Título: Euforia nos EUA será passageira
Autor: Allan, Ricardo
Fonte: Correio Braziliense, 08/08/2009, Economia, p. 17

O presidente americano Barack Obama comemora o discreto aumento do emprego e atribui o resultado à sua equipe econômica. O comandante do BC brasileiro,Henrique Meirelles, sugere cautela diante do otimismo do mercado

A divulgação de dados mostrando uma pequena melhora nos números do desemprego levou o governo dos Estados Unidos à beira da euforia ontem. Num tom quase triunfalista, o presidente Barack Obama atribuiu o momento de recuperação às ações tomadas por sua equipe econômica, principalmente o megapacote de US$ 787 bilhões para incentivar o nível de atividade. Analistas de mercado nos EUA esperam um crescimento em torno de 3% no terceiro trimestre, um salto expressivo diante da queda de 1% entre abril e junho. Os próprios consultores, porém, fazem um alerta: é preciso ter cautela. O impulso dado pela expansão fiscal está se esgotando e os indicadores devem piorar a partir de outubro. A crise na maior economia do mundo está longe do fim.

O país fechou 247 mil postos de trabalho em julho, o menor corte desde agosto de 2008. O dado superou a expectativa dos analistas, que previam uma redução de 325 mil vagas. Em junho, por exemplo, 443 mil empregos desapareceram. A taxa de desemprego também surpreendeu, caindo levemente de 9,5% para 9,4%, voltando ao nível de maio. As consultorias estimavam que ela pularia para 9,7%. Diante dos números, Obama não se segurou, se afastando por um instante da tradicional fleuma. Ele afirmou que sua administração evitou uma ¿catástrofe¿. Mais uma vez, o presidente garantiu que os americanos estão presenciando ¿o início do fim da recessão¿.

¿Nosso sistema financeiro não está mais à beira do colapso. O mercado está avançando. Os preços das casas estão subindo pela primeira vez em três anos. Nós estamos perdendo empregos na metade da taxa do começo do ano. Estou convencido de que as ações que tomamos nos primeiros seis meses ajudaram a frear a queda livre de nossa economia¿, afirmou Obama. Sua secretária do Trabalho, Hilda Solis, foi mais comedida. Em entrevista à rede CNBC, disse que os números não sinalizam o fim da recessão. ¿Eu não diria que ela acabou. Enquanto continuarmos vendo perdas de emprego e com uma taxa elevada de desemprego, teremos problemas¿, disse. Ela espera que o nível de desocupação suba para 10%, mas analistas projetam até 11% em 2010.

Preocupação

Em audiência na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), na quarta-feira, o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, advertiu contra a euforia nos mercados. Para ele, o contexto mundial inspira preocupação, com a economia europeia e a japonesa lutando para emergir, sem sucesso. Analistas nos Estados Unidos preveem uma expansão de 1% no Produto Interno Bruto (PIB) no país em 2010, ritmo maior que o europeu e o japonês. ¿As coisas melhoraram na economia americana, mas seu estado geral continua bastante fragilizado. Seria irreal imaginar que não ouviremos outras notícias ruins¿, afirmou o economista Filipe Albert, da Tendências Consultoria.

O alto endividamento dos trabalhadores impede a expansão numa velocidade mais rápida. Temendo perder o emprego, eles preferem poupar. Por isso, o consumo, que responde por até 70% do PIB dos EUA, está se recuperando lentamente. A recusa do sistema financeiro em liberar novos empréstimos também atrapalha. ¿Como o cenário ainda não é dos melhores, os bancos estão retraídos, devolvendo o dinheiro recebido do governo para não ter de aumentar os financiamentos. A tendência é se recolher um pouco, esperando o que virá¿, disse Albert.

No chão

247 mil - Total do corte de vagas no mercado de trabalho americano em julho

1% - Previsão para a expansão do PIB dos Estados Unidos em 2010

Indústria respira

Os dados divulgados ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) sobre o emprego industrial mostram queda no ritmo de demissões e uma indicação de possível retomada das contratações. O nível de emprego, que havia diminuído 0,5% em maio, caiu apenas 0,1% em junho. Após oito meses seguidos de queda, o número de horas pagas subiu 0,5%. Para o economista-chefe do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), Rogério César de Souza, os dados mostram perspectiva de recuperação no setor.

¿As horas pagas são um dado auspicioso. Existe um caminho para a recuperação, já que o ajuste na produção já foi feito¿, disse. O alívio pode ser entendido quando se compara a estabilidade atual com o tombo que o emprego industrial sofreu depois do acirramento da crise internacional, em setembro do ano passado, quando o banco norte-americano Lehmann Brothers quebrou. No primeiro semestre, o indicador despencou 5,1%, o pior desempenho para o período desde o início da série histórica do IBGE, em 2001. De acordo com o instituto, a queda recorde foi consequência direta da crise na produção industrial, que recuou 13,4% no semestre.

Na comparação entre junho e o mesmo mês de 2008, o emprego caiu 6,6%, a pior taxa negativa já registrada nesse tipo de comparação. O recuo foi disseminado em todas as 14 regiões pesquisadas, sobretudo em São Paulo (-3,9%), Minas Gerais (-6,7%) e Rio Grande do Sul (-6,8%). Entre os setores, 15 apresentaram resultados negativos, com destaque para vestuário (-9,1%) e meios de transporte (-7,6%). A folha de pagamento real registrou queda de 1,7% em junho.