Título: Por que o PT torce por Wilson Lima
Autor: Campos, Ana Maria
Fonte: Correio Braziliense, 24/02/2010, Cidades, p. 24

Com a ascensão do presidente da Câmara ao GDF, oposição volta a comandar o Legislativo e tem muito interesse em se manter no posto

O cenário é bom para o PT. A chapa vitoriosa no primeiro turno nas últimas eleições, de José Roberto Arruda e Paulo Octávio, está fora de combate e a permanência do governador em exercício, Wilson Lima (PR), à frente do Executivo garante um cargo estratégico para o partido: a presidência da Câmara Legislativa. Enquanto durar a interinidade de Wilson Lima, o deputado distrital Cabo Patrício (PT) ficará à frente da Casa, com o poder de apressar ou retardar se quiser ¿ a tramitação de projetos de lei, os processos contra parlamentares e os pedidos de impeachment contra Arruda. ¿Tudo o que eu puder fazer para dar celeridade aos procedimentos de fiscalização do governo, farei¿, promete Cabo Patrício, que chefiou interinamente o Legislativo entre dezembro e fevereiro, devido ao afastamento do então presidente Leonardo Prudente.

Nesta noite, a executiva regional do PT vai dizer como será o comportamento do partido diante da administração de Wilson Lima. ¿Somos oposição e não vamos dar sustentação ao governo, até porque temos preocupação sobre as chances reais de Wilson Lima conseguir administrar o DF, diante de tantas denúncias¿, afirma o presidente do PT-DF, Roberto Policarpo. O líder da bancada do PT na Câmara Legislativa, Paulo Tadeu, garante que não há chance de aliança em nome da governabilidade: ¿Nosso foco é outro. São os processos de investigação contra deputados, de impeachment e a CPI¿. O partido deverá permanecer na oposição ao governo, mas discretamente torce pela manutenção da atual situação, ou seja, pela permanência de Wilson Lima à frente do GDF.

Cenários O novo governador em exercício tem bom trânsito entre os petistas e não é considerado um potencial adversário nas próximas eleições, caso se firme como chefe do Executivo e resolva concorrer à reeleição. Esse cenário também é melhor do que a decretação de uma intervenção federal no DF, quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deverá nomear um governador para mandato tampão, conforme pedido do procurador-geral da República, Roberto Gurgel. Petistas temem o desgaste da medida nas eleições, numa eventual dificuldade de o interventor escolhido por Lula em administrar o DF num momento de crise institucional.

Petistas também temem a mudança da Lei Orgânica do DF para adequar as regras à Constituição Federal e permitir que a Câmara Legislativa autorize a realização de eleições indiretas para a escolha do novo governador (leia matéria abaixo). Nesse caso, o resultado da escolha não prestigiaria o interesse da legenda, que é minoria na Casa.

Preso há 13 dias na Superintendência da Polícia Federal (PF), o governador afastado José Roberto Arruda insiste em dizer que não vai renunciar ao cargo. Mas a aposta no meio político é de que ele não terá condições de reassumir o comando da administração local. Mesmo que o Supremo Tribunal Federal (STF) decida liberá-lo na sessão de amanhã, Arruda poderá passar pouco tempo no cargo, já que os pedidos de impeachment contra ele tramitam agora em ritmo acelerado.

O relator do caso na Comissão Especial, o deputado Chico Leite (PT), já anunciou que apresentará ainda esta semana seu parecer sobre a admissibilidade do processo. Em até 50 dias, o processo por crime de responsabilidade contra Arruda deverá estar aberto e não haverá mais possibilidade de renúncia. Por isso, o governador terá de tomar uma decisão sobre enfrentar a investigação e correr o risco de ficar inelegível até 2019.

Lula comenta a renúncia

Em Cancun, no México, onde participa da 2ª Cúpula de chefes de Estado da América Latina e do Caribe, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva comentou a crise política no Distrito Federal, com o presidente da Câmara Legislativa, Wilson Lima, assumindo o GDF e a renúncia de Paulo Octávio. ¿É um direito dele, de renunciar. É um direto do povo votar pela legislação. Vai assumir o presidente da Câmara Legislativa. Estamos aguardando decisão da suprema corte se vai ter intervenção ou não.¿

Lei Orgânica entra em conflito com a Constituição

ADRIANA BERNARDES

A linha de sucessão no Distrito Federal é sui generis. As regras previstas na Lei Orgânica do DF (LODF) divergem do que prevê a Constituição em casos de vacância no comando do Executivo. Pela Carta Magna, se no último ano de governo, o presidente renunciar ou for cassado no processo de impeachment, o presidente da Câmara dos Deputados deve assumir o cargo e, em 30 dias, promover a eleição indireta do novo líder do Executivo. Este, por sua vez, assume o cargo até o fim do mandato de seu antecessor, ou seja, 31 de dezembro. Por simetria, o mesmo deveria ocorrer na capital da República. Mas a LODF determina que o presidente da Câmara Legislativa fique no GDF até o fim do mandato (veja arte).

Caberá à Câmara Legislativa decidir se seguirá o que manda a Constituição Federal ou optar pelas regras locais. No entendimento do professor de direito da Universidade de Brasília (UnB), Cristiano Paixão, a melhor opção é seguir a norma federal ¿ afinal, trata-se da lei maior do país. ¿Caso contrário, a conduta pode reforçar o entendimento de que a intervenção federal é necessária. Não há qualquer dúvida de que essa norma distrital é inconstitucional¿, alertou. Para Cristiano Paixão, a LODF nem sequer precisa ter sua constitucionalidade questionada na Justiça para que prevaleça a Constituição. ¿O agente público tem a prerrogativa de, sabendo que uma lei é inconstitucional, não segui-la¿, afirmou.

O especialista acredita que os distritais deveriam promover a eleição do novo chefe do Executivo, caso Arruda deixe o posto. Nessa hipótese, qualquer cidadão ¿ respeitados os critérios determinados pela Constituição ¿ poderia se candidatar à cadeira no Palácio do Buriti (leia o que diz a lei).

Vice A eleição indireta não é o único ponto de conflito entre a LODF e a Constituição. Pelas regras locais, o vice-presidente da Casa, no caso o deputado Cabo Patrício (PT), é o terceiro na linha sucessória. Somente com a impossibilidade de este assumir o comando do governo local, o presidente do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT), atualmente o desembargador Nívio Gonçalves, ocuparia o cargo de chefe do Executivo (veja arte). Como o mandato dele vence em abril, seria substituído pelo desembargador Otávio Augusto Barbosa, eleito por unanimidade no último dia 9. Na Carta Magna, nenhum vice das Casas Legislativas teria direito a ocupar o cargo máximo do Executivo.

O que diz a lei

As regras para a pessoa poder se candidatar ao cargo de governador constam no Artigo 14, parágrafo 3º, da Constituição Federal. É preciso ter nacionalidade brasileira, estar em pleno exercício dos direitos políticos, possuir alistamento eleitoral, domicilio eleitoral no local do pleito, filiação partidária e idade mínima de 30 anos.