Título: Aterro de Gramacho, enfim, fechas as portas
Autor: de Lima, Ludmilla
Fonte: O Globo, 04/06/2012, Rio, p. 14

O Aterro de Gramacho, em Duque de Caxias, encerrou suas atividades ontem, após 34 anos recebendo o lixo do Rio e de municípios da Baixada. O fechamento do lixão, o maior da América Latina, foi feito pelo prefeito Eduardo Paes e pela ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, que, a bordo de um trator e ao lado de catadores, aterraram os últimos resíduos jogados por um caminhão da Comlurb. Dentro do aterro, o clima era de festa. Mas, do lado de fora, catadores se diziam preocupados com o futuro e reclamavam da falta de oportunidades para continuar vivendo de reciclagem.

Durante o evento, Paes disse que a prefeitura fez sua parte indenizando os últimos catadores de Gramacho, com cerca de R$ 14 mil para cada um. O dinheiro foi depositado, na sexta-feira, para 1.603 pessoas. Segundo ele, que classifica o aterro como um crime ambiental praticado pela prefeitura, cabe agora à prefeitura de Caxias criar mecanismos de inclusão dos catadores.

- A prefeitura do Rio quer manter um acompanhamento e a gente espera que a prefeitura de Caxias, agora, cumpra sua parte e cuide dos seus cidadãos - disse Paes.

Serão oferecidos cursos

aos ex-catadores

O secretário municipal de Meio Ambiente de Caxias, Samuel Maia, afirmou que a prefeitura já cadastrou os catadores em programas sociais, como o Bolsa Família, e de qualificação. Agora, se prepara para iniciar as obras de infraestrutura do bairro. As intervenções serão feitas com 18% dos créditos de carbono vendidos no mercado internacional. Nos cálculos do secretário estadual do Ambiente, Carlos Minc, o percentual renderá R$ 12 milhões por ano.

Segundo Minc, será criado ainda um polo de reciclagem para 500 catadores no segundo semestre. Trabalhadores de Gramacho contaram, porém, que apenas foram informados sobre a oferta de cursos na área da construção civil, cujas inscrições começam hoje. Coordenadas pela Faetec, as aulas vão capacitar 1.300 pessoas, como eletricistas, encanadores, pedreiros e carpinteiros, e também na área de informática.

Às vésperas da Rio+20, conferência da ONU sobre desenvolvimento sustentável, muitos revelam que gostariam de continuar trabalhando com a separação de lixo.

- Queria trabalhar numa cooperativa de reciclagem ou em coleta seletiva. Eu tinha em mente usar esse dinheiro para criar um ferro-velho e continuar nesse ramo. Mas só uma prensa custa R$ 10 mil. Somos o eixo dessa discussão sobre tratamento de lixo, mas não sabemos agora como aproveitar nosso conhecimento - lamentava o ex-catador de PET José dos Santos de Paula, de 50 anos, nove deles no lixão.

Ele tenta se juntar a outros catadores e criar uma cooperativa de reciclagem. Só não tem ideia de como montar a empresa. A ex-catadora Patrícia Souza da Silva diz que as mulheres sofrem mais com a falta de perspectiva. Ela vive em Gramacho há 12 anos, como marido e dois filhos.

- Eu, com 40 anos, vou virar pedreira? Tinha que ter cursos para mulher, como de cabeleireira - sugere Patrícia, que chegava a receber R$ 2 mil por mês com a venda de PET.

Ela e outros catadores foram levados ao local do evento em caçambas de uma caminhonete e de um caminhão, enquanto vans e um micro-ônibus transportavam jornalistas e integrantes de governos. Alguns catadores gravaram para peças publicitárias do governo do estado e da prefeitura. Roberta Alves, líder dos catadores enterrou a touca e as roupas que usava para recolher o lixo. Geraldo da Silva, de 50 anos, se emocionou:

- Vou comprar meu carrinho de pipoca para vender Toddy, chá e Doril - disse, emocionado, depois de participar com o prefeito do aterro dos últimos resíduos.

A cerimônia incluiu a inauguração de uma placa sobre o fechamento do aterro, com a participação de Tião Santos, protagonista do filme "Lixo extraordinário", indicado ao Oscar de melhor documentário, e um dos ganhadores do Prêmio Faz Diferença, do GLOBO. A ministra do Meio Ambiente disse que, na Rio-92, o lixão era uma das "manchas" da cidade:

- Na Rio-92, havia duas grandes manchas na questão de resíduos: Gramacho e Ingá, famosa pelo despejo de resíduos químicos, uma ameaça à Baía de Sepetiba - disse ela.

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