Título: O Brasil cresceu, mas não fez seu dever de casa na educação
Autor: Ramos, Mozart Neves
Fonte: O Globo, 25/12/2009, O País, p. 4

Especialista diz é preciso "fechar as torneiras do analfabetismo" no país

O Brasil precisa de um Programa de Aceleração do Crescimento, um PAC da Educação, defende o presidente do movimento Todos Pela Educação, Mozart Neves Ramos. Para ele, o novo presidente da República, que será eleito em 2010, deverá assumir o papel de mobilizar a sociedade e convencê-la de que a educação é essencial para um novo salto de qualidade na vida dos brasileiros. ¿O desenvolvimento só é sustentável com uma boa educação.

O Brasil cresceu na economia, fez seu dever de casa. Mas não fez seu dever de casa na educação¿, disse ao GLOBO.

Adauri Antunes Barbosa SÃO PAULO

O GLOBO: Em 2010, ano de escolher novo presidente, novos governadores, como a sociedade deve cobrar dos candidatos prioridade para a educação? MOZART NEVES RAMOS: O ano de 2010 é estratégico para colocarmos a educação na agenda da sociedade. Nos últimos anos houve uma nítida evolução da preocupação da sociedade com a educação. Hoje já começamos a ter metas.

Agora é preciso acelerar tudo de bom que tem acontecido porque esse ¿bom¿ é ainda lento em relação ao que o Brasil precisa. Melhoramos, mas em velocidade muito lenta. Para o movimento Todos pela Educação é essencial que a população se mobilize e cobre dos candidatos uma agenda de prioridades para a educação.

Do outro lado, o que os candidatos devem fazer para convencer o eleitor de que estão realmente preocupados com a educação? MOZART: Devem assumir de fato que querem melhorar.

Não da boca da fora, como temos visto em todas as eleições, em todos os níveis. No plano federal foi criado o Plano de Aceleração do Crescimento, o PAC, para resolver problemas de infra-estrutura para gerar o desenvolvimento.

Mas o desenvolvimento só é sustentável com uma boa educação.

O Brasil cresceu na economia, fez seu dever de casa.

Mas não fez seu dever de casa na educação.

Faltou para o governo fazer o PAC da Educação? MOZART: Exatamente, o PAC da Educação! A educação impacta na renda das pessoas.

Um ano a mais de estudo significa 15% a mais na renda de uma pessoa. Se tem apenas as quatro primeiras séries do ensino fundamental esse impacto é de apenas 6%. Se tem o ensino superior e faz o primeiro ano da pós-graduação, esse impacto chega a 47%.

Como pode melhorar a gestão financeira da educação neste último ano do governo Lula? MOZART: Precisamos de uma política de colaboração entre União, estados e municípios apropriada do ponto-de-vista do Fundeb. Precisamos progressivamente chegar a 5% do PIB para a educação básica.

Não dá mais para colocar R$ 2.005 por aluno/ano. Alguém pode dizer: ¿É muito simples pedir mais dinheiro¿. Ora, se o Brasil lançou um PAC de R$ 250 bilhões, o que se pede para a educação é só 10% desse programa da infra-estrutura.

Se consideramos a educação prioridade de fato e não pudermos ter um PAC de 10% para a educação, então não é prioridade. E quando falamos em prioridade, falamos em urgência.

O que está ruim e o próximo presidente vai precisar melhorar? MOZART: O que até hoje a gente não conseguiu fazer: andamos muito pouco no processo de fechar a torneira do analfabetismo. Isso é lamentável.

Nós não podemos entrar no século 21 gerando crianças analfabetas nesse país. Isso não condiz com o país que tem perspectiva de crescimento do PIB d e 5 % a 6% em 2010.

Qual a taxa de analfabetismo de crianças no Brasil? MOZART: É muito difícil saber.

Essa é uma lacuna que o atual governo deixa. É preciso fazer o monitoramento de todas as crianças até 8 anos. A questão central é instituir uma avaliação que possa me dizer como está indo o grau de alfabetização das crianças até 8 anos no Brasil e a partir daí corrigir as deficiências. Temos que fechar a torneira do analfabetismo.

Não podemos mais ser uma país protagonista da economia global tendo ainda tantas crianças analfabetas.

Com base no que o presidente Lula fez, como deve agir o próximo presidente da República em relação à educação? MOZART: O próximo presidente tem que ter um canal para falar com a população sobre educação, para que dê sinais claros de que a educação é importante, de que está preocupado com a sua qualidade, com a participação dos pais na vida escolar dos seus filhos. E por que o novo presidente deve ficar preocupado? Porque ele sabe que só terá um país melhor se essas crianças e esses jovens forem bem formados. Ele tem que mobilizar, tem que ser o embaixador, o líder dessa transformação do país na área social. Ele vai fazer o que? A reforma política? É importante, obviamente, mas...

Qualquer reforma política não é muito mais difícil do que a educação? MOZART: Sem dúvida! No cenário econômico o Brasil encontrou a fórmula. Para encontrar a fórmula na área social, o que é preciso, as bolsas ¿ Bolsa Família, bolsa isso, bolsa aquilo ¿ são paliativos, importantes, é claro, mas para uma passagem. Passagem que tem que terminar.

Agora tem que ser estruturador.

Não podemos dar a Bolsa Família porque a pessoa está desempregada. É preciso que a criança esteja na escola e aprendendo.

Como o presidente deve falar aos brasileiros sobre educação? MOZART: Como um líder! Para falar ao povo brasileiro sobre a importância da educação para o que o país dê agora o segundo salto, neste século 21. O primeiro veio com a economia, com o presidente Lula. Agora, então, é hora de fazer essa transformação.

E o novo presidente tem de ser um líder para que o Brasil tenha de fato uma educação de qualidade.

Como o novo presidente deve começar o novo governo? MOZART: Tem de ter um plano.

O próximo ministro, orientado pelo presidente, no primeiro dia, tem que bater na mesa e dizer: ¿Tenho um plano que vai ser construído para valorizar o professor nos próximos anos. A desvalorização do professor na sociedade vai começar a ser combatida hoje¿.

E vai ser combatida assim, assim e assim. Não temos mais tempo para perder