Título: Lula rouba a cena na despedida de Haddad
Autor: Lima, Maria
Fonte: O Globo, 25/01/2012, O País, p. 5

Ovacionado por políticos e servidores, ex-presidente é citado 15 vezes por Dilma e faz ministros chorarem

BRASÍLIA. O ex-presidente Lula passou pouco mais de quatro horas em Brasília sem que sua voz fosse ouvida. Mas o simbolismo de sua presença, muda mas sorridente, ao lado da presidente Dilma Rousseff na despedida de Fernando Haddad, marcou o início da campanha informal do précandidato petista à prefeitura de São Paulo — nome escolhido e imposto pelo próprio Lula ao PT. Descontadas as devidas restrições do protocolo presidencial, o ato foi como um comício, com o ex-presidente sendo aplaudido de pé várias vezes. Durante a cerimônia, na qual seu nome foi citado dezenas de vezes — só Dilma repetiu-o 15 vezes —, Lula falou muito ao pé do ouvido com a presidente e, ao final, os dois se reuniram no gabinete presidencial por uma hora e 15 minutos, acompanhados dos ministros Gilberto Carvalho (Secretaria Geral), Helena Chagas (Comunicação) e Gleisi Hoffmann (Casa Civil). Também passaram por lá o ex-secretário-geral da Presidência Luiz Dulci e o governador da Bahia, Jaques Wagner. Foi a primeira vez, desde que passou a faixa presidencial para Dilma, que o ex-presidente retornou ao Planalto para participar de um ato político ao lado de sua sucessora. Seu esforço de retornar ao Planalto, em pleno tratamento contra o câncer, emocionou a todos, levou o novo ministro da Educação, Aloizio Mercadante, às lágrimas e lotou os salões de servidores e políticos. Outros também choraram. Lula foi a Brasília especialmente para homenagear Haddad, mais um ministro seu que deixa a equipe de Dilma. No ano passado, caíram seis ministros considerados herança de Lula. A cena de Lula ao lado de Haddad e Dilma, registrada durante a solenidade de despedida, deverá se repetir muitas vezes até as eleições de outubro. Foi do próprio Lula a ideia de comparecer ao evento. Ele teve o sinal verde dos médicos para a viagem, mas, em alguns momentos, mostrou desconforto, sempre limpando a testa e a cabeça com um lenço branco. Última a discursar, Dilma previu que também choraria, mas ficou só na homenagem. Começou fazendo uma "saudação especial ao nosso presidente Luiz Inácio Lula da Silva". Todos se levantaram e aplaudiram. — Para mim é uma honra que seja neste momento que pela primeira vez o nosso querido presidente Lula volta ao Palácio do Planalto — disse Dilma. Na verdade, Lula já estivera no Planalto após deixar o cargo, no velório do ex-vice-presidente José Alencar, em março do ano passado. A presidente, com fama de durona, reconheceu que, após a emoção de Haddad e Mercadante, também poderia chorar. Ao longo do discurso, Dilma fez várias citações a ações do governo dele e à determinação do próprio. E enfatizou que ele foi o responsável pela estratégia de impor o compromisso de educação pública da creche à universidade: — Incrível que precisou chegar um retirante do Nordeste, sem curso universitário para fazer isso — disse Dilma, que finalizou o discurso, agradecendo "a presença do inesquecível presidente Lula". Dilma se esforçou para deixar Lula à vontade e ser o centro das atenções. De terno e chapéu pretos, Lula desceu a rampa interna do Planalto ao lado de Dilma sob aplausos e gritos de "olê, olê, olá, Lulá, Lulá". Quando ele subiu ao púlpito e tirou o chapéu, todos aplaudiram novamente de pé. O ex-presidente não discursou nem falou com os jornalistas. Chegou por volta das 15h. Dilma foi recepcionálo na garagem do Palácio do Planalto. Ali, uma multidão de ministros, servidores e políticos se juntaram para homenagear o ex-presidente. Os dois passaram cerca de dez minutos abraçando os presentes e tirando fotos com eles. — Estou muito emocionada com a volta do Lula ao Planalto — disse Dilma, durante a festa na garagem. — Para mim foi uma honra iniciar meu trabalho na Educação sob o comando de um metalúrgico — disse Haddad, o primeiro a discursar. Na sua vez de falar, Mercadante disse que a presença de Lula no evento tinha um significado muito especial. Lembrou-se de um bilhete que Lula lhe mandou no dia de uma eleição em que fora derrotado, com um poema. O bilhete, assinado por Lula e Henfil, falava sobre disputas perdidas que deixaram sementes que as fizeram valer a pena. Nesse momento, Mercadante caiu no choro. Lula ouviu emocionado. — O presidente Lula plantou sementes neste país inteiro, sementes de esperança e dignidade, e cidadania e liberdade que estão fazendo este país florescer — discursou Mercadante com a voz embargada.