Título: Ações da Petrobras à sombra do risco cambial
Autor: Bôas, Bruno Villas
Fonte: O Globo, 03/10/2011, Economia, p. 25

Alto endividamento em dólar leva pessimismo a analistas. Estatal já perdeu R$120 bi em valor de mercado este ano

O inferno astral das ações da Petrobras, uma das favoritas dos investidores, continua longe de chegar a um fim. Estrela na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa), a companhia apresenta um tombo de R$120 bilhões em valor de mercado desde o fim de 2010, exatamente o tamanho de sua megacapitalização, que mobilizou investidores em outubro de 2010. Os analistas seguem extremamente pessimistas com a interferência do governo no reajuste do preço da gasolina vendida pela estatal. E agora começam a manifestar preocupação com a exposição da empresa ao câmbio, o que pode ter impacto sobre o resultado contábil da companhia no terceiro trimestre.

Segundo Oswaldo Telles Filho, analista de petróleo da Banif, a Petrobras tinha uma exposição cambial líquida de R$41,1 bilhões em 30 de junho deste ano. Esse valor considera dívidas em moeda estrangeira, ativos no exterior, operações de hedge (contratos no mercado futuro). Uma alta de 15% na moeda americana representaria, segundo ele, uma perda contábil de R$6 bilhões no balanço da Petrobras. Somente em setembro, o dólar comercial teve uma alta de 18,14%, para R$1,882.

- O impacto pode não ser desse tamanho porque os números da exposição cambial são de 30 de junho e a companhia pode ter percebido a alta da moeda e se protegido. Mas alguma perda ela terá. A Petrobras tem uma dívida grande em moeda estrangeira - explica o analista.

Mesmo com o cenário adverso, corretoras seguem com ações da Petrobras nas carteiras recomendadas aos clientes. Em agosto, a estatal aparecia em seis de dez carteiras para o mês levantadas pelo GLOBO. Mas isso teria mais relação com a necessidade de as carteiras acompanharem de perto o Índice Bovespa (Ibovespa), referência das aplicações, do que propriamente uma aposta no papel. Analistas reconhecem, no entanto, que as ações estão muito baratas.

Recuperação só deve vir com produção do pré-sal em 2014

As ações ordinárias (ON, com direito a voto) da companhia eram negociadas a R$20,90 na Bovespa na última sexta-feira, o que representa um tombo de 29,91% no ano. O preço atual está sete centavos abaixo do valor da ação em 21 de novembro de 2008, quando os papéis da estatal chegaram ao fundo do poço na crise financeira internacional. No valor corrigido pela inflação, os papéis fecharam aquele dia negociados a R$20,97.

O mau desempenho das ações na Bovespa tem origem também na crise de confiança dos investidores sobre a Europa. Um calote da dívida da Grécia aumentaria a aversão a risco de investidores. Os cenários traçados de desaceleração do crescimento da economia global também afetam a estatal, já que derrubam o preço do barril de petróleo no mercado.

- O barril de petróleo do tipo leve já caiu 30% desde as máximas em 29 de abril, para a casa dos US$80. Essa é uma commodity muito sensível ao ciclo econômico e pode pressionar as ações da Petrobras - avalia Gustavo Mendonça, da Oren Investimentos.

Segundo analistas, as ações da Petrobras devem continuar à deriva até 2014 e 2015, quando os campos do pré-sal devem entrar em produção. Ricardo Corrêa, analista da Ativa Corretora, aposta em uma pequena recuperação nos próximos meses. Esse avanço seria puxado por melhores resultados na produção da estatal, que recentemente lançou a plataforma P-56.

- As ações perderam o que tinham para perder. O melhor é manter as ações e aguardar para sair com perdas grandes da aplicação - avalia Corrêa.

Osmar Camilo, analista da Socopa, lembra que o recente corte da Cide (Contribuição sobre Intervenção do Domínio Econômico) teve impacto zero sobre a empresa, já que serviu só para compensar o risco de aumento da inflação na gasolina.