Título: Sai crack entra UPP
Autor: de Araujo, Isabel; Jacob, Pablo
Fonte: O Globo, 19/05/2012, Rio, p. 16

O programa de combate ao crack no Rio, acertado em abril entre a prefeitura, o governo do estado e o Ministério da Justiça, garantirá a implantação da uma Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) no Morro Santo Amaro, no Catete. O anúncio foi feito ontem pela secretária nacional de Segurança Pública, Regina Miki, durante a ocupação da comunidade por 150 agentes da Força Nacional. Segundo ela, a ação, que tem o objetivo de enfrentar o tráfico e oferecer tratamento aos usuários da droga, só terminará com a instalação da UPP. A Secretaria de Segurança do Rio afirmou que, por razões estratégicas, não pode divulgar quando a favela receberá a unidade. A União deverá investir - com repasses e aplicação direta - cerca de R$ 240 milhões até 2014 para o combate ao crack no estado. O Rio já tem 22 UPPs, além da Rocinha que está ocupada pela PM e do Complexo da Penha, pelo Exército.

Antes de o dia clarear, agentes da Força Nacional e policiais civis e militares já estavam ocupando a comunidade ontem, acompanhados por 200 assistentes sociais e garis da Comlurb. Durante a operação, nenhum tiro foi disparado, não houve prisões, e foram recolhidos 101 usuários de drogas, entre eles 12 adolescentes. Após o processo de identificação na polícia, eles foram encaminhados para abrigos da Rede de Proteção Especial do município. Só um dos adultos abordados foi detido porque tinha antecedentes criminais. Ainda durante a ocupação, uma cracolândia foi localizada no alto da comunidade. A polícia também encontrou uma central de "gatonet" (TV a cabo clandestina) com mais de mil assinantes. Ali também ninguém foi preso.

No Santo Amaro, vivem 1.500 famílias (aproximadamente cinco mil pessoas), das quais 473 recebem auxílio em programas dos governos federal (Bolsa Família) e municipal (Família Carioca). O projeto contra o crack vai investir na favela R$ 1,23 milhão. Dois postos montados em contêineres foram instalados no alto do morro e servirão de sede para os policiais. Um terceiro posto ficará num acesso à favela, próximo à 9 DP(Catete), e abrigará 30 assistentes sociais que prestarão atendimento 24 horas por dia. Até segunda-feira, 200 assistentes sociais farão um levantamento da situação desses moradores, para saber quais são as necessidades da comunidade.

- No projeto "Crack, é possível vencer", atuamos com três eixos: prevenção, cuidado e autoridade. Dos quatro estados com os quais firmamos o convênio (Rio, Alagoas, Pernambuco e Rio Grande do Sul), apenas no Rio identificamos a necessidade da presença de força policial, para garantir a segurança dos agentes da Secretaria municipal de Assistência Social que vão acolher os usuários - explicou a secretária.

Secretaria identifica 15 cracolândias

Regina Miki disse que, embora o governo do estado não tivesse programado a instalação de uma UPP no Santo Amaro de imediato, já foi acertado que a Força Nacional ficará na favela até a formação dos PMs que vão trabalhar na unidade.

- O convênio, a princípio, prevê um prazo de 180 dias de ocupação, mas já nos programamos para prorrogar esse prazo quantas vezes forem necessárias - explicou.

Policiais da Força Nacional estavam na cidade desde o dia 14, para planejar a melhor forma de ocupação do Santo Amaro. Com base num levantamento da Secretaria municipal de Assistência Social, que identificou 15 cracolândias no Rio e sete pontos itinerantes de venda de drogas, sendo quatro deles na Zona Sul, eles constataram que Jacarezinho e Manguinhos são áreas críticas, que também precisam ser alvo do projeto.

- Em Manguinhos e no Jacarezinho, estamos trabalhando com os eixos prevenção e cuidado. Estamos analisando ainda se será necessário entrar com força policial nessas comunidades. Caso o governo do estado nos sinalize essa necessidade, estaremos prontos para dar apoio - comprometeu-se a secretária.

Na avaliação da delegada Valéria de Aragão, titular de Delegacia de Combate às Drogas (Dcod), o governo do estado ainda não tem efetivo para ocupar o Jacarezinho.

- Iniciamos o combate ao crack por Santo Amaro por ser uma comunidade sem característica de confronto e também por ter uma topografia que facilita a ocupação. No Jacarezinho, precisaríamos de um efetivo maior, sendo que teríamos ainda de entrar na Mandela e em Manguinhos (favelas vizinhas). Existe a intenção de ocupação dessas duas últimas, mas seguindo um cronograma do estado - antecipou Valéria.

A delegada disse ainda que o Morro Santo Amaro era o maior entreposto de crack da Zona Sul, com traficantes abastecendo também as bocas de fumo da Lapa. Os usuários tinham o hábito de comprar a droga na favela, mas a consumiam preferencialmente no Aterro do Flamengo, onde acontecerão eventos paralelos da Rio+20, em junho.

- O tráfico não permite que o viciado em crack permaneça na comunidade para o consumo. Os usuários são pessoas sem noção e furtam para comprar mais drogas. Com a ocupação do Santo Amaro, vamos ver uma migração dos usuários, e os delitos praticados nas ruas do Catete cairão drasticamente - disse a delegada.

Desde março do ano passado, quando a Secretaria municipal de Assistência Social deu início às operações conjuntas com órgãos de segurança para enfrentar a epidemia do crack, foram realizadas 90 ações nas principais cracolândias. Ao todo, foram 4.028 acolhimentos, sendo 3.428 de adultos e 600 de crianças e adolescentes.

O convênio da prefeitura e do Ministério da Saúde envolve também ações do estado. Serão criados 427 leitos e qualificados outros 71 (totalizando 498) em enfermarias destinadas a pacientes dependentes de álcool e drogas. Esses leitos serão para internações de curta duração.

No programa estão previstas ações de segurança, com operações nas divisas do estado e em cracolândias, onde serão instaladas câmeras. Segundo o Ministério da Justiça, a ideia é identificar e prender quadrilhas de traficantes. O Rio receberá cem câmeras, cinco bases móveis de videomonitoramento, 15 veículos e 200 profissionais de segurança. O total de investimento federal nesse sistema será de cerca de R$ 9 milhões.