Título: Projeto prevê prisão por abuso de autoridade
Autor: Carvalho, Jailton de
Fonte: O Globo, 27/07/2008, O País, p. 12

Juízes, delegados e procuradores que vazarem informações poderão ser punidos; proposta está no Ministério da Justiça

Jailton de Carvalho

BRASÍLIA. O projeto da nova lei de abuso de autoridade que será preparado pelo Ministério da Justiça, a pedido do presidente do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, deverá estabelecer penas de prisão para juízes, delegados e procuradores ou qualquer outro agente público que vazar informações sigilosas de inquéritos e processos criminais. O governo cogita incluir punição com cadeia a jornalistas que divulgarem dados sigilosos e, a partir daí, atrapalharem investigações policiais.

- Vazamento de informação que prejudica uma investigação tem quer ser punido rigorosamente. Mas, a punição tem que ser só do agente público ou do jornalista também? Isso é que tem que ir para o debate - disse o secretário de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça, Pedro Abramovay.

O secretário foi destacado pelo ministro da Justiça, Tarso Genro, para preparar a proposta da nova lei. Antes de alinhavar a proposta, Abramovay deverá acertar os principais pontos do texto com Gilmar Mendes. O ponto de partida será o projeto do deputado Raul Jungmann (PPS-PE), que prevê demissão, banimento da vida pública e até prisão por oito anos de juízes, delegados e procuradores que prejudicarem direitos de pessoas investigadas.

Para juízes, delegados e procuradores ouvidos pelo GLOBO, a proposta do deputado tem como objetivo colocar as autoridades responsáveis por grandes investigações sobre crimes financeiros contra a parede.

- Esse projeto estabelece tipos penais muito abertos. Vai representar uma intimidação ao exercício da autoridade pública - afirmou o presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil, Fernando Mattos.

"Desconheço abuso de autoridade sistemático"

O projeto classifica como abuso de autoridade "praticar, omitir ou retardar ato, no exercício de função pública, em razão dela ou a pretexto de exercê-la, com o intuito de impedir, embaraçar ou prejudicar o gozo de qualquer dos direitos e garantias constantes do título II da Constituição". Entre as garantias, Jungmann cita princípios que vão da igualdade entre homens e mulheres à liberdade individual. Para Fernando Mattos, com crimes definidos de forma genérica qualquer investigado pode inverter a lógica de um inquérito ou processo e pedir punição para os investigadores.

- Desconheço abuso de autoridade sistemático por parte da Polícia Federal ou do Ministério Público Federal - disse Antônio Carlos Bigonha, presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República.

Para Bigonha, eventuais abusos poderiam ser resolvidos nas instâncias de controle externo da PF e do próprio Ministério Público. Ele acha que este e outros projetos em tramitação no Congresso Nacional fazem parte de um movimento neoconservador pela criação de "novos espaços de impunidade".

O projeto deverá tocar em pontos centrais de investigações criminais como mandados de prisão e de busca e apreensão, uso de algemas e até a elaboração de denúncias. Para Abramovay, é importante que o Ministério Público melhore a qualidade das acusações formais feitas a partir das investigações da polícia:

- Não pode ter denúncias sem provas.

A preocupação seria evitar acusações sem fundamentação e deixar para os acusados o ônus de provar a inocência.

O presidente do Sindicato dos Delegados de Polícia Federal, Joel Jarpellon Mazzo, disse que o projeto poderá criar constrangimentos para deputados e senadores, permitindo até a prisão por vazamento de informações sigilosas. Numa resposta às primeiras críticas, Jungmann disse que seu projeto é apenas um ponto de partida. O deputado nega que o objetivo seja travar as grandes investigações de combate à corrupção.