Título: Agora, Dilma exige ficha limpa
Autor: Camarotti, Gerson; Maltchik, Roberto
Fonte: O Globo, 26/07/2011, O País, p. 3

Pagot se demite, e presidente avisa que indicados para Transportes não podem ter problema na Justiça

O diretor-geral do Dnit, Luiz Antonio Pagot, ligado ao Partido da República (PR), formalizou ontem seu pedido de demissão, e a presidente Dilma Rousseff determinou que seja adotado um novo critério de contratação para blindar o Ministério dos Transportes contra interferência política no preenchimento dos cargos: a partir de agora, todas as indicações para cargos de segundo e terceiro escalões têm que ser avaliadas pelos critérios da Lei Ficha Limpa. Ou seja, só assumirá cargo no governo quem não tiver condenação na Justiça. Essa condição será exigida, inclusive, para as substituições nas superintendências do Dnit.

A determinação foi dada pela própria Dilma ao ministro dos Transportes, Paulo Sérgio Passos. A presidente também avisou que não aceitará indicações políticas para a pasta, seguindo a regra já adotada para o preenchimento de cargos em agências reguladoras. A ordem foi dada para respaldar Passos, que vinha sofrendo nos bastidores pressão do PR para manter influência política no ministério.

Segundo um auxiliar direto, todas as nomeações terão que passar antes pela aprovação pessoal da presidente. Na prática, Dilma assumiu o comando dos Transportes e não vai permitir que o PR volte a ter influência em uma pasta considerada estratégica por ela. O ministro já comunicou essa decisão ao comando da legenda.

- O PR vai ser o único partido no governo que não vai ter nada no governo. Se for um tratamento uniforme, não tem problema. Pelo jeito, o partido não será ouvido para o preenchimento de novos cargos - disse o vice-líder do governo, deputado federal Luciano Castro (PR-RR).

Valdemar: status de "persona non grata"

Para neutralizar a pressão do PR, o Planalto já trabalha para enfraquecer e dividir o partido aliado. Dentro dessa estratégia, o primeiro passo foi esvaziar o poder do secretário-geral do partido, deputado Valdemar Costa Neto (PR-SP), no governo. Depois de demitir os indicados de Valdemar nos Transportes, o Planalto tem dito a vários interlocutores do partido que ele não tem mais influência no governo.

Após o escândalo do mensalão, Valdemar havia sido reabilitado politicamente na campanha presidencial de Dilma, em 2010. No início do ano, voltou a circular no Palácio do Planalto, por solicitação do ex-chefe da Casa Civil, Antonio Palocci. Segundo um ministro, Valdemar virou agora "persona non grata" no Planalto.

Ao mesmo tempo, no núcleo do governo, a ordem é fragmentar a interlocução do PR junto ao Congresso. O Planalto deseja novos mediadores dentro do partido, por isso estimula o diálogo com outros líderes, como os senadores Blairo Maggi (PR-MT) e Clésio Andrade (PR-MG). Ontem, a atuação de Blairo para esvaziar a crise nos Transportes foi elogiada no Planalto. Segundo um ministro, ele ganhou créditos com Dilma, ao evitar que Pagot deixasse o governo atirando.

A cúpula do PR está assustada com a pressão política do governo para esvaziar o partido. Até ontem, os principais líderes da legenda não sabiam como reagir. Por isso, o partido deve marcar uma reunião com as bancadas da Câmara e do Senado.

- Estamos dando um tempo. Vamos mergulhar e, na próxima semana, reuniremos o partido. A presidente Dilma tem liberdade para escolher quem ela quiser para os cargos nos Transportes. Esta é uma situação de desconforto. É muito ruim. Mas o partido é maior que essa crise. Não se provou nada contra o PR - disse o líder da bancada na Câmara, deputado Lincoln Portela (PR-MG).

Acéfalo e com um orçamento de R$13 bilhões para este ano, o Dnit depende, agora, de seu Conselho de Administração - formado pelos ministérios dos Transportes, do Planejamento e da Fazenda - para tomar decisões estratégicas, como a assinatura de novos contratos ou aditivos e o lançamento de editais de licitação. A prioridade do ministro é decidir, pelo menos, quem comandará interinamente o órgão, o que pode ocorrer ainda hoje. No momento, restou na linha de frente o diretor de Planejamento e Pesquisa, Jony Marcos Lopes, que tem relação estreita com Passos. O governo tem pressa para, ao recompor parte do comando, concluir a análise de 41 editais suspensos por Dilma, assim que a crise estourou.

Esse grupo de editais teria inflado de maneira abusiva, na avaliação do Planalto, o orçamento das principais obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Estão em jogo R$12 bilhões, que podem ser cortados do orçamento de obras rodoviárias ao longo dos próximos quatro anos, segundo estudo apresentado à presidente por Hideraldo Caron, ex-diretor de Infraestrutura Rodoviária do Dnit.

O Dnit informou que possíveis cortes estão sobre a mesa de Dilma. Dos 41 editais, dois foram revogados, ambos em Santa Catarina. Segundo o Dnit, a crise não parou obras e nem comprometeu o pagamento de fornecedores e prestadores de serviço. À exceção de Lopes, o órgão ainda conta com o diretor de Infraestrutura Ferroviária, Geraldo Lourenço Neto, que acumula interinamente as diretorias de administração e de Infraestrutura Aquaviária.