Título: OMC quer que banco privado ajude a financiar exportação
Autor: Moreira , Assis
Fonte: Valor Econômico, 04/11/2008, Brasil, p. A4

A seca de crédito para o comércio internacional de bens e matérias-primas é um problema que pode persistir no longo prazo e bancos privados e instituições oficiais esboçam soluções para discutirem no dia 12 na Organização Mundial do Comércio (OMC).

Uma idéia em exame é fazer os bancos regionais de desenvolvimento, como o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), ou nacionais, como o BNDES, atuarem mais no co-financiamento com bancos privados para ajudar os exportadores que atualmente enfrentam sérios problemas de financiamento.

Assim, o risco das operações seria repartido entre os setores público e privado, desde que os atores realmente tenham as mesmas informações entre eles, segundo fontes próximas da OMC. Tanto o crédito secou para exportar, como importadores têm dificuldades no acesso a letras de crédito, um instrumento básico nas operações de comércio exterior.

O BNDES começou a discutir com bancos privados que atuam como seus agentes financeiros a possibilidade de compartilhar parte do risco nas operações de comércio exterior. Hoje nas linhas do BNDES-Exim, o braço de exportação do BNDES, os agentes correm 100% do risco nas operações. Isso significa que, em caso de inadimplência pelo tomador do empréstimo, o risco para o BNDES é quase zero. A responsabilidade é toda do agente.

Agentes financeiros do BNDES confirmaram que houve reunião na sede do banco, no Rio, semana passada, para discutir o assunto. Um dos temas em pauta é a redução do percentual de risco hoje nas mãos do agente financeiro que repassa as linhas do BNDES-Exim. Se o BNDES assumisse parte do risco, os bancos privados seriam beneficiados. Teriam o seu risco mitigado e poderiam reduzir taxas nos empréstimos, disse representante de um dos agentes.

Mas há dúvidas se esse novo modelo, com fianças do BNDES, seria ágil o suficiente para manter a competitividade das linhas de apoio à exportação. Há receio de que a análise de risco do cliente, pelo BNDES, seja muito demorada. O BNDES-Exim prevê desembolsar entre US$ 5,5 bilhões e US$ 6 bilhões este ano. De janeiro a agosto, o banco desembolsou US$ 3,39 bilhões nas linhas de exportação. O banco financia a produção e a venda dos produtos a serem exportados, sobretudo bens de capital.

Pela tendência identificada na OMC, o problema pode ser de longo prazo, no rastro da crise financeira global. É que os bancos em geral se distanciaram progressivamente de suas atividades tradicionais, como os empréstimos, para se lançar em atividades financeiras mais arriscadas e na maioria parte das vezes, fora dos balanços.

O que se constata agora é que bancos tinham os créditos a exportação, em geral de curto prazo, justamente fora do balanço. E agora, para trazer de volta das operações para seus balanços, precisam de recapitalização.

O resultado é que os mais expostos nas operações de comércio exterior duplicaram o custo para o exportador, exigem mais garantias e são mais seletivos.

O diretor-geral da OMC, Pascal Lamy, convocou uma reunião para a semana que vem com um grupo de bancos privados, como HSBC, Royal Bank of Scotland, JP Morgan e Commerzbank, além do FMI, Banco Mundial, agências oficiais de crédito e bancos regionais de desenvolvimento. O BNDES é o único banco nacional de desenvolvimento convidado.

A OMC quer examinar até que ponto o problema é de longo prazo e a partir daí uma das idéias é acionar os chefes de Estado e de governo que vão se reunir no dia 15 em Washington para discutir a crise financeira global.

Está claro que as agências oficiais de crédito já trabalham bastante com bancos privados. Mas o mesmo não acontece com os bancos regionais de desenvolvimento. Uma das idéias é que os lideres políticos pressionem o BID ou o Banco Asiático de Desenvolvimento ou mesmo o Banco Mundial para serem mais ativos no co-financiamento com o setor privado.

Para a OMC, se já há recessão econômica em vários países de peso, o que menos se deve querer agora é o "entupimento" do comércio internacional. Uma das preocupações é com o custo do financiamento, quando existe, para pequenas e médias empresas.

O Brasil foi o primeiro país a acionar a OMC, inquieto com a falta de financiamento à exportação. Ontem o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, parecia mais positivo. Mencionou a queda de juros no mercado interbancário e acha que a operação de "swap" de US$ 30 bilhões entre o Banco Central do Brasil e o Federal Reserve, dos Estados Unidos, pode ter efeito positivo para os exportadores.

Enquanto isso, a falta de crédito comercial está tendo efeito desastroso no transporte marítimo, segundo informou o jornal "Times", de Londres. A maior empresa global de contêineres, a dinamarquesa Maersk, acusa os bancos de causar estragos no setor. (Colaborou Francisco Góes, do Rio)