Título: Vale surpreende e consegue aumento de 71,5% no Japão
Autor: Ivo Ribeiro e Francisco Góes
Fonte: Valor Econômico, 23/02/2005, Empresas &, p. B1

A Vale do Rio Doce surpreendeu ontem o mercado siderúrgico mundial ao anunciar acordo de aumento de 71,5% para o preço do minério de ferro tipo fino com a japonesa Nippon Steel e outras fabricantes locais. Os novos preços vão entrar em vigor a partir de 1º de abril e vão servir como referência para todos os contratos entre mineradores de ferro e produtores de aço, inclusive no Brasil. Trata-se do maior reajuste da história na indústria de extração de ferro. A reação positiva para a mineradora brasileira, que havia comunicado desde janeiro intenção de alta de 90%, foi imediata. Suas ações chegaram a subir 8,23% na Bovespa. Os papéis ON fecharam o dia cotados a R$ 86,60, com alta de 3,17%. Já a ação PNA encerrou o pregão com aumento de R$ 4,37%, negociada a R$ 72,80. O papel da Caemi, controlada da Vale que também produz minério de ferro, fechou o dia a R$ 2,62, com alta de 4,8%, depois de alcançar 6,8%. A Bradespar, terceira maior acionista da Vale, depois do fundo de pensão Previ e da trading japonesa Mitsui, foi a vedete da bolsa. Encerrou o pregão com a maior alta do Ibovespa - 6,91%, a R$ 96,51. Com o aumento obtido pela Vale, as exportações brasileiras de minério de ferro devem alcançar US$ 8,17 bilhões em 2005 - um recorde histórico -, segundo projeções da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB). Essa valor transformará o minério, individualmente, no maior produto de exportação do Brasil, superando a soja. A projeção da AEB, feita pelo vice-presidente da entidade, José Augusto de Castro, considera um preço médio para o minério, até agora, de US$ 23,4 por tonelada. De abril a dezembro, levando-se em conta a correção de 71,5%, o preço médio salta para US$ 37,60 a tonelada. No total, a AEB estima a exportação de 240 milhões de toneladas de minério de ferro pelo Brasil em 2005. A receita adicional com a exportação desse produto neste ano, considerando-se o reajuste acertado ontem, seria de US$ 2,1 bilhões. Inicialmente, a AEB projetava uma receita de exportação no setor de US$ 6 bilhões, que incluía só acréscimo de produção. Do lado das siderúrgicas, o primeiro sinal de desagrado do acerto com as usinas japonesas veio de Luxemburgo, sede da Arcelor, gigante européia do aço que produziu 47 milhões de toneladas em 2004 e supre dois quintos de suas necessidades com minério da Vale. "A Arcelor considera que esse acordo, envolvendo volumes relativamente pequenos, não pode ser considerado como um referencial para contratos em 2005", afirmou, após ter conhecimento do "acordo 'um-para-um' entre CVRD e Nippon Steel", em relato ao mercado. E acrescentou: "A companhia está envolvida em negociações com todos seus fornecedores no que diz respeito a outros produtos com o objetivo de acertar um meio-termo aceitável entre uma visão de curto prazo baseada em um mercado 'spot' limitado e volátil, e uma abordagem sustentável de médio prazo preservando a competitividade da cadeia de suprimento do setor siderúrgico como um todo, inclusive seus clientes, e mantendo condições de igualdade (para todos os participantes) na competição mundial." A Siderúrgica de Tubarão (CST), controlada da Arcelor, e a Usiminas tiveram maior impacto negativo do setor. Ambas são 100% dependentes do suprimento de minério da Vale. A ação PN da CST teve queda de 2,53% e a PNA da Usiminas, 0,94%. "Embora sejam as mais prejudicadas, elas vão conseguir compensar o reajuste com repasse aos preços do aço, uma vez que o preço médio em 2005 será melhor que o do ano passado com a demanda mundial aquecida", afirmou Pedro Galdi, analista do ABN Amro Real Corretora. A Vale, maior produtora e exportadora do produto no mundo, justificou o reajuste. "A magnitude do aumento de preços para 2005 reflete uma situação caracterizada por desequilíbrios sem precedentes nos mercados de metais e fretes marítimos, que conduziram a substanciais elevações de preços desses produtos e serviços durante os dois últimos anos." A companhia declarou que, "continua a investir, a despeito de custos crescentes, significativo volume de recursos na produção e logística do minério de ferro." Segundo ela, neste ano prevê desembolso de US$ 1,7 bilhão em minerais ferrosos. Há seis projetos em execução para ampliar produção. Para a Vale, o acerto de preço com a usina japonesa - um "cliente grande e tradicional, com quem mantém relações comerciais há cinqüenta anos" -, faz parte de um relacionamento de longo prazo. Com a Nippon Steel, a Vale firmou em meados de 2004 um contrato de venda de 70 milhões de toneladas no perído de dez anos, contado até 2015. Com a Arcelor, a mineradora tem um contrato de 120 milhões de toneladas para seis anos, até 2009. O mercado surpreendeu-se de forma positiva com o acordo fechado com os japoneses - a Vale confirmou, por meio da assessoria, que a Nippon sentou-se à mesa de negociações representando as demais coirmãs do aço. Portanto, os 71,5% serão estendidos a todas as grandes usinas do Japão que compram a matéria-prima da Vale. O analista Luiz Caetano, do Banco Brascan, avaliou em relatório que a Arcelor terá de concordar com um aumento "substancial" de preços. O analista projetou que o aumento anunciado terá impactos nas avaliações da Vale e de Caemi. O preço justo estimado para Vale, segundo ele, salta de R$ 86,21 a ação para R$ 104. Na Caemi, o valor sai de R$ 2,86 para R$ 3,30. Para ele, o reajuste irá elevar em 7,15% o custo do produto vendido das usinas brasileiras, reduzindo suas margens, mas, no longo prazo não vai impactar a lucratividade das siderúrgicas. A Merrill Lynch diz que índice foi bem superior à sua previsão, de 22%, e destaca que foi a primeira vez na história que a Vale fixou primeiro os preços com os japoneses, numa clara indicação do aperto no mercado de minério de ferro.