Título: Micheletti diz não a acordo
Autor: Scofield Jr., Gilberto; Galhardo, Ricardo
Fonte: O Globo, 15/10/2009, O Mundo, p. 35

Honduras chega perto de saída para a crise, mas negociação emperra na restituição de Zelaya

Uma nova tentativa de saída para a crise hondurenha se desfez ontem poucas horas depois de ser comemorada por seus negociadores. Após uma semana de discussões, delegados do presidente Manuel Zelaya anunciaram ter chegado a um acordo preliminar com representantes do presidente interino, Roberto Micheletti, sobre a principal questão que emperra as negociações: a volta do governante deposto ao poder. Faltava apenas submeter o texto aos ¿dois presidentes¿.

O entusiasmo, porém, durou pouco: um comunicado do governo interino anunciou que o acordo não fora alcançado e que a restituição de Zelaya voltaria a ser discutida hoje.

Segundo Micheletti, os representantes de Zelaya querem que fique a cargo do Congresso decidir se o presidente deposto voltará ou não ao poder.

¿ Esse é um assunto legal que deve ser decidido pela Corte Suprema ¿ afirmou o presidente interino.

Zelaya, por sua vez, expressou dúvidas de que o governo interino deseje chegar a um acordo: ¿ Não acredito no que os golpistas dizem. Creio que ao chegar ao pontochave de rechaçar o golpe, que é a minha restituição ao cargo, Micheletti dará outra bofetada ao mundo ¿ disse Zelaya, abrigado na embaixada brasileira.

Com a extensão das discussões para hoje, elas chegam ao prazo limite dado por Zelaya na semana passada. E zelayistas ameaçam iniciar um movimento contra as eleições de 29 de novembro, caso o prazo não seja observado.

O comunicado do governo interino foi um banho de água fria num dia marcado por otimismo de negociadores de ambos os dois lados, inclusive com os militares, figuras-chave no processo que depôs Zelaya, prevendo o fim da crise. Ao fim da tarde, Victor Meza, negociador de Zelaya, anunciou que um consenso fora alcançado sobre o 6º dos 12 pontos (a volta do deposto ao poder) e que o texto seria encaminhado a ele e a Micheletti.

Brasil: candidatos serão decisivos

Outros atores podem ser decisivos na busca de uma saída. Segundo o representante do Brasil na OEA, o embaixador Ruy Casaes, a grande pendência será resolvida, previsivelmente, com a participação dos dois políticos mais bem colocados na sucessão presidencial e que possuem o controle do Congresso: Porfirio ¿Pepe¿ Lobo, do Partido Nacional, que busca um caminho independente de Zelaya e do governo golpista, e Elwin Santos, do Partido Liberal, de Micheletti.

Ao se reunir com os candidatos na visita da OEA a Tegucigalpa, semana passada, Casaes usou uma imagem típica do futebol para definir a participação deles na costura do acordo: ¿ Disse que a bola estava no campo deles e que o futuro do governo eleito dependeria de um acordo agora.

Afinal, que governo americano vai reconhecer o novo governo se não houver um acordo agora? O Brasil não pretende reconhecer.

A aprovação da recondução de Zelaya ao poder não deve ser difícil, argumenta Casaes, pela maioria que os dois partidos têm no Congresso e pelos pontos já acordados. A anistia que se esperava para os dois lados foi descartada, disse, porque ninguém quer admitir que avançou além das leis.

Mas já há pontos acertados. Os dois lados concordaram que não haverá a convocação de uma constituinte até o próximo governo e com o monitoramento do acordo a ser feito por uma comissão composta de quatro membros: dois designados pela OEA e um de cada lado. Teriam concordado ainda com um governo de conciliação, chefiado por Zelaya, até a posse do novo governo. Por fim, que investigações sobre o golpe ou sobre o rompimento constitucional no governo Zelaya só ocorrerão no próximo governo.