Título: Procurador: não há indício de tráfico de influência e enriquecimento ilícito
Autor:
Fonte: O Globo, 07/06/2011, O País, p. 4

CRISE NO GOVERNO

Segundo Gurgel, ministro apresentou faturamento e lista de clientes da Projeto

BRASÍLIA. O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, arquivou ontem as quatro representações em que partidos de oposição pediam abertura de investigação criminal contra o chefe da Casa Civil, Antonio Palocci. Reportagens levantaram a suspeita contra ele com base no crescimento de seu patrimônio e nos negócios de sua consultoria, a Projeto, com empresas investigadas pela Polícia Federal. Na decisão, de 27 páginas, Gurgel disse que não há indício da prática de qualquer crime.

Segundo Gurgel, aparentemente, o caso pode ser visto como improbidade administrativa, não crime, e que não é atribuição da Procuradoria analisar esse tipo de infração. "Os fatos, entretanto, tais como descritos nas representações, não configuram infração penal. Ao contrário do que asseveram os representantes, a lei penal não tipifica como crime a incompatibilidade entre o patrimônio e a renda declarada. Trata-se de fato que, em tese, poderá configurar ato de improbidade administrativa", escreveu. Essa linha de investigação já foi aberta pelo MP do DF na 1ª instância da Justiça Federal.

Por ser ministro, Palocci tem o direito de ser processado e julgado no STF. Mas não há foro privilegiado para improbidade administrativa. Cabe, portanto, ao MP do DF conduzir essa investigação, o que já está sendo feito.

Segundo Gurgel, não é crime ter patrimônio incompatível com a renda; só poderia ser ilegal se a origem dos bens fosse comprovadamente ilícita. Para ele, não há indício de que o dinheiro de Palocci tenha sido obtido ilegalmente ou de uso de cargo público a favor de clientes.

Gurgel disse que, para pedir quebra de sigilo de Palocci, como IR ou movimentação bancária, seria preciso um mínimo de indícios. "A mera afirmação, articulada de forma genérica e desacompanhada de qualquer elemento indiciário, de que o representado adquiriu bens em valor superior à renda que auferiu como parlamentar, não enseja evidentemente a instauração de inquérito", escreveu. "O fato isoladamente considerado não constitui crime - o que seria suficiente para impedir realização de atos investigatórios -, e também porque não permite especificação de eventuais diligências que pudessem ser requeridas ao órgão judicial", concluiu.

Para o arquivamento, Gurgel considerou ainda que não havia documentos como base das acusações, só reportagens. Ressaltou que não havia indício de sonegação e que Palocci apresentou faturamento da empresa ano a ano e quanto recebeu de cada cliente. Gurgel disse que, em documentos apresentados por Palocci, a Projeto "não celebrou contrato com pessoa jurídica de direito público nem gozou de favores decorrentes de contratos dessa natureza, o que afasta a suspeita de que o representado agiu ilicitamente ao manter-se na administração da Projeto durante o período em que exerceu o mandato parlamentar."

Ainda segundo Gurgel, não se pode falar em tráfico de influência, por falta de indício: "Não há indicação de que o representado teria solicitado, exigido, cobrado ou obtido vantagem indevida valendo-se de algum artifício, ardil ou mentira para fazer crer, aos clientes da sua empresa, que teria influência com servidores públicos para obter os negócios ou contratos que pretendiam".

Gurgel sustentou ainda que não iria pedir abertura de inquérito só porque o caso está nos jornais. "A enorme repercussão do caso, que tem estado nas primeiras páginas há semanas, em razão da notória importância do representado no cenário político, talvez recomendasse, como caminho mais simpático para o MP que, a despeito da insuficiência absoluta de indícios, promovesse a continuidade da investigação, porque "procurando, vai achar", "certamente há algo de errado" e outras trivialidades. A Constituição e as graves responsabilidades da instituição e do seu cargo não autorizam, porém, o Procurador-Geral a ceder a tais bordões". Ele escreveu que "não se prestará a servir de instrumento do enfraquecimento institucional de qualquer dos poderes". Os pedidos de investigação foram feitos por parlamentares de PSDB, DEM e PPS.

Líderes da oposição lamentaram, disseram que a situação de Palocci continua insustentável e que vão lutar por uma CPI.