Título: Acampados até terça-feira
Autor: Veleda, Raphael; Borges, Rodolfo
Fonte: Correio Braziliense, 04/12/2009, Cidades, p. 26

Estava tudo combinado: os manifestantes que ocupam o plenário da Câmara Legislativa sairiam do local para os distritais iniciarem a sessão. Como os deputados não apareceram, a sala foi retomada e assim deve ficar por mais cinco dias

As palavras de ordem do protesto no gramado em frente à Câmara Legislativa foram formadas por centenas de velas: houve até cortejo fúnebre

Daniel Ferreira/CB/D.A Press No meio da tarde, o plenário ficou praticamente vazio: falta de quorum

Daniel Ferreira/CB/D.A Press Os ocupantes voltaram ao local de votações: em busca de adesões

Bruno Peres/CB/D.A Press À noite, os manifestantes deram início a uma vigília

Tarde de desocupação e reocupação. Os manifestantes que tomaram as dependências da Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF) ensaiaram um acordo com os distritais ontem e chegaram a sair do plenário para a abertura da sessão legislativa. A maioria dos deputados, porém, não compareceu e não houve atividades. Vazio, o espaço de votações foi novamente invadido por dezenas de participantes do movimento que pede o impeachment do governador, do vice, Paulo Octávio, e o afastamento dos parlamentares envolvidos no suposto esquema de pagamento de propina para a base aliada do GDF. Os participantes do protesto devem ficar na Câmara até pelo menos a próxima terça-feira, quando ¿ se os distritais aparecerem ¿ nova sessão deve ocorrer. Uma vigília e um cortejo com centenas de velas marcaram o tom na segunda noite de protestos.

A quinta-feira começou preguiçosa na ocupação, que é formada por estudantes, a maioria da Universidade de Brasília, membros de movimentos sociais e partidos de esquerda. Os primeiros a acordar ligaram um rádio e tocaram músicas da Legião Urbana. A maioria, porém, só se levantou às 8h20, para a primeira assembleia do dia. Nela, os jovens procuraram avaliar o sucesso do movimento, iniciado na tarde de quarta-feira. ¿Ocupa, ocupa, ocupa e resiste¿, gritavam em coro.

Meio-termo Houve tensão durante a manhã com o boato de que a Mesa-Diretora da Câmara estaria se movimentando para pedir na Justiça a reintegração de posse do plenário. Em reunião com o presidente interino da Casa, Cabo Patrício (PT), no meio do dia, uma comissão do movimento ouviu que o pedido já estava pronto, mas ainda não havia sido entregue ao Tribunal de Justiça do DF e Territórios (TJDFT). Patrício pediu aos manifestantes que desocupassem definitivamente o espaço de votações, mas, diante da negativa, propôs um meio-termo. ¿Ele pediu que saíssemos para que ocorresse a sessão e garantiu que não nos seria negada a volta logo após o fim. E, como a próxima sessão está prevista só para a terça-feira, teríamos quatro dias para consolidar e fortalecer o movimento¿, explicou Luisa Oliveira, 20 anos, estudante de ciências sociais da UnB, que participou do encontro.

Limpeza da área Em nova assembleia, a proposta foi aprovada rapidamente. Ao sair, os manifestantes limparam o plenário e tiraram do recinto pertences, lanches, cartazes e um caixão. Por sinal, a urna ¿ que pertencente do Diretório Central dos Estudantes da UnB ¿ é a mesma usada para forçar as portas da reitoria da UnB, na ocupação do ano passado que resultou na saída do então reitor, Timothy Mulholand.

A ausência dos deputados em plenário deixou a manifestação ainda mais coesa e decidida. ¿Tínhamos um acordo para instaurar uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) com 22 assinaturas. Hoje, infelizmente, todo mundo sumiu¿, observou o deputado Paulo Tadeu (PT). Só compareceram ao plenário os quatro representantes do PT e Antônio Reguffe (PDT). Milton Barbosa (PSDB), irmão do pivô da crise política, Durval Barbosa, também esteve na Câmara, mas não foi ao plenário. ¿Ontem (quarta-feira), houve um almoço na residência do governador com boa parte da base aliada. É claro que isso teve a ver com o que aconteceu hoje¿, complementou Tadeu. Segundo Cabo Patrício, os distritais da situação afirmaram não haver segurança para a realização de sessões.

Na terça-feira, haverá nova tentativa de aprovar a criação da CPI. Até lá, porém, os manifestantes prometem continuar o movimento na Câmara e atrair mais público para o protesto. O presidente em exercício afirmou que não tem sentido pedir a reintegração de posse antes dessa provável sessão.

Na noite de ontem, por volta das 20h30, os ocupantes fizeram uma vigília na área externa à CLDF. Acenderam centenas de velas ¿ formando a inscrição Fora, Arruda e PO ¿, fizeram um cortejo fúnebre com o caixão e se revezaram ao microfone, tratando não apenas do suposto esquema de corrupção. Houve falas sobre Setor Noroeste, Plano Diretor de Ordenamento Territorial (Pdot), passe livre e até mudanças climáticas.

Madrugada com pouco sono

Luiz Calcagno

Leonardo Carvalho/Esp. CB/D.A Press Noite de quarta para quinta no plenário da CLDF: descanso só após as 3h

Sanduíche de catchup com batata-frita, refrigerante, mortadela e iogurte. Os manifestantes que passaram a primeira noite no plenário da Câmara Legislativa não se preocuparam muito com o cardápio ¿ afinal, estavam mais interessados em como batizar o movimento. Por volta das 23h de quarta-feira, depois de uma hora e meia reunidos em assembleia, decidiram pelo nome Fora, Arruda e toda a sua máfia. A madrugada ainda seria de intensos debates políticos e de reuniões, sobrando pouco tempo para descansar. Sacos de dormir e travesseiros sobre as cadeiras e o chão ¿ ou o próprio chapéu para apoiar a cabeça ¿ só foram usados pela maior parte do grupo a partir das 3h de ontem.

Após a decisão pelo nome, os participantes do protesto pararam para lanchar e retomaram as discussões pouco depois da meia-noite. Deliberaram sobre questões logísticas, como limpeza e alimentação, e sobre como atrair mais gente, distribuindo, por exemplo, panfletos pelos locais de maior movimento da cidade. Propuseram até a realização de saraus.

À 1h, a assembleia continuava. Paralelamente, manifestantes confeccionavam novos cartazes. Somente à 1h30, começaram a discutir o fim da reunião. A sala já estava mais vazia. O plenário se transformava em alojamento. Os que se mantinham nos debates marcaram para as 8h da manhã seguinte (ontem) nova assembleia.

Ao fim do encontro, por volta das 3h, enquanto boa parte do grupo procurou um canto para dormir, algumas comissões se reuniram. Uma delas ficou responsável por redigir uma nota pública, que só ficou pronta por volta das 6h. Nela, os ocupantes apelam à população para aderir aos protestos.

Quem paga? Foi preciso mais de uma hora de discussão na noite de quarta-feira para que os ocupantes do plenário da Câmara Legislativa decidissem se deveriam pagar pelos danos à estrutura física da casa. Uma das portas de vidro da entrada foi quebrado no início do movimento. O vidro que separa a galeria do plenário foi pichado, corredores estão com marcas nas paredes e as bancadas de diversas salas estão sujas. Os manifestantes optaram por não se autoincriminar nem se responsabilizar pelas avarias. ¿Isso aqui já está pago com os nossos impostos¿, gritou uma manifestante, no fundo do plenário.

Conflito na porta da residência oficial

Daniel Brito

Ronaldo de Oliveira/CB/D.A Press Integrantes da CUT e do Simpro-DF entraram em confronto com a PM

O primeiro confronto físico entre manifestantes e policiais militares nas ruas do DF desde a divulgação das denúncias feitas por Durval Barbosa à Polícia Federal ocorreu ontem, em frente ao portão principal da residência oficial do governador, em Águas Claras. Foi por volta de 16h30 e envolveu integrantes da Central Única dos Trabalhadores (CUT) e do Sindicato dos Professores (Sinpro-DF). Houve troca de socos e pontapés, muito empurra-empurra, mas não ninguém ficou ferido nem foi preso.

O motivo da confusão não foram os panetones ou os gritos acusadores da multidão, mas o trânsito na Estrada Parque Taguatinga (EPTG). Após protesto em frente ao Centro Administrativo do GDF, Buritinga, os manifestantes desceram pela EPTG em direção à residência do governador e interromperam o tráfego. Havia uma acordo para que o ato durasse até as 17h30 e não interrompesse o fluxo de veículos. Para tanto, CUT e Sinpro podiam apenas ocupar o canteiro central para protestar.

¿Quando atravessávamos a rua, a PM interpretou que estávamos bloqueando o trânsito e se utilizou da força física¿, disse Rejane Pitanga, presidente da CUT. A versão da polícia é diferente. ¿Eles (manifestantes) provocaram um grande congestionamento com o trio elétrico invadindo a EPTG e não respeitaram o cordão de isolamento da PM¿, replicou o coronel Alberto, da 5ª Sessão da PM.