segurança da filha de Lula em Santa Catarina gastou R$55 mil. Outros dois seguranças de São Bernardo teriam gasto R$149 mil. A assessoria da Presidência informou que os gastos são sigilosos e que os esclarecimentos serão apresentados hoje pelo Gabinete de Segurança.

A expectativa no Planalto era de que a saída da ex-ministra da Igualdade Racial, Matilde Ribeiro, semana passada, amenizasse o clima no Congresso. Mas a divulgação de novos dados do uso do cartão fez o governo repensar a estratégia. O ministro José Múcio foi cauteloso sobre a iniciativa da oposição de tentar instalar uma CPI:

- É direito da oposição tentar fazer uma CPI. Mas quem vai decidir é o Legislativo. Cabe ao governo esclarecer os fatos sobre os gastos com o cartão corporativo. E tudo será esclarecido.

De forma reservada, a avaliação é de que alguns gastos com cartão foram realmente irregulares e que o governo terá dificuldade em dar algumas explicações. Por isso a decisão, já tomada na semana passada, de restringir mais o uso do cartão corporativo.

No carnaval, o ministro do Esporte, Orlando Silva, antecipou-se a uma ação do governo e resolveu devolver todos os gastos feitos por ele com o cartão corporativo. Para amenizar os efeitos dos gastos irregulares, o Planalto deve alegar que o levantamento de dados só foi possível graças à iniciativa do governo de colocar a movimentação do cartão corporativo na internet, por intermédio do Portal da Transparência.

- O cartão tem um grau enorme de transparência. Tanto que as denúncias surgem depois de análise de dados feita no site do próprio governo - ressaltou o líder do governo na Câmara, deputado Henrique Fontana (PT-RS).

Segundo ele, será um erro a oposição insistir na criação de uma CPI. Ele alerta para a possibilidade de uma paralisia do Congresso, o que, na visão de Fontana, iria prejudicar muito a agenda de temas estruturais:

- O Congresso não pode iniciar o ano paralisado com uma investigação. É um erro a oposição apostar numa CPI no início dos trabalhos legislativos. É infantilidade achar que o presidente e sua família estejam usando irregularmente o cartão corporativo. Isso cria um ambiente de mesquinharia. A oposição não deveria trilhar esse caminho - argumentou Fontana.

Mas o líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio, afirmou que a CPI para investigar o uso dos cartões será inevitável. Segundo ele, caso o pedido de uma CPI mista do deputado Carlos Sampaio (PSDB-SP) não vingue, ele mesmo tratará de articular uma CPI exclusiva no Senado - onde o governo não tem maioria. Virgílio disse que pedirá a inclusão do período de Fernando Henrique Cardoso na Presidência da República nas investigações, para evitar críticas do PT.

- Antes que o PT diga que se trata de uma perseguição a Lula, vamos então investigar os gastos dos dois presidentes. Façamos uma análise qualitativa dos gastos, de 2008 até 2001. Se necessário, entrarei com o pedido no Senado.

COLABOROU Soraya Aggege