Título: A máfia dos remédios
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Fonte: Correio Braziliense, 12/08/2009, Opinião, p. 16

Pelas fronteiras com Paraguai, Bolívia e Uruguai sempre houve invasão de mercadorias contrabandeadas, atividade criminosa combatida com certa apatia pelas autoridades brasileiras. Mas a situação evoluiu para estágio que convoca imediata e enérgica repressão, sobretudo para proteger de grave ameaça a saúde da população. A série de reportagens sob o título ¿Cura falsificada¿, em publicação no Correio Braziliense e Estado de Minas, mostra a entrada em território nacional, via contrabando, de quantidades alarmantes de remédios falsificados e equipamentos médicos de origem suspeita.

O Paraguai figura como principal fonte para abastecimento do comércio ilícito. Ciudad del Leste (município fronteiriço ao Brasil) é a terceira maior zona franca do mundo. Perde apenas para Miami e Hong Kong. É ali que contrabandistas brasileiros adquirem medicamentos fajutos fabricados em fundos de quintal e produtos hospitalares sem autenticidade. Em Foz do Iguaçu, no lado brasileiro, só nos primeiros sete meses deste ano a Polícia Federal apreendeu 551.400 itens farmacêuticos made in Paraguai. Já operação da Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa) interceptou 21 mil comprimidos com diversas indicações terapêuticas.

Entre os específicos mais procurados despontam o Tamiflu ¿ empregado no tratamento contra o vírus H1M1, indutor da gripe suína ¿, o Pramil (o Viagra paraguaio), o Reumazim e o Citotec. A ingestão de semelhantes fármacos falsificados carrega efeitos catastróficos à saúde, a morte inclusive. Mais grave: não apenas pela Ponte da Amizade, que liga Ciudad del Leste a Foz do Iguaçu, ocorre a contravenção. O negócio transita por mil quilômetros de fronteiras secas e de portos clandestinos no Lago Itaipu e Rio Paraná.

Também nos limites com a Bolívia sucede a mesma atividade ilegal. Em San Mathias, cidade boliviana a 80 quilômetros de Cáceres (Mato Grosso), brasileiros se abastecem dos mesmos produtos vendidos em Ciudad del Leste. Ali, o comércio incide, em particular, sobre agentes medicamentosos proibidos no Brasil, mas vendidos a brasileiros lesados pela pregação criminosa dos delinquentes.

Entre Santana do Livramento, no Rio Grande do Sul, e Rivera, no Uruguai, as transações também abarcam produtos farmacêuticos inautênticos, embora em quantidades menores, conforme registros da Policia Federal. O problema mais sério é que, na cidade uruguaia, é livre a compra de remédios sujeitos, no Brasil, a apresentação de receitas médicas.

Preocupação especial predomina no cenário em que se desenvolve a violação das fronteiras. Os amplos espaços a serem objeto de fiscalização e repressão dificultam a execução de medidas eficazes. Todavia, diante das consequências trágicas já anotadas e tendentes a assumir proporções incontroláveis, é imperiosa a mobilização de todos os meios disponíveis da União e dos estados para superar a situação anormal.