Título: Tendência positiva
Autor: Bancillon, Deco
Fonte: Correio Braziliense, 09/09/2009, Economia, p. 10

Emprego industrial deve se manter em alta, influenciado pelo consumo interno e por reação da economia. Aumento de 0,4% em julho encerra nove meses seguidos de retração

O ciclo negativo no emprego industrial chegou ao fim. Depois de se manter no vermelho por nove meses ininterruptos, o saldo das contratações no setor produtivo ficou positivo em julho, registrando crescimento de 0,4% ante junho, na comparação livre de influências sazonais (características permanentes de um período). Daqui em diante, preveem especialistas, o indicador deverá se manter em trajetória ascendente em consequência da reação da demanda interna e da melhora das condições econômicas no país.

Mais do que um resultado positivo, o dado divulgado ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) confirma uma tendência de melhora que vinha se esboçando desde dezembro do ano passado, quando o nível do emprego na indústria recuou 1,9% ante mês imediatamente anterior, na série com ajuste. Desde janeiro, o deficit nos saldo vem arrefecendo mês a mês, até chegar à quase estabilidade em junho, com queda de 0,1%. ¿O próximo passo era ficar positivo¿, raciocina o economista-chefe da Sul América Investimento, Newton Rosa.

A despeito de ter se situado no azul, o saldo das contratações no sétimo mês do ano foi o pior para meses de julho desde 2001, início da série histórica do IBGE. No acumulado de 2009, o indicador variou negativamente em 5,4%. E, nos últimos 12 meses terminados em julho, a taxa que mede o emprego na indústria registrou queda 2,7%. Essa inflexão menor, detalham especialistas, deve-se aos dois meses e meio de resultados positivos que entram na conta da taxa anualizada terminada em julho.

Recuperação

Os números referentes ao salário e às horas trabalhadas na indústria se mantiveram inalterados na comparação entre julho e junho, com ligeira alta de 0,1% para o primeiro e 0% para o segundo, respectivamente. ¿De certa maneira, esses indicadores refletem que ainda há muito a crescer no emprego industrial¿, analisa o economista-chefe do Banco Fator, José Francisco Gonçalves. ¿Aos poucos, não só o emprego, mas toda a indústria tende a se recuperar, o que já deve ficar mais visível nos meses de setembro e outubro, quando haverá taxas mais fortes de crescimento¿, acrescenta.

Desde janeiro, a indústria tem dado sinais de descolamento da crise econômica mundial. Foram sete meses ininterruptos de taxas positivas na produção industrial(1), que, no entanto, não reverteram o tombo de 12,43% nos últimos 12 meses terminados em junho.

Desde 2008, houve recuo na produção em praticamente todos os setores pesquisados pelo IBGE. Este ano, contudo, a recuperação se dá também de forma generalizada. No acumulado de 2009 até julho, os indicadores de produção estão positivos nos setores de bens de capital (fabricação de máquinas e equipamentos), em 1,1%; de bens intermediários (peças e embalagens), em 10%; e de bens de consumo não durável (alimentos e bebidas), com alta de 6,3%, na série com ajuste sazonal.

Se houve um segmento que cresceu durante a crise foi a indústria de bens de consumo durável, sobretudo a de automóveis e eletrodomésticos da linha branca (geladeiras, fogões e máquinas de lavar). Beneficiada pelas desonerações tributárias (leia mais na página 11), a produção industrial avançou 63% de dezembro (quando as desonerações foram iniciadas) a julho, influenciada pela produção recorde de automóveis e pela ampliação das vendas no varejo. ¿Esse era um setor que já crescia a taxas acima de dois dígitos em 2008, mas teve de ser socorrido porque estava entrando em queda livre no fim do ano passado¿, comenta o economista Fábio Bentes, da Confederação Nacional do Comércio (CNC).

1 - Tombo A produção industrial deve se manter no vermelho em todo 2009, encerrando o ano com queda de 7,35%. Essa é a avaliação dos especialistas do mercado ouvidos pelo Banco Central na pesquisa semanal Focus. Os especialistas acreditam que o tombo na produção não deverá ser revertido, mesmo que o país tenha deixado a recessão para trás. No intervalo de duas semanas, a previsão para esse indicador piorou 0,42 ponto percentual, indicando pessimismo.

Confecções no fundo do poço

A indústria de confecções recolhe os cacos do que sobrou dos volumosos lucros de décadas passadas, sustentados, sobretudo, pela fragilidade do real frente ao dólar, que se inverteu. Essa é uma situação bem diferente do que vive os demais setores da indústria, que ensaiam uma retomada de médio e longo prazos, sustentada pelo aumento da demanda interna e ampliação da massa salarial.

De janeiro a julho, o emprego no setor de vestuário encolheu 9,07%, uma redução quase duas vezes maior do que a registrada em igual período do ano passado, de 4,98%. Nos últimos sete meses, segundo o IBGE, o emprego na indústria de vestuário ficou menor em todas as comparações ante igual período do ano passado, quando também estava no vermelho.

A produção também foi afetada. Nos sete primeiros meses do ano, a indústria têxtil e a do vestuário registraram queda na produção de 10,5%. Em igual período, as vendas do varejo desses produtos recuaram 6,8%. ¿Isso quer dizer que a queda da produção foi maior que a queda do consumo, o que mostra que parte do varejo foi ocupada pelo produto importado¿, avalia o diretor-superintendente Associação Brasileira da Indústria Têxtil (Abit), Fernando Pimentel.

Os reflexos da entrada de empresas internacionais no mercado interno podem ser vistos na deterioração da balança comercial do setor têxtil e de vestuário. Nos primeiros sete meses de 2009, as exportações caíram 36%, enquanto as importações registraram recuo de 16%. Em termos nominais (sem descontar os efeitos da inflação), o saldo comercial ficou negativo US$ 1,15 bilhão, com vendas de US$ 1,041 bilhão e compras de US$ 2,2 bilhões. ¿Esse é o reflexo da fragilidade da política de comércio exterior nacional, que se pautou durante anos nas exportações de matérias-primas, deixando de lado os produtos de maior valor agregado¿, comenta o economista do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), Rogério César de Souza (DB).