Título: PMDB cresce e aumenta poder do fisiologismo
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 14/10/2008, Opinião, p. A10

O PMDB interrompeu um ciclo de queda que começou em 1988 e voltou a aumentar o número de prefeitos. Nas eleições de 5 de outubro, o partido elegeu 1.194 executivos municipais, contra 1.054 eleitos nas eleições anteriores, em 2004 - um crescimento de 13,8% ("PMDB volta a crescer depois de 20 anos de recuo", 7/10/2008, Valor). Segundo levantamentos feitos pelo repórter César Felício, no primeiro turno o partido já havia assegurado o controle de prefeituras que somam 20,1 milhões de eleitores e poderá ser responsável por uma população de 30 milhões de eleitores, se no segundo turno vencer em Salvador, Belo Horizonte, Porto Alegre, Florianópolis, Belém, Anápolis (GO), Bauru (SP), Campina Grande (PB) e Montes Claros (MG) ("PT diminui crescimento nos grotões", Valor , 9/10/2008).

Se o PMDB retomou o vigor nas eleições municipais de 5 de outubro, cresceu consolidando o seu perfil de partido dos chamados "grotões" - pequenos municípios com forte domínio de lideranças tradicionais locais. Se nos municípios entre 50 mil e 200 mil habitantes o partido cresceu 67% em número de prefeituras, esse índice chegou a 379% nas cidades entre 10 mil e 50 mil habitantes e atingiu a espantosa cifra de 739% de aumento nas localidades com menos de 10 mil habitantes. Outro sinal de que o PMDB cresce não se reinventando, mas assumindo o seu papel de partido tradicional, é o avanço conseguido na Bahia. O ministro do Desenvolvimento Regional, Geddel Vieira Lima, conquistou boa parte do território carlista, órfão após a morte do senador Antonio Carlos Magalhães (DEM), e o PMDB passou de 19 prefeitos para 113, já no primeiro turno. Os municípios baianos que antes estavam sob a órbita do DEM, ex-PFL, que passou de 154 prefeitos no Estado para 44, seguem a lógica do chefe local, que define com os acordos regionais e mediante favores do governo federal a quem destina os votos sob sua influência.

O PMDB mantém-se como o maior partido do país, mas mostra que ganha força quando é da base aliada de um governo, em especial se esse governo é popular. O seu perfil, aliás, torna-o mais propenso a beneficiar-se eleitoralmente de políticas de governo do que o próprio PT, partido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Na Bahia, por exemplo, o PT do governador Jaques Wagner aumentou de três para 26 o número de prefeituras nas cidades com menos de 10 mil habitantes, enquanto o PMDB de Geddel subiu de quatro para 52. Supõem-se que as famílias desses pequenos e pobres municípios sejam fortemente beneficiadas pelo Bolsa Família, mas, mais do que isso, que isso aconteça em tal proporção, dada a pobreza dessas famílias, que a economia dessas localidades dependa hoje altamente dos programas de transferências de renda do governo.

O parceiro incômodo que é o PMDB, quando cresce às custas do governo, tem razões de sobra para ser ainda mais incômodo. Pode estar selando sua influência sobre a população de baixa renda por meio de programas sociais que poderiam ter o efeito de retirar esse percentual muito pobre de brasileiros das mãos da política de clientela. Quando aumenta a sua influência numa eleição municipal, tende a crescer nas eleições seguintes, elegendo nesses redutos deputados e senadores. No mínimo, portanto, se manterá como fundamental na base de qualquer governo que seja eleito em 2010. De outro lado, para ser grande nacionalmente, depende de manter-se forte regionalmente e de atuar como mediador de políticos tradicionais locais. Seu poder de chantagem tem que ser alto para poder manter políticos no governo e atender às demandas de seus correligionários.

De todos os grandes partidos, o PMDB é o que mais se aproxima da lógica do que vem a ser um partido tradicional: é altamente regionalizado; dos seus votos nas bases municipais depende sua força nacional; dos favores obtidos na órbita federal depende a sua posição regional. Essa é a lógica de sua sobrevivência. E, se isso o mantém com grande poder regional, ironicamente o tira da condição de adversário em qualquer disputa presidencial - o PMDB não tem um projeto nacional, a não ser o de viver à sombra de um presidente, ter muitos cargos no governo e obter canais eficientes para atender demandas vindas dos Estados e municípios.