Título: Drogas: hora de inovar
Autor: Eluf , Luiza Nagib
Fonte: O Globo, 10/06/2012, Opinião, p. 7

N inguém discute que as drogas, lícitas ou ilícitas, fazem mal à saúde. É por esse exato motivo que as autoridades se preocupam com elas. No entanto, se tanta gente as procura, algum benefício devem trazer, ainda que ilusório e passageiro, ao acalmar mentes agitadas ou dar alegria imediata e fugaz aos deprimidos. Por essa razão, é difícil demover usuários e dependentes da determinação de continuar com hábitos perniciosos.

No Brasil, o uso de entorpecentes se encontra proibido, mas nem sempre foi assim. As drogas hoje listadas como ilícitas - cocaína e maconha entre as mais usadas - já foram permitidas tempos atrás, quando não se conheciam seus efeitos danosos.

Atualmente, o crack (cocaína em forma de pedra) vem corroendo parcelas significativas da população, provocando uma tragédia social sem precedentes, O drama de legislar sobre essa matéria é chegar a uma solução que cause menos prejuízos em vez de aumentá-los.

A Comissão de Reforma do Código Penal, criada pelo Senado acaba de decidir pela descriminalização do porte de droga para uso próprio, com o único fim de tirar os consumidores da situação de clandestinidade e possibilitar o tratamento sem o estigma da marginalidade.

A grande questão são os dependentes químicos. O usuário eventual não é uma preocupação prioritária, embora todos tenham que ser alertados, sempre, sobre os riscos do consumo frequente. Nos termos da Lei em vigor, aquele que for dado como portador de droga ilícita para uso próprio estará sujeito às penas de advertência, prestação de serviços e medida educativa, o que, em tese, seria uma boa solução.

No entanto, na prática, essas medidas se mostraram ineficazes. Além disso, os usuários de drogas ficam sujeitos a uma condenação que irá implicar na perda da primariedade.

A ideia da Comissão de Reforma Penal foi concentrar os esforços repressivos no tráfico. Comercializar as drogas continua sendo crime punido com rigor. Já o consumidor deverá merecer atenção da área de saúde, garantindo-se-lhe a oportunidade de tratamento e recuperação. Se a proposta da Comissão for aprovada pelo Congresso, só será crime usar droga se tal ato for praticado ostensivamente em local público, nas imediações de escola ou outros locais de concentração de crianças e adolescentes.

Se tudo o que fizemos até agora falhou, é preciso tentar uma inovação.

LUIZA NAGIB ELUF é procuradora de Justiça do Ministério Público de São Paulo e integrante da Comissão de Reforma do Código Penal.