Título: Pai de Joanna é indiciado por crime de tortura
Autor: Werneck, Antônio; Mascarenhas, Gabriel
Fonte: O Globo, 16/10/2010, Rio, p. 20

Delegado diz que técnico judiciário tinha prazer em ferir a filha e que MP pode acusá-lo também de homicídio

JOANNA MARCENAL Marins: a menina, que morreu de meningite, tinha diversos hematomas pelo corpo

Depois de três meses de investigações e cerca de 50 pessoas ouvidas como testemunhas no inquérito, o delegado Luiz Henrique Marques Pereira, titular da Delegacia da Criança e do Adolescente Vítima (Dcav), anunciou ontem o indiciamento por crime de tortura o técnico judiciário André Rodrigues Marins, pai da menina Joanna Marcenal Marins, de 5 anos, morta em agosto. O inquérito foi enviado para o Ministério Público estadual. O delegado não confirmou, mas juntamente com o inquérito, ele teria representado pela prisão preventiva de Marins. O pai da menina nega as acusações. A pena por tortura pode chegar a oito anos de prisão.

O delegado explicou que, durante as investigações, ficou comprovado que a menina sofria tortura e não maus-tratos ¿ agressões com intuito de corrigir comportamentos da criança. Pereira disse ainda que não está descartada a possibilidade de o pai ser indiciado também por homicídio, mas a decisão agora é do Ministério Público.

¿ Ele tratava a menina de forma desumana, tinha prazer em torturar. Por isso, no meu entendimento, há fortes indícios de crime de tortura ¿ afirmou o delegado.

Depoimento de babá foi crucial para o inquérito

O pai e a mãe de Joanna, Cristiane Cardoso Marcenal Ferraz, travavam uma batalha judicial pela guarda da criança desde 2004. Quando morreu, a menina estava sob os cuidados do pai havia um mês e vinte dias. Uma das principais testemunhas do processo foi uma ex-babá contratada pelo pai de Joanna, que contou, em depoimento aos policiais da Decav, revelado com exclusividade pelo GLOBO, que em seu primeiro dia de trabalho se deparou com a criança no canto de um quarto, ¿deitada no chão, amarrada numa fita-crepe nos pés e nas mãos e toda suja de xixi e cocô¿.

Ela contou que, diante do seu espanto, o pai disse que a menina estava ¿daquele jeito¿ por ter sofrido uma convulsão no dia anterior. Ele teria alegado ainda que seguia ¿recomendação médica¿. A babá teria se oferecido para limpar a Joana, que vestia apenas calcinha e camiseta regata, e colocá-la na cama, mas o pai teria argumentado que a menina sujaria tudo, e sua mulher, Vanessa Maia, ¿não iria gostar¿. André teria dito ainda que a filha era ¿especial¿.

A psicóloga que atendeu Joanna em seus últimos dias de vida, porém, desmentiu a versão do pai . Segundo Lilian Araújo Paiva, Marins relatou que a menina se debatia muito durante à noite e acabava se ferindo. Ele teria perguntado, de acordo com Lilian, se poderia usar uma luvinha para evitar que Joanna se arranhasse:

¿ Disse que não via problema em usar uma luvinha, às vezes a gente faz isso para um bebê não se arranhar. Eu jamais diria para ele amarrar as mãos de Joanna. Nunca fiz isso ¿ afirmou na época.

No dia 27 de setembro, conforme O GLOBO divulgou, o laudo do Instituto Médico Legal (IML) apontou que a causa da morte de Joanna foi meningite causada pelo vírus da herpes. O pai atribuiu os hematomas e marcas semelhantes a queimaduras no corpo da menina às sucessivas convulsões sofridas por Joanna:

¿ O laudo foi incapaz de identificar a origem dessas lesões. Por isso, não tenho nenhum medo de ser indiciado por coisa alguma. Como serei incriminado por algo que os peritos não sabem causa? ¿ garantiu Marins na época.

oglobo.com.br/opiniao