Título: STF mantém decisão de Lula e manda soltar Battisti
Autor: Brígido, Carolina; Alencastro, Catarina
Fonte: O Globo, 09/06/2011, O País, p. 13

Por seis votos a três, Corte manda libertar ex-ativista italiano; governo da Itália deverá recorrer ao Tribunal de Haia

BRASÍLIA. Por seis votos a três, o Supremo Tribunal Federal (STF) manteve a decisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva de não extraditar o ex-ativista italiano Cesare Battisti. Por conseqüência, determinou a libertação do réu - que aguardava preso o desfecho da situação na Penitenciária da Papuda, em Brasília. Ele poderá viver em liberdade no Brasil. Se fosse mandado de volta à Itália, teria de cumprir pena de prisão pela morte de quatro pessoas na década de 1970, quando integrava um grupo de extrema esquerda. O advogado Nabor Bulhões disse que o governo da Itália cogita recorrer ao Tribunal de Haia.

A libertação não é imediata, devido à burocracia judicial. A expectativa da defesa é de que Battisti seja solto hoje. Votaram a favor de Battisti os ministros Luiz Fux, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Joaquim Barbosa, Carlos Ayres Britto e Marco Aurélio Mello. Por outro lado, três ministros defenderam a nulidade do ato do ex-presidente e, por isso, queriam a extradição. São eles: Gilmar Mendes, Ellen Gracie e Cezar Peluso.

O tribunal autorizou a extradição de Battisti em novembro de 2009, mas deu a palavra final ao presidente da República. Em dezembro de 2010, Lula publicou no Diário Oficial a recusa em mandar Battisti para a Itália. O governo italiano recorreu, dizendo que Lula não tinha o direito de tomar decisão diferente do estabelecido pelo tribunal.

Ontem, a maioria dos integrantes da Corte argumentou que extradição é ato de soberania nacional e de política externa, conduzida exclusivamente pelo chefe do Executivo. Os ministros arquivaram o pedido da Itália sem julgá-lo, por motivo técnico: outro país não teria poderes para questionar na Justiça ato de presidente da República.

Mesmo após a decisão, o relator, ministro Gilmar Mendes, quis discutir se o presidente da República tem mesmo o direito de tomar decisão final em processo de extradição. Para ele, essa interpretação é absurda, porque reduziria o papel da Corte a uma atividade "lítero-poético-recreativa". No início de seu voto, a atitude de Gilmar Mendes provocou confusão e revolta.

- O STF resolveu a questão, indicou qual a linha que o presidente da República poderia tomar e ele tomou a decisão. Questão encerrada. Chega! - criticou Joaquim Barbosa.

Gilmar determinou a extradição do italiano e invalidou a decisão de Lula. O relator argumentou que o presidente Lula não tinha o direito de tomar decisão diferente do que entendeu o STF em 2009. Segundo o tratado de extradição firmado entre Brasil e Itália, um dos países pode recusar a extradição se houver risco de perseguição ao réu em seu país de origem. Na decisão, Lula evocou essa hipótese, com base em notícias da imprensa italiana. Gilmar considerou o motivo fraco e lembrou que nenhum outro presidente brasileiro tomou atitude como esta.

- O STF tem algum dever de cumprir a decisão presidencial em tema de extradição? Parece que as coisas estão colocadas de ponta cabeça. Se se trata de decisão política, retire a competência do Supremo. É a primeira vez que essa questão se coloca, e fala-se disso com uma naturalidade enorme, como se tivessem dizendo "sempre foi assim". Não, nunca foi assim, é bom q se diga: nunca foi assim, sempre se cumpriu a extradição!

Após o voto de Gilmar, que estava visivelmente irritado, o ministro Luiz Fux criticou, com ironia, o voto do colega:

- Efetivamente, o ministro Gilmar Mendes é uma inteligência privilegiada. Não obstante não tenha sido conhecida a reclamação ele trouxe à baila todo o processo de extradição. Eu que não havia participado de nenhum dos julgamentos já conheço todo o processo. Ficamos mais de três horas ouvindo a história de todo o processo.

Alguns ministros sustentaram que, se Lula descumpriu o tratado internacional, essa análise deveria ser feita por tribunais internacionais. Do lado de fora do STF, 200 manifestantes pediam a soltura do italiano.