Título: Operação Condor: inquérito contra brasileiros
Autor: Aggege, Soraya
Fonte: O Globo, 24/06/2008, O Mundo, p. 25

Pela primeira vez, autoridades do país podem ser acusadas penalmente por participar de crimes das ditaduras do Cone Sul

Soraya Aggege

SÃO PAULO. Pela primeira vez desde a abertura política, o Ministério Público Federal em São Paulo pediu a abertura de inquéritos criminais contra autoridades envolvidas na Operação Condor, a articulação dos regimes militares do Cone Sul, por assassinato e seqüestro. Os requerimentos foram feitos às Procuradorias da República do Rio e de Uruguaiana (RS). O objetivo é criar uma frente de investigações em conjunto com a Itália.

- Estamos convencidos de que a Lei da Anistia não se aplica aos organismos da repressão. Além disso, por se tratar de crimes contra a Humanidade não há prescrição dos casos - disse o procurador regional da República, Marlon Alberto Weichert, autor dos requerimentos ao lado da procuradora da República Eugênia Gonzaga Fávero.

O objetivo dos procuradores, que já abriram inquéritos civis, é que o MPF atue junto com as autoridades italianas que estão investigando a Operação Condor.

No Rio, os procuradores pedem a apuração do seqüestro do ítalo-argentino Horácio Domingo Campiglia e da argentina Monica Susana Pinus de Binstock, em 13 de março de 1980, no aeroporto do Galeão, por autoridades federais. Em Uruguaiana, o pedido é em relação ao seqüestro do ítalo-argentino Lorenzo Viñas, seqüestrado em 26 de julho de 1980.

Operação do DOI/CODI em 1971 também é investigada

Na avaliação do MPF, estariam envolvidas nos dois casos as seguintes autoridades públicas federais e estaduais: o coronel Carlos Alberto Ponzi, então chefe da segunda seção do Estado-Maior; o então secretário de Segurança do Rio Grande do Sul, João Leivas Job; o ex-diretor da Divisão Central de Informações Átila Rohrsetzer; o ex-delegado Marco Aurélio da Silva Reis; o ex-superintendente da Polícia Federal do Rio Agnello de Araújo Britto; o ex-secretário de Segurança do Rio de Janeiro Edmundo Murgel; e o ex-chefe do Estado-Maior do 3º Exército general Luiz Henrique Domingues. As autoridades estaduais citadas estavam a serviço federal.

Os nomes indicados nas representações sobre a Operação Condor ainda não implicam em acusação penal. Os pedidos de investigação são baseados nas notícias sobre a ordem de prisão decretada pela juíza italiana Luisanna Figliola, em dezembro de 2007, na qual foi determinada a prisão de 140 pessoas, entre as quais 11 brasileiros.

Os procuradores de São Paulo fizeram ainda uma terceira representação esta semana, pedindo a apuração do crime de seqüestro e homicídio com uso de meio cruel e sem possibilidade de defesa de Luiz José Cunha, o comandante Crioulo, militante da Ação Libertadora Nacional. Os fatos ocorreram em novembro de 1971 na capital paulista, durante diligências do DOI/CODI. O MPF avaliou que os autores do crime eram autoridades públicas agindo sob ordens de militares brasileiros: Carlos Alberto Brilhante Ustra, Sargento Miguel e Capitão Ney seriam responsáveis pela busca e prisão que resultou na morte de Cunha, conforme depoimento de Fernando Casadei Salles, ex-preso político.