Título: PF descobre rateio do esquema do BNDES
Autor: Farah, Tatiana; Galhardo, Ricardo
Fonte: O Globo, 24/05/2008, O País, p. 8

Planilha apreendida revela como grupo teria dividido comissão por empréstimo; a Paulinho teria cabido R$82 mil.

SÃO PAULO. O chamado "esquema do BNDES" arrecadou de uma só vez R$777 mil de comissão por um empréstimo concedido pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Social a uma das maiores rede de lojas de departamentos de São Paulo. Segundo a Polícia Federal, o deputado Paulo Pereira da Silva, o Paulinho (PDT-SP), teria sido um dos beneficiários desse reparte de dinheiro, recebendo um cheque de R$82.162,93.

O canhoto do cheque foi encontrado durante uma diligência feita pela PF à empresa de consultoria Progus, em São Paulo, cujo dono, Marcos Mantovani, foi preso durante a Operação Santa Teresa. Outros 12 acusados de participar do esquema estão sendo processados pela Justiça Federal. Paulinho, que é presidente da Força Sindical, tem foro privilegiado por ser deputado e não está sendo investigado. A Procuradoria Geral da República analisa se pede abertura de investigação contra o deputado nos próximos dias.

Rede de lojas não está sob investigação

O GLOBO teve acesso a cópias do canhoto dos cheques e a planilhas da suposta divisão do dinheiro proveniente da liberação de empréstimo concedido às Lojas Marisa. Por intermédio de um prestador de serviços, Boris Timoner, a empresa firmou um contrato de risco com a empresa de consultora Progus, pelo qual se comprometeu a pagar 1,95% de comissão caso a consultoria tivesse êxito na obtenção de empréstimos de até R$100 milhões junto ao BNDES.

Numa das planilhas apreendidas pela Polícia Federal e já remetidas à Justiça está todo o suposto roteiro dos 1,95% de R$39,848 milhões, uma das parcelas do dinheiro liberado para as Lojas Marisa. Do valor arrecadado pelo grupo (R$777 mil), foram deduzidos 15,41% em impostos. Depois, o rateio dos R$657,3 mil foi feito em dois subgrupos. Cada subgrupo ficou com 50%.

Na planilha, todos são chamados por códigos de até três letras. Segundo a decodificação feita pela Polícia Federal, a primeira metade do dinheiro ficou com BT (identificado pela PF como Boris Timoner), MAN (identificado pela PF como o empreiteiro de Praia Grande Manuel Fernandes de Bastos Filho, que está foragido, possivelmente em Portugal) e JP (que seria João Pedro de Moura, ex-assessor de Paulinho, consultor da Força Sindical e ex-conselheiro do BNDES, preso pela PF).

A outra metade foi dividida por PR (sigla identificada como sendo a Progus), que ficou com R$164.325,86; e PA-GA teria ficado com R$82.162,93. PA, para a Polícia Federal, é Paulo Pereira da Silva, e GA, José Gaspar, ex-presidente do PDT de São Paulo e que pode ter recebido o dinheiro em sociedade com o deputado ou em nome do deputado. O mesmo valor de R$82 mil teria ficado com RT (que seria o advogado Ricardo Tosto, que foi conselheiro do BNDES indicado pela Força Sindical e também foi advogado de Paulinho).

No canhoto do talão de cheques, a folha datada de 18 de março passado, no valor de R$82.162,93, traz apenas a indicação PA. O GLOBO revelou ontem que, numa troca de mensagens eletrônicas instantâneas, o dono da Progus, Marcos Mantovani, explicou à sua filha e assistente, chamada apenas de Carol, que PA queria dizer "Paulinho". Para a PF, o Paulinho citado no diálogo é o deputado Paulo Pereira da Silva, o Paulinho da Força Sindical.

O advogado do deputado, Antonio Rosella, em entrevista ao GLOBO na quinta-feira, negou que seu cliente tenha qualquer participação no esquema de rateio de comissões de empréstimos. O deputado prefere não falar com a imprensa sobre o assunto.

Nas investigações da PF não pesam acusações contra as Lojas Marisa. O último relatório enviado à Justiça esta semana informou que a única pessoa ligada à empresa que tinha algum vínculo com o esquema era Boris Timoner. Timoner, segundo as Lojas Marisa, não é um executivo da casa, mas apenas um prestador de serviços.

Escuta confirma partilha de dinheiro

Uma escuta telefônica feita pela Polícia Federal durante o inquérito e divulgada ontem à noite pela Rede Bandeirantes mostra que o empresário Marcos Mantovani, dono da Progus, queria que os R$82.162,93 de PA fossem divididos com Gaspar. A PF suspeita que Gaspar seja o então presidente do PDT paulistano José Gaspar, amigo de Paulinho. A conversa foi travada entre Mantovani e João Pedro Moura, ex-assessor do deputado, na ocasião da liberação do dinheiro.

- Já retirei o envelope- disse João Pedro.

- Ah, que beleza! Então, tá ótimo - respondeu Mantovani.

- E ele (possivelmente Boris) já separou para o PA e para o RT, tá?- continuou João Pedro.

- E aquela coisa do outro? Temos que sentar para conversar. Não dá para ser assim não. Senão, eu vou perder 50% do que eu ganhar - queixou-se Mantovani.

João Pedro questionou:

- Que outro?

- Gaspar. Se não fizer daquele jeito, quem se ferra sozinho sou eu.

- Segunda-feira a gente conversa- encerrou João Pedro.

Embora na planilha de rateio apareça PA-GA, no canhoto de cheque pagos consta apenas PA, que, para a Polícia Federal, trata-se do deputado Paulo Pereira da Silva, o Paulinho.