Título: Combate ao submundo das joias
Autor: Verdini, Liana
Fonte: Correio Braziliense, 22/08/2009, Economia, p. 17

Governo cadastrará todos os joalheiros, mesmo os informais que transitam por ministérios, Congresso e tribunais, para evitar a lavagem de dinheiro

Crime organizado e corruptos estão recorrendo cada vez mais à compra de joias, pedras e metais preciosos para legalizar dinheiro

O governo decidiu endurecer o jogo contra o setor de joias, pedras e metais preciosos, que vem sendo usado livremente pelo crime organizado e por envolvidos em corrupção para a lavagem de dinheiro. Até outubro, sairá uma nova regulamentação do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), responsável pelo combate a essa atividade ilícita. Somente no Distrito Federal, esse mercado movimenta cerca de R$ 100 milhões, dos quais R$ 80 milhões no mercado informal. Quando o Grupo de Ação Financeira Internacional (Gafi) chegar ao país em novembro para avaliar as ações de combate à lavagem de dinheiro, todos os que compram e vendem joias e pedras preciosas no Brasil, inclusive os revendedores pessoas físicas que frequentam ministérios, autarquias, tribunais, o Congresso e empresas privadas, deverão estar seguindo as novas exigências sob pena de severas punições.

¿Calculamos que existam hoje cerca de 20 mil empresas trabalhando nesse setor no Brasil, incluindo as pessoas físicas que trabalham revendendo joias para conhecidos¿, diz Antonio Carlos Ferreira de Souza, diretor de Análises e Fiscalizações do Coaf. ¿Mas apenas 292 estão registradas em nosso sistema e, desde a criação do conselho, só recebemos 60 comunicações de atividades suspeitas das empresas ligadas a esste setor. É muito pouco. Queremos trazer todos para dentro do sistema, em um processo parecido com o que ocorreu com o setor bancário há alguns anos.¿

Para isso, o Coaf atuará no sentido de sensibilizar empresas e profissionais desse segmento tão logo a resolução seja publicada. ¿Foi o que fizemos com os bancos, imobiliárias, cartões. Agora, chegou a vez desta área¿, afirma Souza. Ele aposta na formação de uma grande rede para que os episódios suspeitos comecem a ser reportados com mais assiduidade. Em 2007, por exemplo, com base em informações inseridas no sistema, o Conselho abriu processos administrativos contra duas empresas do setor. ¿Estamos fazendo diligências para apurar exatamente o que aconteceu, cumprindo todo o rito¿, explica.

Dinheiro vivo Depois da nova regulamentação, todas as empresas e pessoas que atuam com joias, pedras e metais preciosos deverão entrar no site do Coaf e se cadastrar, em um processo simples e rápido, segundo Souza. ¿Não esperamos resistências, uma vez que as regras foram postas em audiência pública para que todas as entidades da área opinassem¿, frisa. No cadastramento, a empresa precisará indicar um responsável jperante o órgão regulador. ¿Ele responderá pelo cumprimento ou não das normas¿. O diretor assegura que as exigências são simples. A primeira delas é manter o registro de suas operações. ¿O que queremos é que os vendedores tenham as informações sobre os clientes e as operações atualizadas.¿

Outra obrigação é que a empresa ou pessoa física notifique, via sistema, todas as operações de valor igual ou superior a R$ 10 mil feitas em dinheiro vivo. Isto é uma mudança. Antes, o varejo precisava comunicar ao Coaf as operações acima de R$ 5 mil e o atacado deveria informar compras e vendas a partir de R$ 50 mil. Nas regiões de fronteira com outros países, a notificação deve contemplar todas as operações de valor igual ou superior a R$ 10 mil, seja qual for o meio de pagamento. ¿Esse valor poderá ser alterado dependendo do volume de comunicações que recebermos¿, diz Souza.

A nova regulamentação também determina que os empresários reportem todas as operações feitas por pessoas politicamente expostas, conforme circular do Banco Central. Além disso, o Coaf deve receber informação quando o vendedor achar que o comportamento de seu cliente é suspeito ou não está em conformidade com seu histórico. Outra situação a ser informada é quando o cliente comprar pequenos volumes, em intervalos de tempo pequenos, como forma de burlar a regra dos R$ 10 mil.

Até o penhor está na mira

Os lojistas que compram joias de pessoas físicas em pequenos volume terão de informar ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) o volume de dinheiro sacado com esse fim. O órgão também quer saber quem anda arrematando as joias leiloadas pela Caixa Econômica Federal das pessoas que penhoraram e não conseguiram resgatar. ¿A qualquer suspeita de concentração, devemos ser informados¿, diz Antonio Carlos Ferreira de Souza, diretor de Análises e Fiscalizações do Conselho.

¿Não estamos dizendo que, em todos esses casos, as pessoas estão cometendo crime¿, afirma Souza. ¿O papel do Coaf é captar os sinais de alerta para que esse setor não seja utilizado para lavagem de dinheiro.¿ Como forma de proteção, o empresário nunca deve avisar seu cliente que fará uma notificação ao órgão fiscalizador. ¿A questão aqui não é o excesso de comunicado, mas a falta dela. Se uma operação suspeita foi feita e o Coaf não for avisado, aí sim o lojista ou atacadista terá problema.¿

Mesmo que o empresário não execute uma única operação em um determinado período, o Coaf deverá ser avisado. ¿Vamos apurar e descobrir se a empresa está sendo usada para emissão de notas frias, por exemplo¿, avisa.

Crimes financeiros

O Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) foi criado por força de lei, existe desde março de 2008 e possui ligação direta com o Ministério da Fazenda. Suas principais atribuições são prevenir e combater crimes de lavagem de dinheiro e ocultação de bens, direitos e valores. A despeito de ser um órgão fiscalizador, o Coaf não tem poder de coerção, como o têm as forças policiais.