Título: Enem em dobro
Autor: Couto, Rodrigo
Fonte: Correio Braziliense, 06/12/2009, Brasil, p. 10

MEC pretende realizar dois exames no próximo ano. Ontem foi o primeiro dia de provas da edição 2009

Nathalia ficou desolada ao chegar atrasada ao Uniceub: ¿Fecharam o portão um minuto antes do previsto¿

Grande aposta pessoal e vitrine política do ministro da Educação, Fernando Haddad, o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) tem boas chances de ser aplicado duas vezes em 2010. No que depender de Haddad, que almeja concorrer a uma vaga na Câmara dos Deputados pelo estado de São Paulo pelo PT no próximo ano, as provas serão aplicadas entre março/abril e outubro/novembro. No entanto, a ideia será sepultada caso os órgãos de controle ¿ Controladoria-Geral da União (CGU) e Tribunal de Contas da União (TCU) ¿ insistam na realização de uma licitação. O Ministério da Educação vai trabalhar por duas edições da avaliação no ano eleitoral. Por meio de sua assessoria, Haddad argumenta que, por questão de segurança e logística, nenhum país faz concorrência para um vestibular.

Com medo de novas fraudes no Enem, como a que ocorreu em outubro, quando houve vazamento da prova, Haddad diz que uma avaliação com mais de 4 milhões de inscritos deve ser conduzida por fundações experientes. O consórcio Connasel, responsável pelas provas que vazaram e que venceu uma licitação, nunca havia realizado um grande processo de seleção, ao contrário do Centro de Seleção e de Promoção de Eventos (Cespe) e da Fundação Cesgranrio, encarregados dos testes aplicados ontem e hoje. A sociedade formada pelo Cespe e pela Cesgranrio foi dispensada de concorrência. E é dessa forma que a pasta quer que seja no próximo ano: selecionar as maiores e mais experientes entidades em vestibulares e concursos.

Apesar de dobrar as chances dos estudantes ingressarem em cursos superiores, a realização de duas edições do Enem também terá custo duplicado. Considerando o mesmo número de inscritos deste ano (4.147.527), que resultaram em gastos totais de cerca de R$ 145 milhões, incluindo impressão, transporte e segurança das provas, além do pagamento de 300 mil pessoas envolvidos no processo, o valor a ser desembolsado pelos cofres públicos em 2010 seria de pelo menos R$ 290 milhões.

Portões fechados

Mesmo sabendo do rigor do horário de fechamento dos portões, previsto para as 13h, no horário de Brasília, alguns estudantes chegaram atrasados e não conseguiram realizar as provas de ontem. No Centro Universitário de Brasília (Uniceub), que concentrou parte dos 62.886 inscritos no Distrito Federal, a aluna Nathalia Viotti, 17 anos, ficou desolada por não poder participar da avaliação. ¿Eles fecharam o portão um minuto antes do previsto. É um absurdo.¿ Quase chorando, a aluna foi embora na companha da mãe, Isabela. ¿Ela está bastante triste, chateada e não consegue nem falar¿, afirmou Isabela.

Assim como a adolescente, outras pessoas não prestaram o exame em virtude do atraso. ¿Uma emissora divulgou que os portões fechariam às 14h¿, lamenta Pedro Emanuel de Almeida, 19 anos. Morador da Vila Planalto, o rapaz diz que ficou mais de duas horas na parada de ônibus. ¿Só consegui pegar uma condução às 12h40¿, reclama.

Além dos retardatários, alguns adventistas do Sétimo Dia também deixaram de fazer o Enem por conta de uma falha na organização. Os seguidores da religião, que permite atividades aos sábados somente depois do pôr do sol, não receberam o número da sala especial para iniciar as provas às 19h. Uma das prejudicadas foi Suellen de Macedo, 21. A jovem, moradora do Lago Norte, reclama dos prejuízos causados pela não realização do exame. ¿No meu cartão, não veio especificado o número da sala. Tentei conversar com o coordenador, mas fui informada de que a única opção seria realizar as provas numa sala comum. Isso é um absurdo e um desrespeito à minha religião¿, protesta.

Atrasos e confusões Cerca de 4 milhões de estudantes do país se inscreveram no Enem

Realizado em 1.829 municípios de todo o país, o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) registrou confusão em São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Manaus. Na capital amazonense, 400 estudantes inscritos na avaliação reivindicaram o cancelamento das provas por conta da confusão causada com os horários de Manaus e Brasília. Sem horário de verão, a cidade tem duas horas a menos em relação à hora da capital federal. Por esse motivo, centenas de alunos alegam ter perdido os testes.

Em São Paulo, estudantes que realizaram o exame em uma faculdade no bairro de Santo Amaro, Zona Sul da capital, disseram que o local indicado no questionário socioeconômico estava errado. Até acharem o endereço correto, muitos alunos chegaram atrasados e perderam a prova. Na Zona Oeste, depois de um princípio de tumulto, pelo menos 60 pessoas conseguiram entrar no Câmpus Memorial da Uninove 15 minutos depois do fechamento dos portões.

No Rio, muitos alunos reclamaram do fechamento dos portões antes do horário previsto (13h). Houve confusão em Campo Grande, Bangu, Madureira, Rio Comprido, e na região metropolitana de Niterói.

Em Belo Horizonte, aproximadamente 50 estudantes, barrados por terem chegado após às 13h ao local das provas, arrombaram uma das entradas do Centro Universitário Newton Paiva, no bairro Grajaú.

Prova cansativa

Apesar de alguns estudantes terem reclamado do Enem, classificando a prova, de 30 páginas, como cansativa e caracterizada por extensos enunciados (veja povo fala), uma equipe de 70 professores do Grupo Alub disse que o exame foi bem elaborado e manteve o padrão dos melhores vestibulares. ¿Foi uma prova extensa. No entanto, estava muito bonita. Bem acima do padrão das edições anteriores e dos testes que vazaram em outubro¿, destaca o diretor-geral do Alub, Alexandre Crispi. ¿A única crítica que faço é em relação à quantidade de questões. Não podem dar uma prova com tamanha beleza para ser feita em menos de cinco horas. O ideal seriam 70 questões e não 90 por dia¿, sugere.

Os gabaritos oficiais serão divulgados às 20h de hoje pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), órgão ligado ao Ministério da Educação (MEC). O resultado final sai em 5 de fevereiro. (RC)