Título: Bin Laden só pensava naquilo
Autor: Eichenberg, Fernando
Fonte: O Globo, 13/05/2011, O Mundo, p. 28

Em seu esconderijo na cidade paquistanesa de Abbottabad, Osama bin Laden não passava seus dias como um líder terrorista isolado e aposentado, mero espectador da atualidade no mundo e de suas próprias imagens na TV. Diários manuscritos, emails e outros documentos apreendidos pelo comando especial americano que o eliminou no 1º de maio revelam que o chefe da rede al-Qaeda estava em plena atividade, em contato com lideranças regionais do grupo, e obcecado por arquitetar novos atentados contra os Estados Unidos e outros países do Ocidente. A obsessão do líder terrorista em atacar esses alvos, em detrimento de operações no Afeganistão ou no Paquistão, não era partilhada por alguns de seus seguidores ¿ mais preocupados com questões regionais e receosos de fortes contra-ataques por parte de Washington ¿ e acabaria provocando divisões dentro da al-Qaeda.

Segundo informações fornecidas a veículos da imprensa ¿ entre eles os jornais ¿Washington Post¿, ¿New York Times¿ e a agência de notícias Associated Press ¿ por autoridades americanas que analisam o material encontrado no refúgio, Bin Laden pedia em mensagens a líderes da al-Qaeda que fossem planejados ataques em Los Angeles e em cidades de menor porte nos EUA. Os pedidos eram endereçados inclusive à al-Qaeda da Península Arábica, a célula iemenita considerada um de seus braços mais violentos.

Os atentados deveriam ter como alvo trens e aviões, e ser agendados, na medida do possível, em datas simbólicas americanas, como 4 de julho, dia da Independência, ou 11 de Setembro, aniversário da destruição das Torres Gêmeas, em Nova York. Em seus escritos, Bin Laden recomendaria o recrutamento de militantes não muçulmanos, vindos de comunidades por ele consideradas oprimidas nos EUA, principalmente negros e latinos, e sugeria ainda uma ação especial este ano, no 10ºº aniversário dos atentados de 11 de setembro de 2001.

Para líder, 11/9 não foi suficiente

A estratégia revelada nos documentos priorizava, segundo as fontes do governo, o maior número de vítimas americanas num único ataque, para obrigar a saída das tropas dos EUA envolvidas em conflitos em países do Oriente Médio. Em seus maquiavélicos cálculos terroristas, dizem as fontes citadas pela imprensa, as mortes provocadas em 11 de setembro de 2001 não tiveram o impacto esperado, e somente um número maior de vítimas poderia provocar algum efeito mais significativo na alteração dos planos militares americanos. Com novos ataques, Bin Laden pretendia também alimentar a desunião e incompreensão política em Washington, e acirrar as desavenças entre democratas e republicanos.

Ontem, o procurador-geral dos EUA, Eric Holder, negou a versão de que o principal objetivo da missão da força especial integrada por agentes do Navy Seals, da Marinha, era matar Bin Laden.

¿ Se houvesse a possibilidade de uma rendição factível, isso teria acontecido ¿ sustentou Holder em entrevista a BBC.

Segundo Holder, a operação era destinada a ¿matar ou capturar¿ o líder terrorista, e os EUA teriam aceito uma proposta de rendição.

¿ Mas a proteção das forças que entraram no complexo era o principal objetivo que tínhamos em mente ¿ justificou.

O senador republicano James Inhofe, membro da Comissão das Forças Armadas do Senado, um dos parlamentares a quem foi dado acesso às fotos de Bin Laden morto, disse que as imagens são ¿pavorosas¿, algumas mostrando parte do cérebro saindo pelo globo ocular.

¿ Ele se foi. Ele é história ¿ disse o senador em entrevista à rede CNN, após ter visto 15 das fotos mantidas em segredo pelo governo americano.