Título: Sob pressão do Planalto, PT muda o tom e defende Sarney
Autor: Agostine,Cristiane ; Lyra, Paulo de Tarso
Fonte: Valor Econômico, 03/07/2009, Política, p. A6

Cristiane Agostine e Paulo de Tarso Lyra, de Brasília 03/07/2009

Lula Marques/Folhaimagem Em discurso no Senado, Mercadante volta atrás: "A minha combatividade está a serviço do presidente Lula"

Da tribuna do Senado, para uma platéia majoritariamente governista, o líder do PT, Aloizio Mercadante (SP), fez um discurso de três horas e meia repleto de argumentos em defesa do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), da manutenção da aliança do PT com o PMDB e da governabilidade na Casa. "A minha combatividade está a serviço do presidente Lula", declarou. "Não me peçam um ato ingênuo, espontâneo, oportunista, que permita fragilizar a governabilidade". Na sequência, o petista Tião Viana (AC) disse: "Que o presidente da República divida com o PT a responsabilidade deste momento em que vive o Senado."

A mudança no discurso do PT foi clara, um dia depois de o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ter reclamado com o líder do PT sobre a pressão petista pelo afastamento de Sarney . Ontem, o PMDB considerava certo o apoio do PT e a hipótese de Sarney renunciar perdeu força. A bancada do PT participou de jantar, à noite, com o presidente Lula, no Palácio da Alvorada.

O líder do PMDB, Renan Calheiros (AL), elogiou a atuação de Lula para defender Sarney e disse que a crise no Senado aproximou PT e PMDB. A bancada petista garante a maioria dos senadores no apoio a Sarney e Renan contabilizou 55 dos 81 senadores como aliados.

A influência de Lula sobre a bancada foi fundamental para enterrar a renúncia. Sarney conversou ontem pela manhã com Lula, que tranquilizou o pemedebista, segundo aliados. Eles marcaram uma reunião para hoje.

Antes mesmo de começar a reunião com Lula, ontem à noite, a posição do PT já estava definida: defender Sarney e preservar a aliança com o PMDB, para manter a governabilidade no Senado e ter apoio para a candidatura da ministra Dilma Rousseff à Presidência. A decisão, entretanto, não foi unânime e três senadores ainda resistem à ideia: Marina Silva (AC), Tião Viana (AC) - que disputou a presidência com Sarney - e Eduardo Suplicy (SP). "O afastamento de Sarney faz parte do processo de solução da crise no Senado", disse Marina.

Ontem o líder do PT manteve a posição de que a bancada sugeria o afastamento temporário de Sarney, apesar de o pemedebista ter rejeitado a tese. Mas Mercadante já sinalizava que a decisão do presidente Lula era mais forte: "Lula tem liderança histórica sobre o PT", argumentou. " O PMDB é um partido fundamental para o PT e nós temos compromisso com a governabilidade (...)José Sarney, que sempre foi um aliado fundamental do Governo", disse na tribuna.

Antes da mudança do tom do PT, Sarney havia ameaçado renunciar, pois estava incomodado com a falta de apoio petista. Lula mobilizou Dilma, escolheu interlocutores na bancada e no partido e comandou a solução que Sarney e Renan queriam.

No domingo, os dois pemedebistas ligaram para Lula. Mostraram que, se ele não agisse diretamente para transformar o PT e o PMDB em parceiros novamente, a governabilidade no Senado ficaria comprometida. Na semana anterior, a orientação da cúpula governista era de que Lula não deveria se envolver diretamente no caso, para não "jogar no colo do presidente uma crise que não era dele".

Após a conversa telefônica, o discurso e a ação mudaram. Na segunda, durante reunião da coordenação política, Lula orientou o ministro José Múcio Monteiro a dizer que "o apoio a Sarney era incondicional e que o governo não admitia o afastamento do presidente do Senado". A crise se aprofundou quando o DEM resolveu também pedir o afastamento, como uma maneira de moralizar as investigações. Renan ligou novamente para Lula, que já estava na Líbia. Lembrou que, se Sarney se afastasse, a presidência interina seria ocupada pelo tucano Marconi Perillo (GO), a escolha de um nome para a nova eleição poderia demorar e não haveria como controlar as iniciativas que pressionam o governo no Senado. Como a primeira-secretaria -o segundo cargo mais importante da Casa- já pertencia ao DEM, o governo ficaria nas mãos da oposição.

Lula, da Líbia, avisou que "a oposição queria ganhar no tapetão a presidência do Senado", e determinou a mudança do PT. Sarney já havia se encontrado, na noite de terça, com Dilma. O encontro aconteceu na casa dela, a pedido de Sarney, que lhe disse que a situação estava ficando insustentável e insistiu que o PT deveria se posicionar oficialmente.

Na manhã de quarta, os senadores petistas se reuniram e resolveram apoiar o afastamento temporário de Sarney. Contrariado, o presidente da Casa não gostou. Mais uma vez, ligou para a líder do governo no Congresso, Ideli Salvatti (PT-SC), e pediu que o partido revisse sua posição, o que ocorreu ontem.

Dentro da bancada petista, senadores relatam que Mercadante desgastou-se na condução do processo. Segundo petistas, a líder do governo no Congresso, Ideli Salvatti (PT-SC), é quem está conduzindo as conversas com aliados de Sarney. Ontem, entretanto, foi Mercadante quem subiu à tribuna para defender a aliança com os pemedebistas, numa espécie de retratação. Para justificar a defesa do PMDB pelo PT o governo pretende usar a estratégia de vincular a crise a disputas partidárias: de um lado, PMDB e PT, na defesa de Sarney e da governabilidade; do outro, PSDB e DEM. Na análise de pemedebistas, "os fatos saíram do campo do sensacionalismo" e a disputa voltou ao "campo da política".