Título: Governo fará quatro leilões de energia no segundo semestre
Autor: Rittner, Daniel
Fonte: Valor Econômico, 05/05/2009, Brasil, p. A3

Sem a pressão de viabilizar um pacote de novas usinas térmicas movidas a óleo ou a carvão para atender o crescimento da demanda, o governo definiu a realização de quatro leilões de energia no segundo semestre, com destaque para o predomínio, pela primeira vez desde 2005, de projetos de energia renovável. Além da licitação de Belo Monte, que terá quase o dobro de capacidade das duas usinas do rio Madeira juntas, o Ministério de Minas e Energia organiza um certame voltado exclusivamente a projetos eólicos e prepara até nove concessões de hidrelétricas de médio porte em dezembro.

O primeiro leilão está marcado para 27 de agosto e é do tipo A-3 - os contratos preveem a entrega de energia três anos após o fechamento dos negócios, daí o nome. Diferentemente dos anos anteriores, em que as especulações do mercado quanto ao desequilíbrio entre oferta e demanda estimulavam projetos nessa modalidade, desta vez o cenário é de tranquilidade e poucos duvidam que as distribuidoras têm energia contratada suficiente para atender seus clientes em 2012.

"A nossa expectativa inicial já era de poucos contratos nesse leilão", afirma Maurício Tolmasquim, presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), estatal responsável pelo planejamento do setor. Ele prevê expansão de apenas 1,2% da demanda neste ano. "Agora, com a crise econômica, a folga ficou ainda maior."

Em dezembro, o governo fará um leilão A-5 - com início do suprimento cinco anos após a venda da energia. Desde 2005, o predomínio de térmicas "sujas" tem sido avassalador. No último leilão dessa modalidade, em setembro do ano passado, 73% dos 3.125 MW médios negociados eram de térmicas a óleo combustível ou a carvão - não houve oferta de nenhuma hidrelétrica.

Para o próximo leilão, Tolmasquim conta com a presença de até nove hidrelétricas, que totalizam 1.572 MW. Isso representa menos de 2% do atual parque gerador e não chega à metade da potência de Jirau, uma das usinas no rio Madeira, mas o fato é tratado com entusiasmo pelo governo por causa da oportunidade de dar um viés "mais limpo" aos leilões de energia. Inclusive porque, com o aumento na produção da Petrobras e a entrada em funcionamento de terminais de gás natural liquefeito (GNL), boa parte dos novos projetos de termelétricas deverão trocar o óleo e o carvão pelo gás, um combustível fóssil que gera menos emissões.

"Já temos uma perspectiva de gás bem melhor do que a dos últimos anos", ressalta o presidente da EPE. Ele lembra que em 2014, quando a energia desse leilão começará a ser fornecida, o país terá uma malha mais abrangente de gasodutos e a produção da camada pré-sal estará dando sinais de vitalidade. "Temos um quadro que viabiliza novos projetos. Finalmente estamos conseguindo montar um portfólio razoável de hidrelétricas e de termelétricas de maior qualidade", completa.

Para Tolmasquim, é improvável que as nove hidrelétricas obtenham licenciamento prévio a tempo. A estratégia de deixar o leilão para dezembro foi, justamente, adotada para ganhar um prazo maior com os órgãos ambientais. Isso não prejudica, segundo ele, o cronograma dos investidores. Geralmente, uma hidrelétrica demora cinco anos para ser construída. Aquelas que forem licitadas neste ano precisam estar em operação até 2014.

"São usinas menores e que podem perfeitamente estar prontas em quatro anos", assegura Tolmasquim. São cinco hidrelétricas no rio Parnaíba (divisa do Piauí com o Maranhão), uma no São Francisco (entre Bahia e Pernambuco), uma no rio Chopim (Paraná) e duas - as maiores, com um total de 803 MW, no rio Teles Pires (Mato Grosso). "Seria muito melhor ao país, inclusive do ponto de vista ambiental se pudéssemos licitar as nove usinas. Mas a palavra final caberá ao Ibama."

Entre o A-3 e o A-5, está programa um leilão inédito, destinado exclusivamente a projetos de energia eólica. Quantidade e preço dependem da disposição da iniciativa privada. Fontes do setor consideram que o leilão terá êxito se comercializar 1 mil MW de capacidade, mais do que dobrando a atual potência instalada, o que exigiria investimentos estimados em R$ 3,5 bilhões.

O leilão de eólica deverá ocorrer em novembro e a visão do governo é otimista. "Vamos ter uma avalanche de projetos. O número de investidores que demonstrou interesse é enorme", acredita Tolmasquim. Um dos principais desafios, segundo ele, é flexibilizar o índice de nacionalização dos equipamentos sem comprometer a intenção de trazer indústrias do setor para o Brasil. Hoje, empresários têm colocado a elevada exigência de componentes nacionais como uma barreira para investir. "Queremos achar um mecanismo que incentive a indústria nacional sem barrar a importação", frisa.

Tolmasquim vê uma tendência de modernização e barateamento dos projetos eólicos. Em 1990, os aerogeradores mais comuns tinham potência de 500 kW e 54 metros de altura, com pás de 40 metros de diâmetro. Atualmente eles chegam a 5 MW de potência, até 120 metros de altura e pás com 120 metros de diâmetro (superior a um campo de futebol).

No entanto, a grande atenção dos investidores está voltada mesmo para o leilão da hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu, com 11.181 MW. O custo da usina pode alcançar US$ 7 bilhões e a intenção do governo é licitá-la em outubro. Até agora, o Ibama ainda não aceitou o estudo de impacto ambiental (EIA-Rima), sob responsabilidade da Eletronorte. Tolmasquim está confiante na manutenção do cronograma e avisa que a participação das estatais do sistema Eletrobrás dependerá muito da manifestação de interessados na iniciativa privada. "A meta é viabilizar pelo menos dois consórcios para estimular a competição", esclarece.