Título: Bolsa vazia para as empresas
Autor: Villas Bôas, Bruno
Fonte: O Globo, 26/04/2010, Economia, p. 15

Estreantes captam só R$ 6,9 bilhões na Bovespa em 2010, um terço do previsto

No momento em que a economia brasileira se prepara para crescer a um ritmo recorde, as empresas ainda enfrentam dificuldade para obter dinheiro em uma importante fonte de recursos: o mercado de ações. O apetite de investidores por ofertas públicas iniciais (IPOs, na sigla em inglês) de empresas brasileiras continua sem sal. Neste ano, sete empresas realizaram ofertas de ações na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa), na expectativa de obter de R$ 13,7 bilhões a R$ 18,1 bilhões para investimentos. Mas o valor levantado por elas ficou muito aquém disso: R$ 6,9 bilhões, quase um terço do previsto no melhor cenário, segundo levantamento do GLOBO. Nenhuma das sete empresas que fizeram IPOs neste ano conseguiu levantar os recursos pretendidos. Foram elas: Aliansce Shopping Center, Multiplus, BR Properties, OSX Brasil, José Simões Logística, Ecorodovias e Mills Engenharia. As cinco primeiras precisaram dar desconto nos preços das ações para atrair investidores. O insucesso das empresas preocupa.

¿ As empresas ficam mais dependentes do crédito oferecido por bancos públicos, como o BNDES. Quem prefere contar com o capital privado sente falta ¿ afirma Luiz Roberto Cunha, economista da PUC-Rio.

O mau-humor do mercado venceu até o empresário Eike Batista, famoso por captar grande volume de recursos para suas empresas na Bovespa. Após o insucesso na oferta de ações de sua empresa de construção naval OSX (que captou R$ 2,45 bilhões, enquanto o esperado era de até R$ 9,9 bilhões), Eike desistiu do IPO da holding EBX. Em outro caso recente, a gestora de fundos Advent cancelou a oferta de sua unidade de restaurantes International Meal. A empresa busca agora alternativas para captar recursos. Para economistas, investidores continuam seletivos na escolha de onde aplicar o dinheiro. Temem riscos de uma nova crise que interrompa a recuperação da economia. Alex Agostini, da Austin Ratings, diz que o cenário não deve melhorar até o segundo semestre.

¿ Os investidores continuam com o pé no freio. Preferem colocar dinheiro em negócios de pouco riscos. E empresas novas na bolsa quase sempre têm riscos ¿ diz Agostini.

Segundo dados da BM&F Bovespa, estrangeiros são os mais cautelosos. Neste ano, 66% das ações vendidas pelas empresas em IPOs foram parar nas mãos deles. Em 2007, os estrangeiros respondiam por 70% das ações ofertadas. Quatro empresas aguardam hoje aprovação da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) ¿ xerife do mercado de ações ¿ para lançar papéis: GRV Solutions, WTorres Empreendimentos, Sonae Sierra Brasil e Brasil Insurance. Em 2007, antes da crise, foram R$ 55,64 bilhões Para o ex-presidente do Banco Central (BC) Arminio Fraga, o mercado pode apenas estar voltando à normalidade, após um desempenho sem precedentes em 2007, quando 64 empresas captaram R$ 55,64 bilhões em IPOs no país.

¿ O mercado pode estar em ritmo de normalidade. O parâmetro de 2007 foi de exagero, não só aqui, mas no mundo ¿ disse Arminio, em conversa com jornalistas no Rio. Mesmo com os insucessos, uma pesquisa da consultoria Ernst & Young mostra que as ofertas realizadas no Brasil nos três primeiros meses deste ano colocam a Bovespa entre as seis bolsas com maior volume de IPOs no mundo. Segundo o estudo, empresas captaram na Bovespa US$ 3,3 bilhões de janeiro a março, o que representa 6,2% do volume das ofertas no mundo. O ranking é liderado pela Bolsa de Tóquio, onde os IPOs somam US$ 11 bilhões nos três meses, algo como 21% do total mundial. Paulo Sérgio Dortas, sócio da área de IPOs da Ernst & Young, diz que o fraco desempenho dos IPOs neste ano não são uma exclusividade do mercado brasileiro de ações. ¿ Os investidores do mundo inteiro estão mais exigentes sobre a qualidade do que está sendo oferecido e tamanho dos riscos dos papéis ¿ afirma Dortas