Título: Governo paulista adota internação compulsória de usuários de crack
Autor: Amorim, Sílvia
Fonte: O Globo, 04/01/2013, País, p. 7

Medida deve entrar em vigor nos próximos dias; no Rio, ação gerou polêmica

Tudo como antes. Apesar da Operação Centro Legal, continuam intensos consumo e comércio de crack à luz do dia

SÃO PAULO O governo de São Paulo decidiu internar compulsoriamente os dependentes químicos para tentar dar um fim à cracolândia, no Centro da capital. A medida foi anunciada ontem pelo governador Geraldo Alckmin (PSDB) e faz parte de uma ação integrada do governo com o Ministério Público, o Tribunal de Justiça e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

Para viabilizar as internações involuntárias de adultos, uma Comissão Antidrogas formada por promotores, juízes e advogados foi constituída, e um plantão será criado no Centro de Referência de Álcool, Tabaco e Outras Drogas (Cratod) para atender a casos emergenciais.

Após receber o primeiro atendimento, o dependente químico será avaliado por médicos que vão oferecer o tratamento adequado. Caso o usuário não queira ser internado, o juiz poderá determinar a internação imediata, desde que os médicos atestem que a pessoa não tem domínio sobre suas saúde e condição física. A medida deverá ser implantada nos próximos dias, após um evento para oficializá-la.

No ano passado, a prefeitura do Rio chegou a anunciar a intenção de internar compulsoriamente adultos usuários de drogas nas ruas, mas o plano gerou polêmica. A ideia foi divulgada pelo prefeito Eduardo Paes durante uma visita, em outubro passado, à Favela do Jacarezinho, na Zona Norte do Rio. Hoje o procedimento é adotado com crianças e adolescentes. Representantes de entidades de direitos humanos e dos conselhos regionais de enfermagem, assistência social e psicologia criticaram a medida, classificada como "inconstitucional e de faxina da cidade". No outro extremo, estava o secretário municipal de Assistência Social na ocasião, Rodrigo Bethlem, que tachou de demagogos os críticos da medida. O assunto continua em discussão no governo.

Em 2012, a Justiça determinou a primeira internação compulsória de um adulto usuário de crack no Rio, após a decisão de obrigar os menores viciados a participar de tratamento. A decisão foi da juíza Ivone Caetano, da Vara da Infância, da Juventude e do Idoso da Capital, que determinou a internação de uma mulher de 22 anos, grávida de oito meses, recolhida pela Secretaria de Assistência Social durante uma operação para recolher usuários de crack no Jacarezinho.

após um ano, cenário ainda é degradante

A Operação Centro Legal, uma parceria entre a prefeitura de São Paulo e o governo paulista para tentar conter o tráfico e o consumo de drogas nas ruas do Centro, completou um ano ontem. Balanço divulgado pela Secretaria de Justiça do Estado aponta que 1.363 dependentes já foram internados voluntariamente. Também foram presas 762 pessoas.

Apesar da operação, o cenário na cracolândia de São Paulo continua sendo de destruição. Em ruas como Cleveland, Glete e Helvétia, que ficam ao lado de cartões-postais da cidade, como a Sala São Paulo, adolescentes e adultos vendem e consomem crack nas calçadas à luz do dia.

O governador reconheceu que a situação ainda está longe da ideal, mas apontou avanços.

- Temos consciência do problema, que já melhorou muito. Estamos reduzindo o número (de dependentes nas ruas) e vamos continuar, de um lado com as equipes de abordagem e de outro a internação, agora com juiz, promotor e advogados para os casos mais graves - afirmou Alckmin.

Logo no início, a operação policial na cracolândia foi criticada por especialistas em saúde pública e direitos humanos, que a classificaram como truculenta e mal planejada. PMs chegaram a usar bombas de efeito moral e balas de borracha para intimidar o comércio de drogas na região. Agora, a orientação é voltada para abordagem, com apoio de uma ONG, para viabilizar a internação voluntária. Segundo o governo, cerca de 300 pessoas aceitaram até agora o encaminhamento.