Título: Conselheiro tem influência
Autor: Galhardo, Ricardo
Fonte: O Globo, 06/05/2008, O País, p. 3

EMPRÉSTIMOS SOB SUSPEITA

Procuradora diz ter indício de participação de funcionários do BNDES e de mais dez prefeituras.

Aprocuradora da República Adriana Scordamaglia disse ontem que o Ministério Público Federal tem indícios também da participação de funcionários do BNDES no esquema de cobrança de propinas por empréstimos do banco. A denúncia contra o presidente da Força Sindical, o deputado Paulo Pereira da Silva (PDT-SP), o Paulinho, já foi enviada a Brasília porque ele tem foro privilegiado no Supremo Tribunal Federal. Segundo a procuradora, o material recolhido pela PF tem evidências contra outros políticos e "pessoas importantes" envolvidos no esquema, investigado pela Operação Santa Teresa. De acordo com Adriana, outras dez prefeituras paulistas, além da de Praia Grande, teriam participado do esquema.

- Foi citada a participação de funcionários do BNDES, mas os nomes não foram individualizados - disse a procuradora ontem. - Há outras pessoas envolvidas, pessoas importantes, políticos - completou.

Segundo Adriana, além das interceptações telefônicas, a PF colheu provas que evidenciam a participação de funcionários do banco e políticos no esquema, como e-mails, notas fiscais e documentos escritos de próprio punho pelos investigados. Os nomes dos funcionários não foram identificados e serão objeto de novos inquéritos. Até agora, os únicos nomes ligados ao banco que surgiram nas investigações são os do ex-conselheiro do BNDES João Pedro de Moura e do advogado Ricardo Tosto, que substituiu Moura no Conselho Administrativo do banco e se licenciou depois que a investigação da PF foi deflagrada.

Perguntada sobre a alegação do BNDES e de ministros de que conselheiros não têm poder para liberar empréstimos, a procuradora respondeu:

- Conselheiro tem prestígio e influência.

Empréstimos para as mesmas pessoas

Adriana Scordamaglia foi taxativa ao afirmar que houve favorecimento a prefeituras que tinham contato com integrantes da quadrilha.

- Houve favorecimento. Quem recebia os empréstimos eram as mesmas pessoas - afirmou.

De acordo com ela, além da prefeitura de Praia Grande, beneficiada com um empréstimo de R$124 milhões, dos quais R$2,6 milhões teriam sido repassados à quadrilha, pelo menos outras dez prefeituras no estado de São Paulo participaram do esquema. A quadrilha atuava desde 2004. Em conversas telefônicas gravadas pela PF, o grupo conta que tinha como alvo cem prefeituras em todo o país.

- Pelo menos mais dez prefeituras serão investigadas em São Paulo - disse ela.

Os demais políticos e "pessoas importantes" citados pela procuradora serão alvo de investigações específicas. Adriana não revelou nomes alegando que a investigação de autoridades com direito a foro especial é da alçada da segunda instância do Ministério Público, mas admitiu que os políticos seriam beneficiários das propinas recolhidas pelos investigados.

O vazamento de informações um mês antes de a Operação Santa Teresa ser deflagrada, revelado sábado pelo GLOBO, também será objetivo de inquérito específico. Segundo o inquérito, no dia 25 de março, Tosto avisou a Marcos Vieira Mantovani que seus telefones estavam "sujos". A operação só foi deflagrada no dia 24 de abril.

Adriana, que pediu instauração de inquérito para apurar o vazamento, afirmou que Tosto tentou obstruir as investigações destruindo provas, o que justificaria o pedido de prisão preventiva do advogado feito na sexta-feira e negado pela Justiça.

- Quais provas? Isso não corresponde à realidade. Apresentamos petição ao juiz na qual meu cliente se dispõe a colaborar com a Justiça, apresentar os documentos solicitados e se apresentar quando necessário. Elucubrações gratuitas não podem ser usadas para embasar qualquer medida que agrida direitos fundamentais do cidadão - reagiu o advogado de Tosto, Roberto Batocchio.

Segundo a assessoria de Tosto, o advogado se referia a outro processo quando falou em telefones "sujos". Na quarta-feira, Tosto foi internado no Instituto do Coração com arritmia.

O BNDES informou que não foi notificado pela PF sobre o andamento das investigações da Operação Santa Teresa. Em relação aos indícios sobre o suposto envolvimento de funcionários em financiamentos sob suspeita, o BNDES informou que vai colaborar com as investigações. Segundo a assessoria do banco, dois financiamentos considerados suspeitos pela PF foram suspensos temporariamente: o das Lojas Marisa e o da prefeitura de Praia Grande.

A Operação Santa Teresa começou investigando uma quadrilha que explorava prostituição e tráfico de mulheres na casa noturna WE, de São Paulo. No decorrer das investigações surgiram indícios de que a quadrilha faturava intermediando empréstimos no BNDES. Na última sexta-feira, 13 pessoas foram denunciadas pelo Ministério Público. O juiz Márcio Ferro Catapani, da 2ª Vara Federal Criminal, aceitou a denúncia e abriu processo contra 13 pessoas. Quatro estão presas e uma está foragida.