Título: Lula adia negociação sobre reajuste do Judiciário
Autor: Alvarez, Regina; Jungblut, Cristiane
Fonte: O Globo, 02/07/2010, O País, p. 16

Decisão em relação a projeto que aumenta gastos em R$6,4 bi fica para depois das eleições

OS MINISTROS Peluso, presidente do STF, e Lewandowski, presidente do TSE, após encontro com Lula

BRASÍLIA. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva acertou ontem com a cúpula do Judiciário que a decisão final sobre os reajustes salariais para os servidores daquele poder só será tomada depois das eleições, com o aval do seu sucessor. Com o acordo, Lula conseguiu neutralizar a pressão do Judiciário para a aprovação do projeto de reestruturação das carreiras dos tribunais - que representa uma despesa adicional de R$6,4 bilhões nas contas públicas -, mas também inviabilizou a concessão de novos aumentos para carreiras do próprio Executivo. Esses novos aumentos estavam sendo negociados nos bastidores do governo e tiveram de ser abortados ontem, depois do acerto com o Judiciário.

Lula se reuniu pela manhã com o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Cezar Peluso, e com o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Ricardo Lewandowski, para tratar do impasse em torno do projeto de lei que assegura reajuste médio de 56% para as carreiras do Judiciário. O projeto está pronto para ser votado na Câmara dos Deputados, mas o presidente já tinha avisado que não sancionaria, se aprovado.

Despesa extra não está prevista no Orçamento

O principal argumento do governo para não aprovar o novo plano de salários do Judiciário é que a despesa não está prevista no Orçamento de 2010 e, segundo o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, não há qualquer possibilidade de inclui-la ainda este ano. Bernardo relatou o resultado do encontro de Lula com os ministros do Supremo.

- O presidente propôs, e os ministros concordaram que a decisão fosse adiada para outubro, depois da eleição presidencial. O presidente Lula não se sente confortável em deixar o problema fiscal para ser resolvido no próximo governo - disse o ministro.

A decisão de suspender todas as negociações sobre reajustes e adiar as decisões para depois das eleições surpreendeu aliados que negociam as votações no Congresso. Segundo interlocutores, o governo resolveu "comprar briga" com setores que pressionavam. Nos últimos dias, Lula reclamou em discurso das constantes greves no Incra, por exemplo.

Se um acordo com o Judiciário tivesse sido fechado para a concessão dos reajustes, o governo preparava uma medida provisória que seria editada ainda hoje - na data limite de 2 de julho prevista pela lei eleitoral - promovendo a reestruturação de carreiras da área da Educação e do Desenvolvimento Agrário.

Responsável pelas negociações do governo na Comissão Mista de Orçamento e vice-líder do governo no Congresso, o deputado Gilmar Machado (PT-MG), chegou a anunciar em discurso, num plenário vazio, que naquele momento estava ocorrendo uma negociação com o Poder Judiciário e que hoje deveria ser encaminhada uma proposta promovendo a reestruturação para algumas carreiras com impacto no Orçamento de 2011. Mas, em seguida, foi informado de que tudo isso fora suspenso.

- O governo entendeu que é melhor deixar para o próximo governo. Está tudo suspenso - disse Gilmar Machado. - Não vamos arrombar nem quebrar as contas (públicas). Sabemos o que estamos fazendo.

Ministro diz que sindicalistas não gostaram

Incumbido por Lula de se reunir com as lideranças sindicais do Judiciário, para comunicar a proposta de adiar a decisão, o ministro Paulo Bernardo não foi bem sucedido.

- Os sindicalistas não gostaram da proposta e pediram para refazer o calendário de outra forma. Marcamos uma (nova) reunião para quinta-feira - informou o ministro, depois do encontro que aconteceu na Advogacia Geral da União (AGU), adiantando que a decisão de Lula estava tomada. - Estamos agora é tentando nos entender com os sindicalistas. Sentar na mesa para achar uma saída que seria referendada pelo próximo governo depois das eleições.

Paulo Bernardo deixou claro que qualquer acordo fechado com os sindicalistas teria que ser referendado pelo presidente eleito. Mas já adiantou que os reajustes terão de ser parcelados e pagos só a partir de 2011.