Título: Um porto seguro no mercado de sementes
Autor: Barros, Bettina
Fonte: Valor Econômico, 05/01/2009, Agronegócios, p. B9

Enquanto produtores de grandes commodities como milho e soja passaram boa parte do segundo semestre olhando as cotações internacionais para definir seus planos futuros de safra, no pequeno (mas constante) mercado de hortaliças a crise não arreganhou os dentes em 2008. Principal indício é a produção de sementes para o segmento, que fechou o ano com volume semelhante ao de 2007 e faturamento um pouco superior. Anna Carolina Negri / Valor

"Em tempos de crise as pessoas cortam a TV de plasma, não a cebola", diz Francisco Sallit, presidente da Abcsem e gerente de projetos da Syngenta Seeds

Estimativas da Associação Brasileira do Comércio de Sementes e Mudas (Abcsem) apontam para a manutenção em 83 toneladas do volume de sementes de hortaliças comercializadas ao longo do ano, com alta de 5% no faturamento de R$ 300 milhões registrado em 2007, acompanhando a inflação. Conforme Álvaro Peixoto, diretor de sementes e mudas da entidade, a pressão do câmbio não foi sentida de forma tão forte - como aconteceu em outras frentes - porque praticamente toda a produção dessas sementes se destina ao mercado interno.

O impacto mínimo da crise financeira nas hortaliças também é explicado pelo fato de elas estarem vinculadas à alimentação, que costuma sentir de forma mais lenta os efeitos maléficos de desacelerações econômicas. "Em tempos de crise as pessoas cortam a TV de plasma, não a cebola", diz Francisco Sallit, presidente da Abcsem.

Mas o pulo do gato está ligado à conversão de variedades convencionais em híbridas, caracterizadas pela resistência a doenças e maior produtividade. São as pesquisas nessa área que podem agregar valor para empresas e produtores, defende a entidade.

O tomate, que representa um terço do mercado das hortaliças, é um exemplo: um quilo de sementes convencionais custa hoje R$ 250. Já o quilo das sementes híbridas chega a R$ 20 mil. "Mas a produtividade é duplicada", diz Peixoto. "Enquanto o rendimento é de 150 a 200 caixas por mil pés de tomate convencional, é possível obter de 400 a 450 caixas por mil pés híbridos", diz ele.

A Agristar, uma das cinco maiores empresas de sementes de hortaliças do país - o mercado brasileiro é composto basicamente por 20 empresas - aposta no "Dominador", variedade de tomate híbrido resistente ao geminivírus, transmitido pela mosca branca. "Nossa variedade foi a segundo mais semeada em 2008 e devemos atingir a liderança em 2009", diz Alexandre Oliveira, diretor comercial e acionista da empresa. Com produção de 300 toneladas por ano, a Agristar faturou R$ 50 milhões no ano passado, e espera alta de 10% em 2009.

Além do tomate "turbinado", a empresa deverá lançar este ano uma variedade de cenoura híbrida de verão, que, de acordo com o executivo, passará a ser um segmento-chave da Agristar. "Estamos trabalhando num mercado cada vez mais tecnificado", diz.

Nos últimos dois anos, o mercado de sementes de hortaliças registrou os maiores avanços em melancias e cenouras de verão. Os desafios, agora, estão na conversão de variedades menos exploradas como o quiabo e a beterraba, cuja conversão em híbridos evolui de modo mais devagar. Segundo Peixoto, da Abcsem, isso se deve à falta de foco das pesquisas por parte das empresas e também por conta da adaptabilidade das variedades ao clima tropical brasileiro.

Segundo a associação, praticamente 100% das sementes de melão produzidas no Brasil já são híbridas. No caso do pimentão, da couve-flor e do tomate, as sementes híbridas já respondem por 80% do total produzido. "Com os híbridos, o produtor economiza defensivos, já que as sementes são resistentes a doenças", afirma Peixoto, que é também gerente de marketing da Seminis, braço de hortaliças de Monsanto e líder de mercado no Brasil, com fatia de 25%.

A Seminis investiu em pesquisas de hortaliças em 2008, globalmente, US$ 680 milhões, cerca de 15% de seu faturamento. "É mais do que a média dos outros negócios, onde os investimentos para pesquisa são de 10%", afirma Peixoto. Por questões de custo e infra-estrutura, a empresa não produz sementes no Brasil, mas as importa de 40 países. Seu foco está em oito variedades: cenoura, tomate, melão, cebola, milho-doce, pepino, couve-flor e alface.

Os investimentos da Syngenta Seeds, a quarta no ranking extra-oficial do segmento, também são vultosos: de 12% a 14% do faturamento de US$ 18 milhões no Brasil da chamada área de vegetais da empresa. Somente a estação de pesquisa de Aracati (Ceará), para melhoramento genético convencional, recebeu US$ 2 milhões entre 2004 e 2008. "Nosso segmento, apesar de ter volume menor que as grandes commodities, tem grande atratividade", diz Francisco Sallit, presidente da Abcsem e gerente de projetos de hortaliças da Syngenta Seeds. "As pesquisas podem gerar um produto de alto valor e adaptação a diferentes ambientes".

Além da tecnificação, outro objetivo do ramo é aumentar o consumo de hortaliças no país. Conforme a Abcsem, ele gira hoje em torno de 132 gramas por dia, enquanto a Organização Mundial de Saúde recomenda 400.