Título: Inflação alta na mira do BC
Autor: Spitz, Clarice; Haidar, Daniel
Fonte: O Globo, 08/02/2013, Economia, p. 21

A inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de 0,86% em janeiro, a maior para o mês desde 2003, e as declarações do presidente do Banco Central (BC), Alexandre Tombini, à colunista Míriam Leitão, de que a situação "não é confortável" e preocupa, fizeram boa parte do mercado mudar suas projeções e apostar em uma elevação dos juros já este ano. Para controlar os preços - o índice oficial já acumula alta de 6,15% nos últimos 12 meses, aproximando-se do teto da meta do governo, de 6,5% - o BC subiria a taxa básica de juros Selic, hoje em 7,25% ao ano, o seu piso histórico, para 7,5%.

Essa alta de pelo menos 0,25 ponto percentual aparece na maioria das apostas dos investidores que negociaram contratos DI com vencimento em janeiro de 2014, segundo o economista-chefe da Humaitá Investimentos, Guido Chagas. Fecharam ontem negociados na média em 7,44%, ante 7,35% no pregão anterior. Ele avalia que a entrevista de Tombini foi o estopim para uma disparada nas apostas que preveem um aumento na Taxa Selic ainda em 2013:

- O mercado calcula uma alta de juros até o fim de 2013, de pelo menos 0,25 ponto percentual. É necessária, mas não sei se o BC é independente para tomar essa decisão.

André Perfeito, economista-chefe da Gradual Investimentos, também vê os mesmos sinais no mercado de juros futuros. Para ele, está indicada uma alta de 0,25 ponto percentual da Selic na reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) de novembro deste ano. É a percepção de que o BC terá de voltar a subir a Selic para conter o crescimento e tentar segurar os preços.

Já Luiz Eduardo Portella, sócio gestor da Modal Asset, é mais pessimista. Ele diz que o fechamento dos contratos de ontem apontam uma Selic a 8,75% em janeiro de 2014.

- O mercado chegou a calcular quase dois pontos percentuais de alta da Selic ao longo de 2013 até janeiro de 2014. Mas, no fechamento, as taxas recuaram e calculam uma alta de 1,5 ponto, indo para 8,75% ao ano - diz Portella.

A disparada das apostas em juros maiores levou a um recorde histórico de 13.324 operações com contrato futuro de taxa média de depósitos interfinanceiros de um dia (DI1), segundo a Bolsa de Mercadorias & Futuros (BM&F). Isso envolveu a negociação de 2.687.725 contratos.

A preocupação com a inflação também motivou a queda de 0,80% do dólar comercial sobre o real, a R$ 1,972 na venda, o menor nível desde 11 de maio do ano passado. O mercado voltou a avaliar que o BC pode deixar a moeda americana desvalorizar para ajudar no combate à inflação, ao fortalecer o real e baratear importações.

IBGE: "Inflação mais espalhada em janeiro"

Segundo informou ontem o IBGE, o IPCA de janeiro, de 0,86%, foi o maior para todos os meses desde abril de 2005 (0,87%). A inflação oficial do país no mês passado ficou bem acima da vista em janeiro de 2012, de 0,56%, e um pouco maior do que previam analistas ouvidos pela Bloomberg (0,84%). Os preços de alimentos, itens de despesas pessoais e eletrodomésticos avançaram, mas a queda na tarifa de energia elétrica ajudou a conter a inflação.

Os alimentos aceleraram com força, passando de 1,03%, em dezembro, para 1,99%, em janeiro. Sozinhos, tiveram impacto de 0,48 ponto percentual no índice. Cigarros, que tiveram aumento do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), subiram 10,11% e representaram o maior impacto individual: 0,09 ponto do IPCA.

- A inflação foi mais espalhada em janeiro. No caso de alimentos, a alta foi generalizada devido a problemas climáticos que afetaram lavouras e à continuidade de uma alta que vinha de dezembro. Além disso, a classe C consumindo mais propicia que os reajustes sejam repassados inclusive na refeição fora, no lanche - diz Eulina Nunes dos Santos, gerente da pesquisa do IBGE.

O IPCA só não veio maior por causa da deflação em grupos como vestuário, devido a liquidações, e do impacto da queda das tarifas elétricas. Segundo o IBGE, as contas de luz ficaram 3,91% mais baratas, em razão da redução de 18% no valor das tarifas, anunciada pela presidente Dilma Rousseff e em vigor a partir de 24 de janeiro. Foi o maior impacto negativo para o IPCA: de 0,13 ponto percentual.

- Em habitação, o mais importante foi a energia elétrica, que tem um peso grande nos orçamentos das famílias. Foi decisivo para conter o índice no mês - afirma Eulina.

Sem acordo com prefeitos, alta seria de 1%

A inflação abocanhou quase três quartos dos produtos, calcula a economista-chefe da Rosenberg & Associados, Thaís Marzola Zara. Ela estima que caso os reajustes de ônibus urbanos no Rio e em São Paulo não houvessem sido postergados, a pedido do governo, o IPCA em janeiro ultrapassaria a casa de 1%.

- (O reajuste) foi postergado, mas em algum momento vamos sentir isso. Pelas nossas contas, pode ser que, quando acontecer, leve a taxa em 12 meses a encostar na meta - afirma.

O economista-chefe do banco ABC Brasil, Luis Otavio de Souza Leal, vê o primeiro semestre deste ano com uma inflação pressionada:

- É muito provável que cheguemos ou até ultrapassemos o teto da meta em junho. No segundo semestre, projetamos que a taxa em 12 meses vá cair mês a mês até o fim do ano.

Os serviços desaceleraram de 0,98%, em dezembro, para 0,92%, em janeiro, mas subindo acima da inflação. Já a recomposição do IPI para automóveis fez com que o carro novo ficasse 1,41% mais caro. Foi o terceiro item de maior impacto individual no mês. Os artigos de residência avançaram 1,15%, bem acima dos 0,27% em dezembro. Segundo a gerente do IBGE, a expectativa do fim da redução do IPI sobre eletrodomésticos e móveis fez os preços acelerarem em janeiro. Os eletrodomésticos subiram 1,59%; TV e som, 1,33%; e mobiliário, 0,96%.

O segundo semestre trará um cenário mais benigno para inflação, estima Elson Teles, economista do Itaú Unibanco:

- Há perspectiva de safras mais favoráveis.

O economista Eduardo Velho, da Prosper, prevê que em fevereiro o IPCA terá desaceleração forte, refletindo a tarifa elétrica. As pressões inflacionárias virão do reajuste da gasolina.