Título: América Latina em compasso de espera
Autor: Fleck, Isabel
Fonte: Correio Braziliense, 24/08/2009, Mundo, p. 27

Demora na confirmação de indicados para a embaixada no Brasil e para a Subsecretaria de Estado ameaça política regional da Casa Branca, pois a afasta dos problemas vizinhos

A confirmação dos nomes de Arturo Valenzuela como subsecretário de Estado para o continente americano e de Thomas Shannon como embaixador dos Estados Unidos no Brasil deve demorar, pelo menos, mais duas semanas. As objeções colocadas por senadores republicanos às indicações de Barack Obama fizeram com que a aprovação no plenário da Casa fosse adiada para depois do recesso parlamentar, que termina em 8 de setembro. A manobra aumenta a espera, iniciada após o anúncio dos escolhidos em maio, para que os interlocutores apontados pelo presidente assumam suas funções. Para analistas, a demora, apesar de comum, pode criar um ¿vácuo¿ ainda maior de ação da diplomacia americana no continente.

¿Existe até uma continuidade nas políticas para a região, mas a falta de um interlocutor (apontado por Obama) atrapalha, no sentido da legitimidade das ações¿, destaca a professora de relações internacionais da Universidade Estadual Paulista (Unesp) Cristina Pecequilo. O ¿vazio¿ diplomático dos EUA na região pôde ser percebido em questões recentes, como o conflito em Honduras, em que a Organização dos Estados Americanos (OEA) e o presidente da Costa Rica, Oscar Arias, tomaram a frente das negociações, apesar dos apelos por um maior envolvimento do governo americano.

Para o diplomata brasileiro Roberto Abdenur, que foi embaixador em Washington entre 2004 e 2007, é visível que o governo Obama ainda não ¿cristalizou um funcionamento adequado para a América Latina¿. ¿Não quer dizer que a América Latina não esteja no `radar¿, mas é que eles ainda não tiveram tempo de se organizar para a região, e, nessas circunstâncias, cada um faz o que lhe convém¿, afirma Abdenur, referindo-se à possibilidade de a Defesa americana ter aproveitado esses seis primeiros meses para avançar com seus projetos na região, como o uso de bases na Colômbia. ¿O Pentágono tem a sua própria dinâmica e nem sempre existe adequada coordenação entre os vários setores do governo americano¿, explica.

O cientista político da Universidade de Brasília (UnB) David Fleischer, acredita, inclusive, que o governo Obama ¿demorou demais¿ para nomear esses representantes ¿ que só deverão assumir no último trimestre do ano. ¿Ele deveria ter nomeado essas pessoas em fevereiro, assim que a Hillary (Clinton, secretária de Estado) assumiu¿, diz. ¿O problema é que o governo Obama não está bem aparelhado na América Latina. No caso das bases na Colômbia, por exemplo, houve falta de comunicação (com a região)¿, opina.

Obstáculos Os entraves colocados por representantes da minoria republicana baseavam-se nas posições de Shannon e Valenzuela sobre as tarifas de importação do etanol brasileiro e sobre a situação em Honduras, respectivamente. ¿Os republicanos estão em minoria tanto na Câmara como no Senado, e, como um dos únicos poderes que eles têm é a capacidade de bloquear as confirmações, eles fazem isso até que suas preocupações sejam atendidas¿, explica o pesquisador do American Enterprise Institute Philip Levy.

O senador Charles Grassley, representante de Iowa, conhecido estado produtor de milho ¿ matéria-prima para o álcool combustível dos EUA ¿, questionou as declarações de Shannon de que seria ¿benéfico¿ para o país rever a tarifa de US$ 0,54 por galão de etanol importado. Dois dias depois, no entanto, o republicano retirou a objeção à confirmação, após receber uma carta de Hillary e do representante de comércio, Ron Kirk, que confirma a intenção do governo de manter a taxa.

Valenzuela, por sua vez, teve a aprovação colocada em xeque depois de afirmar, durante a sabatina no Senado, que houve em Honduras foi ¿um golpe militar clássico¿. O senador pela Carolina do Sul Jim DeMint, que considera que os militares hondurenhos ¿defenderam a Constituição ao evitar os abusos¿ do então presidente Manuel Zelaya, questionou as declarações e a posição do Executivo americano sobre o tema. Outra carta do Departamento de Estado, endereçada desta vez ao presidente da minoria republicana no Comitê de Relações Exteriores, Richard Lugar, dissolveu mais esse obstáculo. Agora, os dois nomes devem ser aprovados, por maioria, no plenário do Senado ¿ em data ainda não confirmada.

Férias

A família Obama desembarcou ontem na Ilha de Martha¿s Vineyard, na costa leste norte-americana, onde passarão as primeiras férias desde que o presidente chegou ao poder. Eles ficarão uma semana no balneário frequentado por ricos e famosos depois de sete meses de trabalho. A Casa Branca definiu as férias como um ¿descanso merecido¿, já que Obama enfrenta fortes críticas dentro e fora de seu partido sobre o sistema de saúde e a recessão.