Título: Governos europeus mudam foco de ajuda para estimular a economia
Autor: Gauthier-Villars, David; Abboud, Leila
Fonte: Valor Econômico, 22/10/2008, The Wall Street Journal Americas, p. C3

Cada vez mais receosos de que uma queda brusca no crédito bancário possa prejudicar ainda mais suas economias, governos europeus estão apresentando novas propostas para diminuir as conseqüências de uma provável recessão.

Ontem, o governo italiano informou que está elaborando um pacote de medidas para estimular a economia. O presidente francês, Nicolas Sarkozy, propôs a criação de fundos soberanos para evitar que grandes empresas do continente sejam adquiridas por não-europeus a preço de pechincha e chegou a esboçar proposta de um "governo econômico" para a zona do euro.

As sugestões de Sarkozy foram feitas depois que o governo da França anunciou que vai injetar 10,5 bilhões de euros (US$ 14 bilhões) nos seis maiores bancos do país. A medida, tomada com a intenção de promover a retomada dos empréstimos bancários, demonstra a clara mudança do foco do governo, passando das instituições financeiras doentes para a economia real. O temor é que, se os bancos emprestarem menos, empresas e pessoas não vão gastar dinheiro, reduzindo a atividade econômica num período em que a maior parte das grandes economias européias parece estar rumando para a recessão.

Em outra medida para facilitar o crédito, bancos centrais europeus inundaram os mercados, ontem, com dinheiro por meio de leilões de fundos ilimitados, ajudando a baixar as taxas de juros. Leilões feitos pelo Banco Central Europeu, o Banco da Inglaterra e o Banco Nacional da Suíça ajudaram a baixar a Libor, a taxa de Londres que serve de parâmetro para empréstimos entre bancos.

Há sinais de que está cada vez mais difícil para as empresas obter financiamento. A empresa francesa de serviços públicos Veolia Environnement SA, por exemplo, havia garantido o financiamento de investidores externos para um projeto de infra-estrutura de abastecimento de água em Abu Dhabi de 400 milhões de euros. Ela foi depois informada que teria de pagar juros mais altos sobre o empréstimo. A empresa desistiu e, em vez daquele grupo, pegou financiamento do seu cliente, o emir de Abu Dhabi.

Na França, onde os bancos ficaram relativamente incólumes à crise, o financiamento para mutuários da casa própria caiu 26% no terceiro trimestre, segundo pesquisa do instituto de pesquisa Observatoire Crédit Logement e da agência CSA. A inadimplência está cada vez maior. Na Espanha, a venda de carros está em queda porque há mais requisitos para se conseguir financiamento.

Ao mesmo tempo, os bancos estão procurando ajuda direta. Ontem, no fim do dia, o Bayerische Landesbank informou que vai pedir uma injeção de capital de 5,4 bilhões de euros do fundo de resgate de 500 bilhões de euros do governo alemão, tornando-se o primeiro banco do país a levantar a mão para pedir socorro desde que o pacote de resgate foi aprovado pelo Legislativo federal, na sexta-feira.

Na Islândia, representantes do governo estão "atando pontas soltas" num pacote de resgate liderado pelo Fundo Monetário Internacional, segundo uma porta-voz informou ontem, na esperança de salvar uma economia estilhaçada pelo colapso do seu sistema bancário.

O plano francês para bancos foi uma surpresa. Na semana passada, quando governos da União Européia concordaram com um cardápio de medidas para restaurar confiança no setor financeiro, a maioria dos bancos franceses afirmou ter fundos suficientes. Mas o governo argumentou que quer que os bancos concedam mais empréstimos, a fim de que mais dinheiro flua para as empresas e famílias. A França está fazendo sua injeção de capital na condição de que os bancos se comprometam a aumentar, em 2009, o volume de crédito em 3% a 4% do total atual, de 1,85 trilhão de euros.

Autoridades francesas disseram que as injeções de capital não são um pacote de resgate. O presidente do Banco da França, Christian Noyer, disse que, em vez disso, o governo "está fornecendo o capital de que os bancos precisam para expandir sua atividade de crédito".

Diferentemente do Reino Unido, onde o governo nacionalizou vários bancos agonizantes, o governo francês não vai receber ações das instituições financeiras que aceitarem sua ajuda. "De forma nenhuma este é um plano de resgate", disse Baudouin Prot, diretor-presidente do BNP Paribas SA, que pretende aceitar a oferta do governo. "Assim que os mercados melhorem, devemos pagar a dívida."

No Reino Unido já surgem diferenças entre bancos que concordaram em ceder uma fatia ao governo e outros que não. O Royal Bank of Scotland Group PLC, o Lloyds TSB Group PLC e o HBOS PLC devem receber 37 bilhões de libras esterlinas (US$ 63,5 bilhões) como parte do pacote de resgate anunciado na semana passada, enquanto o HSBC Holdings PLC e o Barclays PLC informaram que vão levantar capital por conta própria.

O plano britânico colocará membros aprovados pelo governo no conselho dos bancos e os proibirá de distribuir dividendos aos acionistas até que o governo resgate suas ações, o que analistas dizem que pode levar até cinco anos. Isso deixou alguns investidores receosos: as ações do RBS, Lloyds e HBOS caíram logo depois da notícia do plano de capitalização britânico, enquanto ações do Barclays e do HSBC subiram.

Ao longo do mês, a França anunciou uma série de medidas para apoiar sua economia. Ela também fez uma série de apelos por um plano pan-europeu de recuperação - sem muito sucesso. Ontem, Sarkozy disse a legisladores europeus, em Estrasburgo, que os 15 países que usam o euro deveriam criar um "governo econômico" para coordenar melhor suas políticas.